Torna a casa

229 28 22
                                    

Por um momento de pura ingenuidade ela pensou que seria fácil, mas voltar para casa depois de tantos anos era terrível, era como se já não pertencesse mais àquele lugar. Teve certeza que era apenas um eco do passado quando viu a mãe, Aemma, correndo atrás de Aegon que tentava bater em Aemond com um carrinho de ferro. Era a primeira vez que tinha contato com os irmãos, pois quando viajou, eles ainda nem pensavam em nascer. E apesar do amor e do instinto de proteção imediato que sentiu por eles, também se viu sendo capturada pelo ciúme.

Um tapete infantil, um cercadinho, brinquedos espalhados pelo chão, paredes coloridas, seu pai Viserys sorrindo como nunca antes havia visto e Aemma deslumbrante, mais linda e mais jovem do que se lembrava. Haviam construído uma vida nova, tiveram mais filhos e estavam felizes.

Achava muito egoísta de sua parte se sentir dessa forma, deveria estar feliz por seus pais mas estava acorrentada ao próprio fracasso e às coisas que havia perdido durante sua estadia em Nova York. Rhaenyra tinha certeza que havia sido boicotada pela vida, mas isso não deveria refletir nas pessoas com quem se importava, não podia deixar toda sua amargura ultrapassar os limites de seu corpo e desvanecer o sorriso daqueles que amava.

Quando o pai a ajudou a subir as escadas com as malas, achou que voltaria ao seu antigo quarto, mas Viserys passou direto por ele e Rhaenyra pôde ver que aquele quarto não pertencia mais a ela, havia se transformado no quarto de Aegon.

Queria perguntar aos pais onde estava os pôsteres, os quadros, os livros, os enfeites estranhos, as plantas de plástico que ficavam penduradas no estrado de madeira no teto, as lâmpadas coloridas, o violão, a cítara que fingia saber tocar e toda a quinquilharia que lhe pertencia. Mas tinha medo de perguntar e descobrir que tudo havia se tornado uma pilha de lixo no aterro mais próximo.

Agora desfazia as malas no quarto de hóspedes que antes era o sótão. Não estava achando ruim, eles haviam arrumado o lugar, era aconchegante e a cama era espaçosa, além de que ela teria uma bela visão das estrelas através da janela do teto. Apenas se sentia estranha, provavelmente pela ilusão que havia projetado a respeito de como seria quando retornasse. Na verdade ela sabia que seria diferente, mas queria que tudo fosse como era antes, queria voltar ao dia que decidiu partir e nunca ter embarcado naquele avião. Queria ter feito escolhas mais inteligentes.

Enquanto tirava as roupas de dentro da mala, Rhaenyra encontrou algo que achou ter deixado para trás. Era um par de sapatinhos de bebê, feito de crochê e bordado com o desenho de um dragão, ela mesmo havia feito. Um amargor tomou conta de seu paladar e uma dor ainda recente lhe apertou o coração tão forte que ela se viu prendendo a respiração. Instintivamente colocou a mão sobre a barriga e sentiu um vazio tão grande que parecia partir sua alma em pedacinhos minúsculos.

Rhaenyra ouviu o barulho de passos sobre as escadas e rapidamente escondeu os sapatinhos em baixo das roupas. Era Aemma, ela deu dois toques na porta entreaberta e entrou.

— Espero que tenha gostado daqui, eu e seu pai reformanos. Tivemos que colocar Aegon no seu antigo quarto e instalamos Aemond onde antes era o de hóspedes. Espero que entenda, não podíamos colocá-lo aqui, fica muito longe do nosso quarto... Seus olhos estão vermelhos, está tudo bem?

— Está! Está sim! É só uma alergia passageira, acho que é o tempo, fazem oito anos, me desacostumei com o clima daqui. Não se preocupe, mãe.

— É verdade, não é? Você agora é uma garota de Nova York!

Aemma se aproximou e deixou um beijo em seus cabelos platinados. Rhaenyra sorriu, sentia falta de Aemma, sentia falta do colo de uma mãe. Talvez se a tivesse por perto nos terríveis momentos que havia passado em Nova York, as feridas se curariam mais rápido.

Sagrado Profano | DaemyraOnde histórias criam vida. Descubra agora