II. Sonho.

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ELLIE CARTER

Os dias na minha casa são um ciclo de responsabilidades e lembranças. Cada canto parece ecoar a presença de Chloe, uma ausência que pesa no ar, tornando difícil respirar às vezes. As manhãs, que antes eram preenchidas com risadas e conversas, agora são silenciosas. Eu me esforço para preencher esse vazio com amor, com a presença constante para minhas filhas. Mas a verdade é que estou lutando para não afundar.

Lily, minha pequena guerreira, parece ter encontrado uma forma de lidar com a dor, algo que me traz um misto de alívio e tristeza. Todas as manhãs, vejo aquele brilho nos olhos dela quando se senta em frente ao computador. É quase uma obsessão, mas uma obsessão saudável, se é que isso existe. Ela assiste aos vídeos da Rebeca Andrade, uma ginasta brasileira que conquistou o coração da minha filha.

Tudo começou em uma tarde em que Lily estava particularmente triste. Estava sendo uma daquelas crises de saudade que partem meu coração, mas que eu já não sei como consolar. Tanto que Celine também só sabia chorar, mesmo não sabendo o que estava acontecendo.

Foi então que, quase por instinto, mostrei-lhes um vídeo de ginástica artística. Não tinha muita certeza do que estava fazendo, mas precisava tentar algo, qualquer coisa que desviasse sua mente da dor.

A reação de Lily foi imediata e surpreendente. Ela ficou encantada com os movimentos de Rebeca, com a força e a graça que emanavam dela. Desde então, tornou-se um ritual diário. Eu a vejo ali, sentada, imitando os movimentos, tentando girar, saltar, levantar os braços como a Rebeca. É bonito e ao mesmo tempo doloroso ver minha filha tão pequena buscando desesperadamente alguém em quem se espelhar, alguém que possa preencher o vazio que Chloe deixou.

Hoje, assisti enquanto ela girava desajeitadamente na sala, um sorriso de pura determinação em seu rosto. Meu coração se encheu de orgulho e tristeza ao mesmo tempo. A vida a forçou a crescer tão rápido, mas ver aquela força emergindo dela, mesmo que inspirada por alguém a quilômetros de distância, me dá uma centelha de esperança.

- Mamãe, olha só! - a voz dela interrompe meus pensamentos, e a vejo girando novamente, quase caindo, mas se segurando no último segundo. - Eu vou ser igual à Rebeca quando crescer! Vou ser uma campeã!

Essas palavras me atingem com força. Chloe deveria estar aqui para ouvir isso, para ver isso. Mas sou eu que estou aqui, e eu preciso ser suficiente.

- Você já é uma campeã, meu amor - digo, abaixando-me até ficar na altura dela. Seus olhos verdes brilhantes me fitam, e eu sei que faria qualquer coisa para ver aquele brilho todos os dias. - E se é isso que você quer, vou estar aqui para te ajudar em cada passo do caminho.

O sorriso dela se alarga, iluminando a sala de uma forma que só uma criança pode fazer.

- Eu quero ver a Rebeca de verdade, mamãe! Quero ver ela ganhando a medalha nas Olimpíadas!

Essas palavras plantam uma ideia na minha mente, uma ideia que começa a crescer rapidamente. As Olimpíadas de 2024 serão em Paris, e eu sei que estarei lá, como parte da seleção americana de futebol. Levar Lily para ver Rebeca... Não só parece possível, parece essencial. Não é apenas uma questão de levá-la para ver sua ídola, mas de dar a ela algo pelo que esperar, algo que traga felicidade e que ajude a preencher o vazio que ainda sentimos.

- Então vamos fazer isso - digo, minha voz carregada de uma determinação que há muito eu não sentia. - Vamos para Paris, e você vai ver a Rebeca competir nas Olimpíadas.

O grito de alegria de Lily me faz rir, algo que parece tão raro agora. Ela pula nos meus braços, me abraçando com toda a força que tem, e por um momento, sinto que tudo vai ficar bem.

- Sério, mamãe? Você promete?

Segurando seu rosto entre minhas mãos, sorrio para ela, tentando transmitir toda a certeza que posso.

- Eu prometo, minha campeã. Nós vamos ver a Rebeca, e você vai ter o melhor momento da sua vida.

Mas no fundo, sei que essa promessa não é apenas para ela. É para mim também. Preciso ver minha filha feliz, preciso sentir que estamos caminhando para frente, que estamos criando novas memórias, mesmo que isso signifique enfrentar o mundo sem Chloe ao nosso lado. Paris será um novo começo, um lugar onde a dor começará a se misturar com a esperança do futuro.

E enquanto Lily corre pela sala, sua alegria enchendo o ambiente, sinto algo se aquecer dentro de mim. Agarro Celine em meus braços, a abraçando e sentindo seu cheirinho gostoso de bebê. Talvez, só talvez, possamos encontrar uma nova forma de felicidade. Uma felicidade diferente, mas ainda assim real. E por enquanto, isso é tudo o que preciso.

𝐇𝐄𝐀𝐑𝐓𝐒, ᴿᵉᵇᵉᶜᵃ ᴬⁿᵈʳᵃᵈᵉOnde histórias criam vida. Descubra agora