E se... (RadioApple)

Chuva

     Duas semanas haviam se passado desde o encontro de Alastor com Lúcifer. O moreno havia passado mais tempo trabalhando com seu programa de rádio, estava focado. Não tinha tempo para pensar em alguma outra coisa. 

     O sol já começava a se pôr e Alastor estava sentado no chão da varanda. O céu estava coberto por nuvens cinzas, e, vez ou outra, o som de um trovão ecoava. Estava nítido que ia chover, mas o radialista queria sair de casa. Não havia motivo nenhum, ele não planejava matar ninguém, apenas queria sentir a água da chuva encharcar seu corpo.

     Alastor fecha o livro que estava lendo e o deixa sobre a cadeira que estava ao seu lado. Ele termina de tomar o café da caneca, sentindo aquele tão familiar cheiro de chuva. Não demora muito para que as gotas comecem a cair, uma garoa.

     Ao entrar em casa, o moreno ouve passos e se vira novamente para a porta, vendo Lúcifer parado na varanda. Alastor sorri. O loiro entra e fecha a porta atrás de si.

     — Não sei se vai gostar da ideia — O maior começa e Lúcifer sorri de maneira irônica. — Me desculpe, senhor... Olá! Como vai? Gostaria de ir dar uma volta sob a chuva e apreciar um momento na companhia de minha pessoa?

     — Idiota. — O mais velho revira os olhos. — Vou bem. E quanto a você? — O moreno acena com a cabeça. — Sabe, eu sou um anjo, um ser, tecnicamente, imortal... já você, meu caro, é apenas um humano. Não acho que seja uma ideia muito inteligente caminhar debaixo da chuva. Você pode acabar ficando doente. Mas, se estiver disposto a correr esse 'risco', aceito, sim, ir contigo caminhar pelas ruas dessa cidade.

     Ambos riem. Era a segunda vez que se viam, mas aparentavam ser velhos conhecidos — velhos amigos. Alastor vai até a cozinha, seguido por Lúcifer. Os dois começam a conversar sobre seus dias. O loiro conta que sua relação com Lilith continua piorando e Alastor tenta convencer Lúcifer de que aquilo é apenas uma fase ruim, algo que existe em qualquer relacionamento, mas que não deve demorar muito para passar. 

     — Olha, pra quem não cria laços, você até que sabe bastante sobre relacionamentos. — O menor comenta, sentado sobre o balcão da cozinha brincando com uma maçã, jogando-a para cima e pegando de novo.

     — Sou um radialista, e de certo modo eu trabalho com público, algumas pessoas contam a história de vida inteira quando pedem alguma música em específico. É idiota, mas bem comum. — Alastor guarda a caneca de volta no armário de cima. — Então chega uma hora que você entende bem as coisas, consequentemente você aprende a dar conselhos. 

      — Entendi. — O loiro responde simplista, com a cabeça apoiada em uma das mãos.

     A chuva fica mais forte. É nesse momento que os dois decidem sair da casa. Lúcifer fica esperando na varanda enquanto Alastor tranca a porta da casa. A água gelada cai sobre os dois, logo encharcando seus corpos e roupas.

     Eles começam a andar pela rua, calma e silenciosamente. Sem nem perceber, vão em direção à praia em que se conheceram. Não havia ninguém pelas ruas ou na praia. A noite já havia chegado, e a chuva estava forte. Quem visse aqueles dois andando tão calmamente pensaria que tinham algum distúrbio. Ou que faziam algo errado. Não que fosse mentira, já que um comandava o submundo e o outro era um assassino por diversão e que comia a carne de suas vítimas por prazer.

     Ambos caminham pela areia ainda em silêncio. Não era por não terem assunto ou coisa do tipo, era apenas por estarem apreciando aquele ambiente. Os únicos sons que ouviam eram a chuva caindo no chão, a água do mar quando as ondas quebravam, e seus passos. Eles continuam andando pela areia da praia. 

     Lúcifer para de repente. Alastor para também. Seus olhares se cruzam e uma decisão silenciosa é tomada. A rota muda. Eles já não estavam caminhando paralelamente ao mar, mas em direção a ele. A água estava gelada. Mas seus corpos já estavam frios e molhados por conta da chuva, então a sensação não foi tão incômoda. Os dois caminham para o fundo, onde as ondas do mar não estavam tão fortes. Nenhum dos dois dava a pé naquele ponto do mar.