Dívida

403 27 45
                                    


Com a boca ainda cheia de macarrão, Peter contava à tia os detalhes de sua tarde decepcionante.

— Nem o Ned aguentou aquele filme horrível — ele murmurou entre mastigações, manobrando habilmente os longos fios em seu garfo antes de encharcá-los em molho de tomate.

Sentada à sua frente, na pequena mesa da cozinha, May segurava uma caneca fumegante de café, cujo aroma suave tomava conta do ar.

— Vocês, jovens, são muito exigentes hoje em dia — May comentou, com um toque de humor. — Então, além do filme terrível, fizeram mais alguma coisa? O shopping anda lotado esses dias, com todas aquelas lojas novas. Se bem que ouvi falar que são todas de roupas femininas.

— A gente só deu umas voltas, mas encontramos as meninas, a Betty e a Liz, do colégio.

May soprou suavemente a fumaça fina que saía do café, para logo depois dar um gole generoso.

— Aposto que foram ver as lojas. Quando sobrar um tempinho, vou pra lá dar uma olhada nas vitrines. — Sua testa franziu quando um pensamento pareceu passar por sua mente. — Liz... essa não é a garota por quem você tinha uma queda?

Peter abaixou a cabeça, de repente achando seu prato de macarrão meio comido absolutamente fascinante.

— Sim, elas tinham ido numas lojas mesmo, carregavam um monte de sacolas quando a gente se encontrou.

— Ah, claro — May assentiu, e quando Peter a encarou, tinha um brilho travesso nos olhos; a exata mesma expressão que ele costumava usar ao implicar com Ned sobre Betty. — Mas vocês conversaram pelo menos? — ela insistiu.

Peter deu um pequeno aceno de cabeça, colocando outra garfada na boca para evitar ter que responder imediatamente. Depois de engolir, ele disse:

— Um pouco, eu acho. A Betty arrastou o Ned, provavelmente pra falar do artigo que ela tá fazendo e tal. Já a Liz só disse que anda muito ocupada com coisas do Decathlon lá da escola. E foi só.

May torceu o nariz e emitiu um som de desaprovação, murmurando algo sobre como os tempos certamente haviam mudado desde sua juventude, antes de tomar outro gole pensativo de seu café.

Peter estufou a boca com o que tinha restado do macarrão, mastigando lentamente e pensando em quanto mais havia para compartilhar sobre aquela tarde, detalhes que ele preferia não contar para sua tia. Não tinha relação com Liz, Betty ou Ned, era algo um pouco mais embaraçoso do que isso.

O barulho e o movimento pelos corredores do shopping tinham sido amplificados pelo burburinho das inaugurações de novas lojas e estreias de filmes, exatamente como May mencionou. Observava Betty e Ned conversando com facilidade, e sentiu uma pontada de satisfação ao ver seu amigo se desenrolando. Mas, quando se viu momentaneamente sozinho com Liz, não havia muito assunto que sustentasse uma conversa longa. Não mentiu quando disse à tia que tinham se falado pouco.

Peter preencheu os longos silêncios recapitulando algumas das tarefas de fotografia escolar que ele havia concluído recentemente – fotos das equipes acadêmicas e dos projetos de biologia. Ser fotógrafo do jornal escolar não era nenhum trabalho árduo, mas sempre gostou de fotografar e apreciava o bônus de receber crédito acadêmico por suas fotos.

Liz, por sua vez, falou um pouco sobre as compras dela e de Betty, embora seu tom revelasse não ter ficado muito impressionada pelas lojas de roupas que visitaram. Também comentou brevemente sobre o Decathlon, mencionando como o treinador da equipe, o tenso professor Harrington, estava ainda mais nervoso ultimamente devido à gravidez de alto risco de sua esposa. No entanto, afirmou estar conseguindo segurar as pontas, com a ajuda de MJ. O nome ressoou na mente de Peter, despertando a lembrança da garota que ajudou com seu armário emperrado.

DESOBEDIÊNCIA - starkerOnde histórias criam vida. Descubra agora