Salmo 43:1

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/Izuku's POV/

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O pano de prato é branco com listras azuis.

Eles são iguais ao que sempre foram. Por vezes esses lampejos de normalidade me apanham, como armadilhas. O comum, o costumeiro, um lembrete, como um chute. Vejo o pano de prato na mão de Kyoka, ela está estendendo-o ao lado da pia. É completamente fora de contexto, e prendo a respiração. Para algumas pessoas, de algumas maneiras, as coisas não mudaram tanto assim.

Os panos de prato não mudaram.

Ela apanha a cesta da minha mão.

- Eu trouxe laranjas. - arrisquei.

- Não te dei vales para isso. Como conseguiu? - Ela me indaga, pondo as compras sobre a mesa.

- Foi como um desconto. Eles descontaram devido ao nome do comandante.

- Não está se achando demais por ser Aia dele, né? - Pergunta, como se estivesse insinuando.

- Não...não é isso. Eu só vi as laranjas lá e as trouxe. Achei que... - Balanço a cabeça. Saio do meu raciocínio. Desisto de dar satisfação para ela. Ela nunca foi gentil comigo.

- Achou que?

- Esqueça. - cruzo as mãos e saio da cozinha. Mas antes de entrar no corredor, viro os calcanhares e olho para ela. - Não se se esqueça do meu banho, daqui a duas horas. - Digo, como uma ordem. Kyoka me olha, com a cara de nojo que ela sempre teve de mim. Mas ela não revida. É o dever dela.

Aliás, eu sou fértil, sou uma casta acima da sua. Querendo ou não.

Subo as escadas, após passar pelo corredor sombrio. Aguardo lá para que Kyoka venha e me trate como uma de suas muitas tarefas domésticas. É isso que eu sou para ela: um afazer. É assim que ela me enxerga. Eu sei que é daqui a duas horas, mesmo assim...sinto pressa em nossas ações.

No entanto, escuto badaladas. Rezo para que não sejam três de três.

*Blém blém blém*

Respiro fundo.

*Blém blém blém*

Punhos serrados.

*Blém blém blém*

MERDA!

Quando o sino toca três baladas seguidas por três toques, só quer dizer uma coisa: Um Salvamento.

Rapidamente, troco as minhas botas. Desço as escadas e vou até a cozinha, pronto para recitar a prece do Salvamento. O certo é fazer ela ao Comandante e a Mandame. Mas não sei onde eles estão. Está apenas eu e Kyoka na casa.

- Abençoado dia, fui chamado para...-

- Eu ouvi. - Kyoko me interrompe. - A caminhonete vermelha já está na porta. - Ela é direta, sinto vergonha por isso. Por sorte, fui privado daquela prece ridícula. Eu nem sabia mais como recitá-la.

De repente, a esposa do comandante surge na porta.

- Você é surdo? Os sinos já tocaram! Se  apresse! - Ela grita comigo, batendo palmas. Como se eu fosse uma criança atrasada para a escola. - Você já faltou ao último Salvamento. Não quero que as outras senhoras fiquem dizendo que minha Aia não vai aos momentos sagrados. - Continuo a ouvi-la, enquanto me dirijo até os fundos. - Sob o olho dele.

- Sob o olho dele. - Me despeço, então fecho a porta. Vejo Kyoka antes disso, ela está sorrindo, debochando. Então, se despede também.

- Vá com a graça.

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⏰ Última atualização: Jul 07 ⏰

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