Capítulo 2

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Repostando, porque a edição doa capa estava cagad*

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Kate deitou a cabeça no meu colo enquanto estávamos na arquibancada. As líderes de torcida estavam ensaiando e os jogadores treinando, enquanto nós duas aproveitávamos o espaço e o tempo para fofocar sobre a vida da cozinheira Janice e do bibliotecário Jonas.

— Sério, eu acho que ela merece algo melhor — disse, buscando meu cigarro na bolsa. Mesmo que o treinador Julius estivesse por ali, eu sabia os horários de café dele.
Acendi o cigarro e passei para Kate, que tragou e soltou a fumaça enquanto falava:

— Sei lá, ele parece legal, só é tímido.
Peguei o cigarro dos dedos dela e traguei, deixando a fumaça me desorientar por uns segundos.

— Ele é um lerdo. Ela quase se esfregou nele no baile de inverno. Ele secou ela a noite toda, era só tomar a iniciativa.
Kate deu de ombros, sentou-se na arquibancada e buscou os horários das próximas aulas.

— Preciso passar na biblioteca antes de ir para a aula. Você tem literatura agora? — Antes que eu pudesse responder, Florence subiu dois lances da escada e parou na nossa frente.

— Vou dar um minuto para as esquisitas saírem daqui com essa fumaça fedorenta, ou vou chamar o diretor Higgins. — Kate e eu ficamos travadas ainda sentadas, e nos olhamos antes de cair na gargalhada. Kate se jogou para trás enquanto eu batia a palma da mão nas coxas. O pé da moça estava batendo num ritmo muito rápido, o que me fez rir ainda mais, a ponto de doer minha barriga.

— Uau, Florence. Eu estou morrendo de medo. — Kate se levantou, ficando mais alta que a líder de torcida, fazendo-a se afastar. Ela tragou uma última vez o cigarro e jogou a ponta ainda acesa nos pés da loira.

— Não me provoca ou...

— Ou o quê? — perguntei, me levantando, descendo dois degraus e ficando no mesmo que ela estava. Florence desceu mais um e se virou, andando de volta para o campo.

— Vocês são duas esquisitas de merda — ela gritou já no gramado. Puxei minhas mãos para cima, fazendo chifrinhos de demônio e botando a língua para fora. Kate desceu os últimos degraus ainda rindo muito. Olhei novamente para o campo e vi Edward parado, observando a cena, provavelmente temendo pela segurança da namoradinha.

Acenei para ele e mandei um beijo encenado e exagerado. Acho que a distância em que estávamos me deixou em dúvida, mas parecia que ele tinha ficado envergonhado, o que me fez rir um pouco. Corri para ir atrás de Kate.

— Nos vemos mais tarde, hoje? — perguntei, tentando alcançá-la.

— Não vai dar, Chris. Preciso preparar minha dissertação. — Eu sabia que minha amiga estava preocupada com a universidade.

— Sem problemas, a gente se vê amanhã na aula. Vou aproveitar e ensaiar a melodia que criei hoje na aula de literatura.

Kate riu baixinho e acenou se afastando. Fui para meu armário buscar minha bolsa. Eu iria matar as duas últimas aulas e ir para casa, estava sem saco para outras aulas. Puxei a alça da mochila, mas ela enroscou no metal do armário.

— Chrissy? — Aquela voz rouca! Eu conhecia. Munson estava de novo falando comigo, pela segunda vez. Que saco.

Saí de trás da porta do armário e encontrei os olhos castanhos e quentes do atleta, ainda suado do treino, com um sorriso de lado e as mãos fortes segurando a alça da própria mochila. Mas o que ele queria comigo, que droga.

— Quem quer saber? — brinquei, fechando meu armário com força desnecessária. Certeza que veio tirar satisfação pelo ocorrido com a namoradinha.

— Não sei o que aconteceu no campo mais cedo, mas quero...

— Veio defender a namorada? Cara, fica de boa, foi ela que veio encher nosso saco. — Me virei, tentando me afastar.

— Não, eu não vim falar com você por causa dela, na verdade ela nem é minha...

— Edward.

— Eddie — ele me corrigiu, abrindo ainda mais o sorriso largo e branco.

— Edward, Florence que veio azucrinar a gente. Não queremos confusão com a rainha do baile. — Toquei em seu ombro, como se o confortando, mas ele olhou para minha mão e por um momento achei ter visto sua respiração falhar. Retirei minha mão dele bem rápido.

— Chrissy, eu quero me desculpar. Por ela. E ela não é mais minha namorada. Acho que foi minha culpa ela ter ido até vocês hoje.

— Sua culpa? — Meu nome saindo de sua boca me causou arrepio. Já pensou esse cara enorme e suado sussurrando meu nome enquanto eu sento...

— É, eu meio que estava olhando na direção de vocês, e ela perguntou, daquele jeito passivo-agressivo dela, por que eu estava olhando... Sabe, acabei falando da fumaça do cigarro. Não esperava que ela fosse até lá. — Ele se encostou no armário e mordeu de leve o lábio inferior. Caramba, apertei minhas coxas porque era uma visão e tanto.

— E por que estava olhando pra gente? — O olhar dele estava intenso, os olhos cor de chocolate desceram para minha boca, e eu entrei num estado de pânico. Um alerta vermelho soou muito alto na minha cabeça. Será que eu estava alucinando? — Não quero saber, manda ela ficar longe da gente.

Eu corri, praticamente. Andei tão rápido para fora da escola que achei que tinha gastado toda a sola do meu tênis. Entrei na minha van e apertei todos os botões de que me lembrava. Precisava sair logo dali. Eu não precisava que garotos bonitos e populares brincassem comigo. Sobrevivi sem isso até agora. Não era hora de deixar um estragar minha sanidade, mesmo que fosse Edward Munson, minha paixão do jardim de infância.

A televisão estava chiando como sempre. O novo clipe da Cindy Lauper estava um horror, mas eu gostava da música. Mudei de posição deitada no sofá e peguei o refrigerante que estava na mesa de centro. Os eventos daquela tarde repassaram em minha cabeça involuntariamente. O que aquilo tudo significava, afinal? Edward Munson, simplesmente, acordou no dia primeiro de janeiro e pensou: "Vou parar de fingir que os esquisitos não existem e começar minha busca por votos para suceder meu pai"? Nunca falou comigo na vida. Agora estava cheio de sorrisos.

Me sentei e desliguei a televisão, andando pelo trailer inquieta. Eu sei que Kate precisava estudar, mas eu precisava conversar com alguém que tinha os pés no chão, e ela era essa pessoa. Eu era a sonhadora, ela era a razão.

Peguei as chaves da van e calcei meu tênis surrado, prendi meus cabelos de qualquer jeito, apenas para não assustar as crianças do lado de fora. Enquanto decidia se ia mesmo ao encontro dela, numa dúvida se atrapalhava minha amiga ou não, olhei pelo espelho retrovisor e vi o carro eleitoral do Al Munson parado na rua lateral. O prefeito estava numa pequena roda de moradores, sorrindo e batendo nas costas dos idiotas que o apoiavam.

Vocês devem estar se perguntando o motivo do meu descontentamento com essa família. Bom, vejamos. Al Munson era assessor do prefeito interino quando meus pais sofreram aquele acidente. A ponte estava em reforma e ficou por anos sem regularidade ou medidas de segurança. Nos jornais locais, Al supôs que meus pais estavam embriagados e que um acidente não colocaria as obras mais importantes de lado para terminarem a construção de contenção nas bordas da ponte.

Lembrar disso despertava todo o meu ressentimento por aquela família. Foi exatamente ali que minha ilusão quanto ao Edward Munson desapareceu. Eu odiei cada membro daquela família e a prefeitura pelos sete anos seguintes, e hoje ver ele me causava enjoo.

Acelerei, saindo o mais rápido possível, antes que eu jogasse a van no carro ridículo dele. Apertei tão forte o volante que doeram as juntas dos meus dedos.

What if... Hellcheer do avessoOnde histórias criam vida. Descubra agora