Toca do Lobo

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- E aí, como está sendo aturar o bonitão? - Emily riu.
- Nada bem - suspirei. - Acredita que a minha mãe está me obrigando a passar parte das minhas férias na casa dos pais dele, no campo?
- Sério? E por que não vai?
- Por que não vou? Se com a minha mãe do lado me dá vontade de agarrá-lo, imagine numa casa só nós dois?
- Ai, Ethan. Fez a pior burrice de um gay: se apaixonar por um hétero - Ela deu uma risadinha.
Atravessamos a rua, quase perto do parque. Tomei um gole de água da minha garrafa e prossegui:
- Não é burrice. É como se, de algum jeito, fôssemos compatíveis. Às vezes ele me olha como se me desejasse também. E o esforço que está fazendo para se aproximar de mim e... Eu não vou conseguir me controlar. Toda vez que vejo ele eu quero tocá-lo, mas não posso.
- Então, não se controle. Aproveite essa viagem pra cravar as garras nele. Hahaha. Já que está tão seguro de que ele também sente alguma coisa por você, não é melhor arriscar?
- Mas e se rolar alguma coisa? Eu não posso fazer isso com a minha mãe.
- Realmente, é complicado. Mas você vai ficar assim pra sempre? Tentar afastar o Wade assim, não está adiantando. Talvez você devesse investir em outra pessoa. Por que não arruma alguém?
- Em um site de relacionamento?
- Onde mais? E o que aconteceu já faz tempo. Passou do momento de você seguir em frente, de procurar alguém. Isso vai te ajudar a esquecer o Wade.
- Eu não sei, Emi. Talvez eu devesse esperar mais um pouco. Mas eu vou pensar. E talvez eu tenha que fazer mesmo isso para esquecer o Wade. Droga por que ele tinha que ser o namorado da minha mãe?
E então, começamos a correr no parque.

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Capítulo 6: Toca do Lobo

- Michael?
- Oi, Ethan. Podemos conversar?
Após uma pausa, convidei ele para entrar.
- Tem falado com o Wade?
- Não.
Nos sentamos no sofá.
- Por quê? - acrescentei, curioso.
- Ele não tem saído muito de casa e parece deprimido. Você poderia saber de alguma coisa, ou a sua mãe?
- Por que eu saberia? E eu acho que a minha mãe também não está sabendo. Você deve saber que eles terminaram.
- Eu sei sim, mas é que... Deixa pra lá. Achei que ainda se importassem com ele.
Então, Michael se levantou.
- Não, espera - exclamei. - Como o Wade está?
Michael sentou-se novamente.
- Ele não quer conversar. Diz que está tudo bem, mas, não está. Estou preocupado com ele. Achei que vindo aqui, você e a sua mãe poderiam conversar com ele.
- Acha que ele nos ouviria?
- Bom. Eu nunca tinha visto o Wade daquele jeito, tão feliz, quando conheceu vocês. De quando estava com a sua mãe. E agora - ele suspirou. - O velho Wade parece que voltou, e pior ainda.
Engoli em seco.
- Eu posso ir vê-lo?
- Claro. Podemos ir agora, ou você vai fazer outra coisa?
Respondi que não. Então, fomos ver o Wade.
E chegamos.
Dentro de um Sentra azul, observei o Michael lá fora tocar a campainha. Logo, ouvi uma mulher conversar no interfone. Era a quem cuidava da casa. Pelo sotaque e aparência, era mexicana. Ela pareceu aliviada por ter chegado alguém.
- Ele está lá no escritório - disse ela, um pouco preocupada. - Não está comendo direito - acrescentou
Engoli em seco, enquanto minhas mãos tremiam. Depois de dias, finalmente veria o Wade. Eu não sabia se ele queria me ver, ou se eu realmente deveria estar ali. Mas aquele momento iria acontecer algum dia.
- Eu posso falar com ele sozinho? - falei, antes de seguirmos pelo corredor até o escritório.
- Claro. Vem, jason.
E Michael e o cachorro do Wade saíram, junto com a mulher.
Respirei fundo e segurei a maçaneta redonda da porta. Com o coração vibrante, entrei.
- Wade?!
Ele estava caído no chão, usava apenas um calção preto. Ao lado, uma garrafa de uísque e um prato com comida. Logo, o acudi.
Ele logo abriu os olhos e se afastou um pouco de mim. Parecia um pouco desorientado. Esfregou os olhos e passou a mão na cabeça.
- Ethan? O que veio fazer aqui?
- Eu vim te ver. Todo mundo está preocupado com você.
- Eu estou bem.
Ele se levantou e apoiou as mãos na mesa.
- Tô vendo como você está bem. Vi que realmente voltou a beber.
Wade ficou quieto, olhando para baixo.
- O que realmente está acontecendo? Por favor me diz - Toquei no ombro dele.
- Não está acontecendo nada. Eu só... Estou um pouco estressado com... com...
- Com o quê?
Ele ficou em silêncio.
- Essa história de eu sair com outros caras. O que é isso, você cansou de mim? - indaguei, já que o Wade não explicava direito. - Quer me dar essa tal liberdade para você também sair também com outras pessoas? O que eu sou pra você, afinal? Eu pensei que você quisesse ficar comigo, mas eu era apenas uma opção, não é?
Ele não falava. Apertou os olhos, tenso, e jogou a cabeça para trás, num suspiro.
- Eu sou apenas aquele com quem você mete por mais tempo? - prossegui.
- Sexo? É tudo que você pensa que eu quero de você? - falou, enfim, me encarando.
- Já que você é hétero...
- Hétero? Depois de tudo o que fizemos, depois de tudo o que conversamos... Acha mesmo que eu sou hétero? Eu nunca fui.
- Então, por quê...
- Droga - ele franziu o rosto, como se tivesse falado o que não deveria.
- Você disse que nunca tinha ficado com homem e que eu era a exceção. Você mentiu?
- Eu... Eu... Com você foi diferente, eu gosto de você. Eu só queria que fosse especial para você.
- Mentindo? Não precisava. E poxa, se eu soubesse antes... Quero dizer, acho que eu sabia, eu sentia que tínhamos algo. Teria sido mais fácil.
- Eu também não queria que você se apegasse demais em mim. Como você está fazendo agora. Achei que...
- Achou o que? Que por me fazer pensar que fosse hétero eu não teria muita chance com você, que eu não apegaria a você? Pois, não funcionou. E agora, se afastando de mim, não vai funcionar. É por isso que eu estou aqui.
- Por que é que você fala tanto? Eu preciso de espaço para respirar. Eu não quero te ouvir, vai embora. Vá sair por aí. Viver...
- Sair com outros caras, sério?
- É?
- Tipo o Michael? Foi ele que me trouxe aqui.
- Ficou interessado, não foi? Vai em frente, ele dá e como também.
- Já comeu muito ele, então?
- Ethan, por favor, vá embora.
Refleti um momento, respirei fundo e falei:
- Ok. Não vamos mais falar disso. Wade, eu vim aqui te ajudar.
- Não quero a sua ajuda. Ninguém pode me ajudar.
Me aproximei mais e acariciei o rosto dele.
- Wade, você vai mesmo fazer isso comigo? Me afastar e afastar todos os seus amigos, como isso pode te ajudar?
Os olhos dele estavam fundos, avermelhados e lacrimejantes. O rosto e a barba descuidados. E o seu hálito, de bebida e cigarro. Quem era esse Wade?
- Por favor, deixa eu te ajudar. Deixa eu ficar com você.
Ele se desviou de mim. Foi até a garrafa de uísque no chão.
- Larga isso! Você não vai beber. Wade, me dê isso...
E me lancei sobre o Wade, enquanto ele tentava se esquivar de mim, até o prato de comida foi pisoteado. Tentei tirar a garrafa dele, porém, ele bebeu um bocado antes de estilhaçar o resto na parede. Depois sentou-se no chão, com as costas no sofá preto.
- Vai pra casa, Ethan. Eu não quero te ver. Por favor, vai.
Eu fiquei imóvel por um tempo, mas com o coração disparado. Então, dei uns passos para trás e pisei em alguns talheres. Peguei o garfo e, por último, uma faca. Foi quando Wade levantou-se rapidamente.
- Ei, ei! O que vai fazer? O que vai fazer? - exclamou.
- O quê?
- Larga essa faca!
- O que acha que vou fazer?
- Para! Larga isso já!
Um minuto inteiro nos olhamos. Wade estava assustado, e eu, não sei. Chocado era pouco.
- Ah, entendi. - falei. - Então é isso? Você não confia em mim, não é? Nunca confiou. Acha que eu sou louco, um doente mental?
- O quê? Não. Me desculpa... Eu não sei - ele gaguejou, se encolhendo na parede. Acrescentou: - Por favor, vá embora. Não quero que me veja assim.
Dei uma risada amarga.
- Já que no fundo você acha que eu sou um doente. É, talvez eu seja mesmo - Soltei um suspiro longo e acrescentei: - Você está certo. Tudo isso é loucura. Eu não devia ter feito isso com a minha mãe, não devíamos ter ficado juntos.
Dizer isso me arrasou por dentro, por isso não falei mais nada, tratei logo de sair dali.
- Eu te amo, Ethan!
Ao ouvir a voz dele, embargada, parei frente à porta. Virei levemente o rosto, sem olhar para trás. Peguei na maçaneta e saí, como entrei, quieto e congelado. Sem olhar para trás e sem parar.
- Ei, aonde vai - Michael exclamou ao me ver indo para o portão. Ele estava perto da piscina com o cachorro.
Não respondi, só continue andando. E assim que cheguei à saída, fui alcançado.
- O que aconteceu?
Michael entrou em minha frente.
- Me deixe ir. Eu só queria ir - pedi.
- Vamos falar com o Wade, nós dois - Segurou os meus ombros.
- Eu não quero.
- Só me espere aqui, eu preciso ver como o Wade está.
- Tá.
- Você me espera?
- Sim - balancei a cabeça.
- Já volto.
E Michael entrou. E eu fiquei com o jason, que ficou dando pulinhos em cima de mim, enquanto abanava o rabo e sorria com a boca aberta. Me abaixei e dei um abraço nele.
- Adeus, jason - falei. Em seguida, fui embora com os olhos turvos.

Almas de Estorninhos parte IIOnde histórias criam vida. Descubra agora