Um começo

3 0 0
                                    

Era uma noite fria de outono na França. Nessas noites, os passos ecoam de forma diferente, como se o próprio ar gelado os engolisse antes que pudessem se espalhar. As pessoas caminham apressadas, com cachecóis enrolados no pescoço e mãos enfiadas nos bolsos, tentando escapar da mordida do inverno urbano. Os cafés se tornam refúgios acolhedores, com janelas embaçadas que revelam silhuetas de pessoas conversando em mesas iluminadas por velas ou luzes suaves. O aroma de café recém-moído paira no ar, misturando-se com o cheiro distante de lenha queimando em alguma lareira próxima.




Nessa noite de maio, eu caminhava apressadamente com meu vestido marrom e meu lindo cachecol, atraída pelo desafio do meu curso na Faculdade de Letras em Belford. Quando esbarrei acidentalmente em um homem, o impacto do encontro foi avassalador; nossos olhares se prenderam intensamente, e no silêncio que se seguiu, uma corrente elétrica de desejo e afinidade nos envolveu instantaneamente. Era como se o tempo parasse enquanto nos perdíamos um no outro, descobrindo uma conexão tão profunda que o mundo ao redor parecia desvanecer-se.




— Desculpe-me por estar no seu caminho, você está machucada? - disse ele, com olhos que transmitiam preocupação e um jeito de falar que parecia suavizar o frio da noite.




Me mantive olhando para ele, hipnotizada pelo brilho do seu colar com uma pedra da lua. Seus cabelos pretos e desarrumados conferiam-lhe um ar rebelde e irresistível. A vestimenta elegante destacava-se com perfeição, enquanto seu jeito encantador me cativava a cada movimento. Seus olhos castanhos, profundos e enigmáticos, encontravam os meus, e seu sorriso grande e contagiante iluminava o ambiente. A pele branca realçava ainda mais sua presença imponente e magnética. Não consegui desviar o olhar, totalmente fascinada pela sua beleza deslumbrante e aura irresistível.




— Está tudo bem, não foi nada", respondi para ele, corada de vergonha.




"Meu nome é Rich..." Antes de completar a sua frase, uma multidão de pessoas veio vindo buscá-lo, pareciam seus amigos.




— E aí, parceiro, vamos indo, né? O menino de chapéu logo o pegou pelo braço, e de repente uma sombra tomou conta da sua presença.




Tentei me convencer de que não me importava tanto, embora uma parte de mim soubesse que era mentira. Nunca o tinha visto antes e não fazia ideia de onde ele viera. Meu relógio me lembrava impiedosamente que eu estava muito atrasada. As aulas em Belford sempre começavam cedo, e a minha começava às 08:00. Eram exatamente 07:50 e eu ainda estava a vinte minutos da faculdade. A ansiedade pulsava em minhas veias, mas algo em mim não conseguia se desvencilhar daquela figura misteriosa que havia cruzado meu caminho.




Enquanto corria para pegar o próximo metrô, aqueles olhos grandes e muito castanho, ainda me assombravam. O trem finalmente chegou, e eu entrei, buscando um lugar onde pudesse me sentar e organizar meus pensamentos. A imagem de Rich, com seu colar brilhante e sorriso encantador, estava gravada na minha mente.




O metrô balançava suavemente, mas minha mente estava em tumulto. As portas se abriram na minha estação, e eu corri pelo corredor até a faculdade. Cheguei finalmente, exausta pela corrida contra o tempo. Subi as escadas apressadamente e corri pelo corredor até a sala de aula. Quando finalmente cheguei, a porta já estava fechada. Respirei fundo, tentando recompor-me antes de entrar.




Ao abrir a porta, todos os olhares se voltaram para mim, e o professor Klaus interrompeu brevemente sua explicação. Murmurei um pedido de desculpas e me apressei para um assento vazio no fundo da sala. Enquanto tentava me concentrar na aula, minha mente continuava a vagar. Quem era ele? Por que havia me impactado tanto?




O resto da manhã passou em um borrão. Cada vez que eu tentava me concentrar, a imagem dele voltava com força total. Ao sair da última aula, decidi que precisava descobrir mais sobre ele. Eu sabia que era um impulso irracional, mas a curiosidade e a atração eram fortes demais para serem ignoradas.




Fui para o meu lugar favorito, a biblioteca. Sentei-me, tentando encontrar alguma maneira de esvaziar minha mente nos livros, e assim fiz. Escolhi um local com vista para o lado de fora, na esperança de encontrar algo que realmente me interessasse, mas nada parecia prender minha atenção.




Meu falecido pai, Francis, era uma pessoa das artes. Cantava como ninguém e viajava pelo mundo para descobrir suas belezas ocultas. Nessas viagens, conheceu a dançarina Zoé, que tinha dezoito anos na época e que agora é minha mãe. Ela sempre me ensinou que os melhores livros estão escondidos, esperando para serem descobertos.




Enquanto folheava as páginas de um livro qualquer, minhas lembranças se misturavam com as palavras impressas. A imagem de meu pai, cantando suas canções em voz alta, enchia meu coração de uma melancolia doce. Pensei em como ele viveria cada momento com intensidade e paixão, e me perguntei se ele teria sentido o mesmo ao encontrar minha mãe.




De repente, senti uma pontada de inspiração. Levantei-me e comecei a procurar nas estantes mais altas, mas precisava de uma escada, algo grande. Por sorte, havia uma ao lado da porta. Eu estava me dirigindo à escada quando alguém me parou.




— Olá, com sua licença, você iria pegar? — Aquele tom de voz doce estava ali, os olhos grandes e o cabelo igual. Era ele, Rich...




Ele não tinha me visto ainda, estava muito concentrado no livro que estava em sua mão. Meu coração disparou ao reconhecê-lo, e por um momento, fiquei paralisada.




— Rich? — Chamei suavemente, tentando esconder a surpresa na minha voz.




Ele levantou a cabeça, os olhos encontrando os meus. Um sorriso lento e reconhecedor se espalhou pelo seu rosto.




— Olá! — A surpresa e a alegria evidentes em sua voz.




Nossos olhares se prenderam novamente, e foi como se o tempo parasse mais uma vez. A biblioteca ao nosso redor desapareceu, deixando apenas nós dois, imersos naquele reencontro inesperado.




— Eu... não esperava te encontrar aqui — disse ele, dando um passo mais próximo. — Você está bem?




— Sim, estou bem. Só estava procurando um livro — respondi, tentando conter o turbilhão de emoções que me invadiam.




— Parece que o destino está brincando com a gente, não é? — Ele riu, e aquele som suave parecia aquecer o ambiente frio da biblioteca.




— Acho que sim — sorri, sentindo-me mais relaxada. — Você também gosta de livros escondidos?




— Adoro. Sempre achei que as melhores histórias estão nas prateleiras mais altas — ele disse, apontando para a estante atrás de mim. — E parece que essa busca nos trouxe juntos novamente.




— A me desculpe, nao sei o seu nome ainda.. — Me senti feliz e ansiosa — Me chamo Richard




— Mellyne, e um prazer Richard.



Em busca do para sempreOnde histórias criam vida. Descubra agora