Prólogo

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Havia uma linha divisória entre as classes, algo profundamente gravado em suas vidas fúteis, mas deveras significativa para os demais.

Talvez, a agulha no palheiro não fosse essencial, era apenas uma variante incompetente e pior do que a original perdida e que talvez nunca devesse ter sido encontrada.

Era uma aparência comum e ridícula, pelo menos deveria ser. Aqueles traços infantis iriam sumir com o tempo, mas outro problema surgiria em torno de seu perfume, corpo e sua própria e lamentável existência.

Não foi surpresa ver aquela figura tão miúda e acanhada sofrer nas mãos dos outros, mas foi surpreendente seu despertar tão precoce.

Era ignorante ele pensar em se intrometer, não era problema dele mesmo que fosse o maior causador de problemas que seus professores já viram.

Eles eram crianças, com cerca de dez anos e o afloramento dominando seus corpos.

O pequeno e jovem alfa afundou o rosto em seus braços na carteira marrom, a luz ultrapassava os vidros das janelas. O intervalo passou de forma lenta, sem proveito algum de brincadeiras ou até da comida.

A sutileza do aroma de eucalipto e hortelã dançou de forma suave até seu nariz arrebitado.

Seus olhos rubros se forçaram a encarar a figura doce nas carteiras diante da velha lousa de giz. A marmita aberta tinha um cheiro bom, mas uma quantidade precária de alimentos.

Bem, crianças não eram educadas, ele mesmo não se considerava alguém com uma boa educação, mas seu sangue ferveu ao ver uma lata de suco ser virada no cabelo encaracolado de cor escura.

O garoto não se mexeu, permaneceu parado e mordeu os lábios tentando impedir um choro ou algo do tipo.

A sala cheia de desenhos pelas paredes e decorações infantis foi preenchida por risadas longas e estridentes.

O dono do perfume natural de caramelo e castanhas se moveu incomodado.

Ignorando os extras de sua sala, ele puxou o cabelo da menina e deixou escapar um rosnado bruto sem ligar para o grito fino. Os feromônios agressivos eram o suficiente para arder os pequenos narizes.

— Não mexa com o que meu. — a frase soou baixa, mas dura o suficiente para descontar as consequências implícitas nas palavras.

Aquele ômega era dele e mesmo nunca tendo se falado antes, Katsuki se tornou alguém importante na vida da criança de olhos verdes e sardas pelo rosto fofo.

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A coleira pesada no pescoço da criança era como uma metáfora para seus limites.

Se ele não tomasse cuidado, seria mordido por um alfa precocemente, mas ao mesmo tempo, já se via preso em uma vida repleta de angústias.

Como um cão acorrentado em seu próprio quintal.

Ele sabia que não deveria ligar para comentários de mau gosto, que não deveria se deixar levar pelo bullying e nem por risadas, mas por que se importava tanto?

Talvez fosse o perfume caramelado ou o doce sabor das castanhas, mas ele não queria continuar de cabeça baixa eternamente só porque pertencia à pior classe de subgêneros.

Ele era um ômega, mas o problema estava justamente em ser um homem.

Uma criatura capaz de engravidar com as mesmas propriedades que uma mulher, a chance era baixa, mas não impossível.

Ele era a tal aberração.

Um completo inútil que precisava da ajuda dos outros e ainda precisava ser protegido já que ele mesmo não tinha tal capacidade.

Quando a Meia Noite Chegar - Bakudeku ABOOnde histórias criam vida. Descubra agora