As duas amigas estavam a alguns quarteirões da escola, após cruzarem o portal manipulado por um colega maconheiro do mesmo clube de artes que Chaeyoung. O jovem as ajudou com a escapada furtiva do dormitório enquanto tragava forte a fumaça em seu bong. O portal tinha uma aparência gosmenta nojenta, era como uma fenda no ar e não permitia ver o outro lado, apenas uma mistura de cores psicodélica.
Dahyun não queria entrar, não iria, mas havia sido empurrada antes que pudesse questionar. Ela gritou, porém logo tampou a boca com medo de ingerir seja lá o que fosse aquilo. A sensação de cruzar um portal era desconfortável e nauseante, felizmente mais rápida do que esperava. Levou apenas dois segundos antes de cair no outro lado, de cara na rua vazia. Chaeyoung saiu em seguida, andando graciosamente, claramente habituada ao meio de transporte excêntrico. A fenda se fechou em milissegundos atrás de si, como se nunca houvesse estado lá.
— Não precisava ter empurrado! — Dahyun resmungou levantando e batendo em suas roupas.
— Claro que precisava, você estava com aquela sua cara de nojo aristocrata e eu sabia que não ia entrar.
Quando ficou limpa o suficiente, parou e observou ao redor.
— Ainda estamos na cidade alta.
— O Minho não conhece o subúrbio e só pode projetar os portais a lugares que já frequentou antes.
Estavam na frente de um motel. Dahyun revirou os olhos. Aparentemente os alunos de tanto prestigio da legacy não possuíam lá muita classe.
— Como tem tanta certeza que ele não vai nos dedurar?
— Porque ele me deve. — Chaeyoung estava convicta — Agora vem, sobe aqui.
Sua melhor amiga montava uma moto custom que havia projetado ela mesma, sorria tão animada que assustava e lhe estendia um capacete extra vindo da mesma origem. Como se Dahyun fosse aceitar aquela proposta insana.
— Eu não subo ai, mas nem se me pagarem.
— Que atitude é essa, não confia no meu dom? Estudei um mês inteiro pra projetar essa belezinha, posso te garantir que funciona como a real. Talvez até melhor.
— Não me refiro a moto, desde quando você tem carteira de motorista?
— Sabia que ia dizer isso - Chaeyoung só esperava a deixa, enfiou a mão no bolso e de lá retirou um documento. — Aqui está, habilitada!
Dahyun não acreditava em tamanha cara de pau.
— Documentação desenhada não vale.
A artista bufou e o documento se desfez no ar em tinta escura.
— Você é uma chata, posso não ter carta oficial, mas sei pilotar. Venho praticando escondido dos meus pais a meses! eles acham que estou numa aula louca de etiqueta para damas, só que o Minho me tira de lá com seus portais; em troca desenho pra ele algo divertido de ver quando está chapado. - Chaeyoung segurou a manopla e torceu gentilmente, fazendo o motor roncar como uma moto real soaria. — É apenas uma intruder, tem baixa cilindrada e vou devagar, juro. Que outra escolha temos? Nenhum uber vai aceitar levar duas adolescentes ao subúrbio essa hora.
Chaeyoung usava a arma mais baixa de persuasão que possuía: seus olhos redondos de filhote caído na mudança e, bem, ela tinha um ponto valido. Dahyun suspirou derrotada, montou aceitando o capacete reserva, não havia outra escolha, afinal.
— Isso vai ser demais! - Sua melhor amiga riu e deu partida, o motor roncando alto nas suas vazias e silenciosas.
Andaram a uma velocidade agradável, desbravando a cidade noturna toda iluminada. Dahyun se surpreendeu com tantos pontos bonitos antes não apreciados. Ela vivia de maneira tão automática que os detalhes passavam despercebido a seus olhos. Sorriu genuinamente enquanto abraçava a amiga, sentindo o vento acariciar sua face. Não se tratava apenas do destino a essa altura, estaria aproveitando o passeio.
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O Legado (Saida)
RomanceEm um mundo onde poderes sobre-humanos eram não apenas possíveis, como admirados, Dahyun crescia com seu legado escondido da sociedade, se passando como apenas mais uma comum sem muito valor. Isso até o dia em que se encontra em um impasse moral, ap...