V.

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Quando os olhos de Dabi encontraram a vista do outro lado da janela, a fumaça cinzenta escapou de sua boca como um sopro. Alguém se remexeu ao seu lado na cama, um corpo nu enrolado em um emaranhado de cobertas pretas.

- Touya. - ele o chamou, com uma voz fraca, sonolenta e manhosa.

- Uh? - o moreno tragava em puxadas fundas, balançando o cigarro entre os dedos.

Estava escorado na parede, apenas um travesseiro magro impedindo que a pele de suas costas se encontrasse com o frio da parede, mas ele se sentia assim, mesmo abaixo das cobertas... Hawks o fazia se sentir assim, frio.

Agora com os olhos sobre ele, avistou uma marca arroxeada em seu pescoço.

"Não fui eu." Foi a afirmação que equivaleu a um soco bem dado na boca de seu estômago. "Então foi aquele homem."

- Você disse que ia parar de ver ele. - sua voz saiu tão glacial quanto aquele quarto. Aquele dia, aquele cigarro, aquele homem, e sinceramente, aquele relacionamento.

Hawks, ou melhor, Keigo Takami, ergueu seu corpo na cama, apenas o suficiente para se sentar e encarar fixamente os olhos ferozes e carregados de Dabi.

- Você não vai dizer nada?! - gritou.

- Ele precisava de mim. Então eu fui.

Deus, como Keigo conseguia dizer aquilo olhando Touya nos olhos? O moreno estremeceu, uma raiva subindo à cabeça junto a uma dor desconcertante no peito.

- É o meu pai, Keigo! Você não entende o quanto isso é nojento?! - Dabi o empurrou com força pelos ombros, Hawks caiu para fora da cama junto às cobertas. - Por que aquele cara?! Por que ele e não eu?!

Quando Dabi vira Hawks pela primeira vez, fora em um jantar de família do qual o loiro foi convidado. Com apenas vinte e dois anos de idade na época, Keigo se destacava na empresa cujo o pai de Touya era chefe, eles eram bons amigos, às vezes mais que isso. E logo, Keigo já fazia parte de todas as refeições e noites de jogos. Dabi se apaixonou por ele. Era apenas uma criança tola de dezessete anos de idade.

Tinha vinte e dois agora, e era desesperador olhar o quanto eles não haviam evoluído em nada. Morava com Hawks em seu apartamento desde que havia deixado a casa de seu pai, e mantinham aquela estranha relação carnal desde então. Dabi era completamente preso à Keigo, mas não pelo tipo belo de amor, e sim o pior tipo: o dependente, o cortante, o destruidor. Sentimentos tão fortes em seu peito que poderiam facilmente rasgá-lo de dentro para fora a qualquer momento. E, sinceramente, entregar seu coração desse jeito nas mãos de alguém como Hawks era praticamente implorar para que ele o quebrasse.

Dabi sabia disso, mas o que podia fazer? Keigo fora seu primeiro amor na adolescência, e não havia o superado desde então. O amava tanto que doía, aquilo era o que todos desejavam, não? Ser amado tanto por alguém a ponto de que essa pessoa lhe desse a própria vida de bom grado...

Não dava para se dizer que Hawks pensava dessa forma, mas, de algum jeito bastante distorcido, ele provavelmente sentia algo sincero por Dabi.

Mas, claro, aquilo nunca foi o suficiente para fazê-lo deixar Enji Todoroki.

- Talvez porque ele não age como um adolescente. - respondeu friamente ao erguer os olhos para Touya.

- Eu não sou mais uma criança! - Dabi gritou enfurecido, se pondo acima de Hawks e o prendendo contra o chão. - Eu não vou continuar sendo o seu brinquedinho, Keigo! - Hawks o olhava fixamente, sem esboçar reação alguma. A raiva fulminante nos olhos de Touya se transformaram em uma dor genuína, e todo ódio pareceu prender em um nó que se formou na garganta. Sua voz se partiu ali mesmo, fraquejando. - Se você não me ama... por que continua me mantendo por perto?

Lov(e) * shigadabiOnde histórias criam vida. Descubra agora