Capítulo 3

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— Espera, o Edward Munson falou com você? — Kate fechou a porta assim que entrei em seu quarto. Mesmo depois de sua mãe dizer para manter as portas abertas, ela desconfiava que eu era o "mau caminho" que a filha dela trilhava, e eu meio que era mesmo.

— Sim. Pedindo desculpas. — Me joguei sobre sua cama perfeitamente arrumada, olhando para o teto cheio de estrelinhas coladas. — E... ele e Florence não estão mais juntos.

— Muitas informações e nenhuma coerência. — Kate se sentou na cadeira giratória e deslizou para mais perto. Colocou as pernas sobre a cama e pensou.

Me virei de bruços, esperando ela formular em sua mente de gênio as possibilidades e me ajudar a entender toda aquela merda.

— Droga... — Ela soltou e se levantou, procurando em seus inúmeros livros algum específico. — Eu já disse para você ler Stephen King. Aqui... bem aqui!

Kate levantou o livro "Carrie" e jogou do meu lado. Eu revirei os olhos para ela, já sabendo o que iria dizer. O popular se aproxima da esquisita da escola, "termina" o relacionamento com a popular para conquistar a esquisita, leva-a ao baile de formatura, seus amigos jogam sangue de porco nela, e ela mata a escola toda.

Eu, no caso, seria a esquisita, Eddie o popular, e os porquinhos da senhora Novak estariam em perigo.

— KATE. — Ralhei com ela, que gargalhou, se jogando de volta na cadeira.

— Sério, se você adquirir poderes, por favor, me deixe viva. — Ela ainda ria quando terminou a frase, se aproximando ainda mais de mim. — Amiga, olha... Eu acho que o Eddie não é como o pai dele. Ele realmente é o garoto de ouro de Hawkins. Existe um boato de que até é virgem. Vai saber, às vezes ele está tentando fazer algo bom...

— Uma caridade?

— Chrissy...

— Eu não preciso da caridade dele. — Kate guardou o livro, suspirou e voltou-se para mim.

— Eu sei que você gosta dele... — Meus olhos fumegando de ódio a acertaram em cheio. — Desculpe, gostava... Tinha uma quedinha. Enfim, sei que isso está mexendo com você, ou não estaria aqui me pedindo ajuda. — Ela tinha ganhado nessa, mexeu muito comigo. — Mas, não leve isso tudo muito a sério.

"Ele nunca vai olhar pra você, esquisita." A voz da Florence de dez anos atrás, ainda no fundamental, gritou em minhas memórias. Depois da disputa de talentos, quando ele recitou um poema autoral e eu toquei meu solo de guitarra, ele me elogiou, disse que ficou arrepiado com minha música, sorriu e foi abraçar a mãe. O que era uma quedinha naquele momento se transformou em meu primeiro amor aos sete anos de idade.

Lembro-me de falar para mamãe sobre ele, e ela beijou minha bochecha e sorriu, dizendo: "O garoto que tiver seu coração precisa ser merecedor, porque você é a garota mais preciosa que eu já conheci."

Edward Munson não era merecedor dele. Mesmo que ele insistisse em disparar sempre que eu o olhava.

— Eu sei, Kate, ele nunca olharia pra mim desse jeito.

— Não foi isso que eu disse. — Kate se sentou ao meu lado, segurou meu rosto com as duas mãos. — Vocês são de mundos diferentes. Ele vai se casar, ter filhos e ser prefeito daqui. Você vai ser uma famosa guitarrista em Los Angeles. A conta não fecha.

Eu sorri e a empurrei de leve. Ela tinha razão; mesmo que ele me olhasse um dia, éramos diferentes demais. Ainda assim, eu estava intrigada.

— Vamos descobrir o que ele quer com você, e vamos afastá-lo o mais longe possível.

— Combinado. — Levantei-me e fui para a porta. Voltei a olhar para minha amiga; quis dizer que sentiria a falta dela, mas Kate odiava essas coisas, então apenas perguntei: — Posso levar o livro? — Apontei para onde ela guardou "Carrie", junto com sua coleção completa das outras obras do autor.

— Óbvio. Finalmente! — Kate festejou e me entregou o livro. Abracei-o junto ao peito e fui embora. Kate não sabia, mas esse livro nunca mais voltaria para sua estante, pois seria minha lembrança dela. Que ficaria guardada na minha estante.

Caramba, o livro era bom mesmo. Eu estava totalmente entregue às linhas que Stephen King escreveu. O jornalista ainda era meu personagem favorito; ele tinha tanta gana e nos deixava completamente vidrados nas páginas. A porta de casa abriu e fechou, o que me fez dar um pulo de susto na cama.

— Sissy? — Graças às deusas, era Hanna. Fechei o livro com um marcador e fui ao seu encontro.

— Oi, tia. — A encontrei bebendo água direto da garrafa de frente com a geladeira. — Bonito, vai encher antes de guardar, né?

— Que isso? Papéis trocados? — Ela riu, deixando a garrafa sobre a pia. — Consegui um freelance no Hideout hoje. Você vai também? — Eu neguei, afinal, amanhã é sexta-feira e eu tinha aula.

— Não, amanhã tem aula e eu não posso mais faltar a aula da senhorita Blame. — Hanna acenou concordando e foi para o quarto. — Tia? — Ela me olhou esperando eu continuar. — Estamos bem há um tempo, não precisa se matar tanto assim...

Eu falava sobre ela trabalhar demais. Um dos motivos pelo qual eu mais queria sair daqui era para deixá-la em paz, podendo viver a vida dela tranquilamente, sem a responsabilidade de uma adolescente.

— Eu estou cobiçando uma bota envernizada há muitos dias, e ela custa uns duzentos dólares. E eu quero muito ela. Não estou fazendo isso para pagar contas, Sissy... mas pra fazer mais uma.

Eu ri com ela, já que parecia estar sendo sincera. Hanna era muito bonita, tinha os cabelos loiros e longos, e os olhos azuis iguais aos meus. Estava chegando aos quarenta e cinco anos, mas era deslumbrante.

— Vou indo. — Ela beijou minha cabeça e saiu pela porta. Tranquei-a, olhando-a sair com seu Gurgel todo caindo aos pedaços.

Voltei para o livro, mergulhando nas páginas bizarras da história de Carrie, pensando como Kate. Fazia sentido se Edward estivesse mesmo planejando um trote desses. Nunca fiz nada para ele, mas para os amiguinhos, já fiz bastante.

Há dois anos, eu dedurei o uso de maconha do capitão que antecedeu ele no time. Afinal, fui eu mesma que havia vendido para ele. Steve era um imbecil que vivia zoando a Kate e outros garotos que curtiam jogar RPG no intervalo. Acabou que Steve perdeu a namoradinha do jornal e me ameaçou, dizendo que eu pagaria caro pelo que tinha feito. Depois disso, fui alvo deles, mas nunca me rebaixei. Antes disso, sempre fui excluída. A família Munson odiou que eu sobrevivi ao acidente dos meus pais. Eu era uma testemunha. Uma testemunha que, com os anos, deixei ainda mais clara minha repulsa pela família. Então, ele tem todos os motivos, e eu preciso ficar longe dele.

Olhei para meu relógio ao lado da cama e percebi que já estava na hora da princesa aqui estar na cama. Fechei novamente o livro e fui escovar meus dentes. Não dava para não pensar em tudo que aconteceu hoje. Eddie era tão bonito, caramba. Que ódio, meus hormônios pareciam várias biscatinhas pinicando minha pele. Me olhei pelo espelho pequeno do banheiro.

Eu não era feia, mas também não era maravilhosa. Meus olhos eram grandes demais e meus dentes da frente eram tortos. No passado, fui chamada de coelhinha. Além disso, eu odiava meu corpo e mantinha-o bem coberto para que nem eu mesma o visse.

Enxaguei a boca e voltei para o quarto. Minha imagem era incômoda para mim. Me olhar e ver meus defeitos não era o que eu mais gostava de fazer. Então, eu preferia nem me olhar muito e deixar que minha inteligência e senso de humor atraíssem alguém aqui e ali. E deu certo, mas nunca daria certo com Edward Munson.

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⏰ Última atualização: Jul 22 ⏰

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