Não há nada como vinho

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Meu ombro ainda ardia. Que choque foi aquele? Será que havia alguma estática do computador ainda? Ela não pareceu sentir, então não comentei nada.

Peguei o telefone, liguei mais uma vez no restaurante da noite anterior, pensando que definitivamente o dia tinha sido confuso. Sua escrita parecia que estava conversando consigo mesma. Era extremamente interessante vê-la concentrada. Escrevia com tanta facilidade como se as palavras já estivessem prontas a muito tempo no seu cérebro, mas as linhas debaixo dos olhos diziam o contrário. Seus dedos não paravam de digitar, nem por um segundo. Tentei ao máximo acompanhar sempre que ela descrevia algo. Algumas vezes precisei pedir que ela me deixasse ler por uns segundos antes de continuar para que então eu pudesse desenhar.

- Já pedi a comida - gritei da sala - vou tomar um banho. Quem sair primeiro, espera o entregador, beleza? - Ouvi um "beleza" vindo do outro quarto e entrei no meu próprio. De prontidão sentei no chão, escorada na cama e comecei a desenhar, freneticamente. Não me saía da cabeça aquela cena, então pus o que pude em detalhes: seu cabelo amarrado em um coque, um sinal na ponta da orelha, a música que ecoava na minha mente.

Droga, isso era ruim.

Fui até a mala e peguei um dos remédios pra ansiedade, ele iria diminuir a frequência desses pensamentos. Arranquei a folha do caderno e colei junto do desenho anterior na parede. Me afastei um pouco e vi que já haviam muitos desenhos ali pra apenas dois dias. Se continuasse nesse ritmo, iria precisar ocupar as quatro paredes do quarto.

Aos poucos meus pensamentos foram acalmando, e entrei no banho, totalmente absorta em outros pensamentos, dessa vez, calmos, sem a Lisa envolvida neles.

***

Alex já havia pedido comida e eu estava esperta a porta enquanto ela tomava banho. Ao voltar, seu cheiro me invadiu como um grande soco no nariz. Era forte e incrivelmente gostoso. Seu cabelo, ainda molhado, espirrava gotas de água por toda a casa, alguns escorriam pelo seu rosto branco. Pela primeira vez pude ver suas pernas, ela usava uma bermuda de moletom e a costumeira camiseta branca, dessa vez com uma estampa de uma banda inglesa.

- Nada ainda?

- Huh? - foco Lisa - Ah! Nada ainda. Devemos ligar?

- Vamos esperar mais um pouco, talvez eles tenham bastante entregas... - Seu celular tocou. Presumi ser a Amy pela expressão que foi feita. A ligação prosseguiu como a anterior, mais briga e dessa vez a vi descontrolada. Ela saiu para o quintal a fim que eu não ouvisse, mas ainda assim eu conseguia, era alto o suficiente. Falava rápido, "esse é o segundo dia que estamos aqui, e você acha que eu estou ficando com ela?", andava de um lado para outro, gesticulava com os braços, vez ou outra me olhava como um pedido de desculpas.

A conversa seguia e eu me sentia mal por aquilo. Me via na Alex assim como o Ian fez a alguns anos. Quando a campainha tocou e a comida chegou, Alex se jogou no sofá com a cabeça entre suas mãos. Lágrimas caiam no tapete, mas nenhum ruído ou fala vinha dela. Ouvi um "tudo bem, não se preocupe" antes da ligação se encerrar. Coloquei a comida em cima da mesa da cozinha e voltei para seu encontro. Ela precisava de um ombro amigo.

Ajoelhei-me à sua frente e coloquei minha mão sobre seu ombro. Ignorei todas as sensações como anteriormente e falei com a voz mais normal possível.

- Quer conversar sobre o que aconteceu?

- Na verdade, acho que preciso de álcool. - seu rosto estava vermelho, assim como os olhos. A voz saiu embargada demais, atropeladas. Não falei, esperei que ela se acalmasse um pouco e continuasse - É do feitio dela me machucar quando não gosta de algo. Sempre me diz coisas ruins, como se eu não tivesse sentimentos. Realmente não consigo mais aguentar.

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⏰ Última atualização: Jul 06 ⏰

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