Pʀᴏ́ʟᴏɢᴏ

10 3 0
                                    

TOKYO
¹⁹¹²

Na tranquila biblioteca da casa de seu pai, Yuna Suzuki mergulhava nas páginas de um livro, enquanto o sol da primavera espiava pelas janelas. Lá fora, o imenso jardim murado ganhava vida: cerejeiras brotavam e pequenas flores cor de rosa desabrochavam. A pedido de sua mãe, os jardineiros haviam cultivado sementes de calêndulas vindas da Índia, e agora pétalas vibrantes variavam entre tons de amarelo e laranja, trazendo consigo mais um pedacinho da terra natal de sua mãe.

Tudo parecia perfeito para o retorno dos pais de Yuna. A residência que compartilhava com eles era uma majestosa mansão de arquitetura japonesa tradicional, um verdadeiro tesouro cultural.

Seu pai, Toshihiro, já havia levado uma vida dupla, mas desde o nascimento de Yuna, ele se dedicou inteiramente a família, se esforçando para lhes proporcionar uma vida digna e luxuosa. Toshihiro ascendeu ao cargo de administrador no banco mais prestigioso da cidade, acumulando riqueza. No entanto, um segredo permanecia oculto, conhecido apenas pela mãe de Yuna: Toshihiro fora um feiticeiro jujutsu em seu passado. Contudo, com o nascimento da doce Yuna, ele tomou uma decisão difícil, se afastando do mundo das maldições, apesar da resistência de seus superiores na antiga escola de Tokyo. Toshihiro estava disposto a fazer o impossível para proteger sua família das forças sombrias.

Toshihiro era um homem de resiliência, coragem e serenidade, desafiou os padrões rígidos de comportamento e conduta de sua época e ousou escapar de um casamento arranjado, se aventurou até a Índia, onde encontrou o amor de sua vida, a mãe de Yuna. Priya era uma estrangeira, nascida na Índia. Sua origem modesta não a impediu de possuir um coração generoso e um sorriso cativante. Priya irradiava calor e luz, encantando Toshihiro.

Yuna vivia em um mundo previsível e seguro, onde a rotina a envolvia como um casulo protetor. No entanto, por trás dessa aparente tranquilidade, se escondiam mistérios e terrores que seu pai habilmente mantinha afastados de seus olhos e sentidos.

Os laços entre os pais de Yuna eram profundos e quase nunca havia problemas que pudessem perturbar ou abalar a harmonia familiar. Os pequenos desentendimentos que surgiam eram prontamente resolvidos através do diálogo. Assim, Yuna cresceu em um mundo que parecia perfeito, uma infância repleta de carinho e cercada por pessoas gentis e amorosas. Até mesmo seus avós paternos, que inicialmente haviam jurado nunca perdoar Toshihiro por sua fuga e quebra de votos em um casamento arranjado, com o tempo foram amolecendo e se aproximando novamente, cheios de ternura e orgulho por sua neta.

Os últimos meses foram repletos de empolgação para Yuna, embora temperados por um desapontamento recente. Em dezembro, ela foi apresentada a sociedade em um baile espetacular oferecido por seus pais. Era o seu début, o grande momento da filha única dos Suzuki, e ambos garantiram que aquele baile de debutante fosse o mais elegante e extravagante que Tokyo veria em anos. 

Yuna era alta e delgada, mais alta que mãe, mas não tão alta quanto seu pai. Ela possuía longas e sedosas madeixas castanho chocolate e grandes olhos de íris tão negras quanto a noite, e o encanto de seu olhar, eram seus olhos amendoados delicadamente puxadinhos nas extremidades. Era bonita, com mãos e pés delicados e traços perfeitos. Passou a infância inteira ouvindo o pai dizer que ela se parecia com uma boneca de porcelana. Aos 18, possuía um corpo esguio, bem-proporcionado e atraente, e tinha modos requintados. Tudo nela emanava aristocracia, que era sua herança e meio no qual ela e todos os seus ancestrais paternos haviam nascido.

A família teve momentos encantadores nos dias subsequentes ao baile; mas depois de toda a agitação, de festas e noites acordadas com os pais, usando leves vestidos em noites de inverno, na primeira semana de janeiro, Yuna foi acometida por uma violenta gripe. Seus pais ficaram preocupados quando o quadro rapidamente evoluiu para bronquite, e, por pouco, não evoluiu para pneumonia. Felizmente, a juventude e a boa saúde da jovem a ajudaram a se recuperar. Porém, ela ainda permaneceu doente e teve febres noturnas por quase um mês.

O médico declarou que seria imprudência Yuna viajar fragilizada como estava. Seus pais haviam planejado a viagem fazia meses, para visitar amigos na França, e a jovem ainda estava convalescendo quando partiram no navio Mauretania, em meados de fevereiro. Yuna havia viajado com eles no mesmo navio várias vezes antes, e a mãe se ofereceu para ficar com ela em casa daquela vez, mas, na época, em que partiram Yuna já se sentia bastante bem para que a deixassem sozinha. Havia insistido com a mãe para que não fosse privada da viagem pela qual ansiava havia tanto tempo. Os pais lamentaram deixá-la, e Yuna ficou tremendamente desapontada, mas até ela admitia que apesar de estar muito melhor na época em que eles partiram, ainda não estava completamente recuperada para a longa viagem de dois meses ao exterior. Garantiu a mãe, Priya, que cuidaria da casa enquanto a família estivesse ausente. 

Todos confiavam plenamente nela, pois Yuna não era o tipo de moça com quem deveriam se preocupar, ou do tipo que tiraria proveito da ausência da família. Seus pais apenas lamentaram sua ausência, assim como ela. A jovem estava bem humorada quando se despediu deles no cais de Tokyo em fevereiro, mas voltou para casa se sentindo um pouco abatida. Se manteve ocupada lendo e tocando projetos na casa que agradariam sua mãe. Fez belos bordados e passou horas consertando as melhores roupas de cama e mesa da família. Não se sentia bem o bastante para passeios, mas sua melhor amiga, Hinata, a visitava com frequência. Hinata também fizera seu début naquele ano, e as duas moças eram amigas desde crianças.

Hinata já tinha um pretendente, e Yuna havia apostado com ela que Kayto a pediria em casamento em breve. E Yuna estava certa. Havia uma semana que eles tinham anunciado o noivado. Yuna mal podia esperar para contar a mãe que estaria em casa em breve. Sua família chegaria em 17 de abril.

Foram dois longos meses de ausência, e Yuna sentia saudades. Mas isso lhe dera a oportunidade de recuperar a saúde e ler muitíssimo. Depois de terminadas as tarefas da casa, ela passava todas as tardes e noites na biblioteca do pai, absorta nos livros.

Os seus preferidos eram os que tratavam de homens importantes, ciência, religiosidade e aqueles do sobrenatural. Nunca se interessou muito pelos romances que a mãe lia, menos ainda por aqueles emprestados por Hinata, os quais considerava um disparate. Ler tanto, lhe dava muito assunto para conversar com o pai, que admitia intimamente que a profundidade dos conhecimentos dela geralmente o deixava humilhado.

Yuna vivia uma existência quase perfeita, embora certos pesadelos... a atormentassem. Embora não fossem frequentes, quando surgiam, lhe roubavam o sono e a tranquilidade. No entanto, apesar desse pequeno incômodo, a vida de Yuna era perfeita.




Coração à Deriva - Jujutsu KaisenOnde histórias criam vida. Descubra agora