Salvação

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No meu bairro, haviam duas academias. A Academia do Ferro, um lugar escuro, com máquinas enferrujadas que atraem pelo preço, e a Academia do Hélio, um espaço amplo, com equipamentos de segunda mão, mas de boa qualidade, que conquistava pela excelência. Quando fiz quinze anos, comecei a frequentar a Academia do Ferro. Precisava sair mais de casa e me envolver em algum esporte. Embora jogasse futebol na escola com os amigos, ainda tinha muito tempo livre e poucas atividades para preenchê-lo. Combinar esporte com exercício físico parecia uma boa ideia. Mas, no fundo, o que eu realmente queria era ficar grande. Talvez assim eu superasse um pouco minha timidez e finalmente conseguisse falar com as meninas.

Foi então que percebi que as meninas bonitas estavam na Academia do Hélio. Dois meses depois, mudei de academia. Mas não adiantou; minha timidez e introspectividade permaneceram intactas. Eu colocava os fones de ouvido, aumentava o volume da música e seguia rigorosamente meu treino. Depois de um ano, conquistei um corpo atlético, mas ainda longe do que eu imaginava. Mesmo assim, continuei indo à academia. Me fazia bem. Costumava treinar logo no início da tarde, por volta das duas, quando havia menos gente e os aparelhos estavam quase sempre livres. Já havia desistido de tentar falar com as garotas. No máximo, trocava algumas palavras com a recepcionista, os professores que já me conheciam, ou algum idoso que frequentava o mesmo horário.

Coloquei meus fones de ouvido e fui até o banco para começar o supino reto. Talvez seja necessário explicar o exercício para que você entenda como tudo começou para mim. No supino reto, deitamos em um banco de academia e seguramos uma barra de cerca de um metro e meio, com pesos ajustados em cada lado. Com os braços estendidos, levantamos a barra e depois a baixamos, trabalhando a musculatura do peito. Posicionei os pesos que estava acostumado a usar, deitei no banco e completei doze repetições, finalizando a primeira de três séries. Depois, fui para a máquina em frente ao banco para descansar.

Enquanto fazia outro exercício, vi alguém desesperado no banco que eu acabara de usar. A pessoa tinha tentado levantar a barra com a mesma quantidade de pesos que eu, mas agora estava presa sob o peso, com a barra pressionando seu peito. Corri para tirar a barra de cima dela.

- Você está bem? - minha voz soou mais preocupada do que eu gostaria. Queria que tivesse saído grave e tranquila. Mas não posso alterar esses pequenos detalhes, porque quando eu contar os acontecimentos mais incríveis, meus leitores já terão perdido a credibilidade na minha história.

Ela não respondeu imediatamente. Estava no chão, com os cabelos dourados cobrindo o rosto, enquanto sua respiração voltava ao normal. Eu não podia acreditar. Era ela. Sim, era ela.

Jane estava ali, no chão, com os cabelos cobrindo o rosto. Quando finalmente ergueu o olhar, ainda se recuperando, ela me deu um sorriso desconcertado. Aquele sorriso, para mim, surgiu como um "muito obrigado".

- Você está bem? - insisti, desta vez com a voz mais firme. - Quer água?

- Não, não - ela respirou fundo - só preciso de coragem para me levantar. Que vergonha...

- Relaxa. Não tem ninguém olhando.

- Se ninguém tivesse olhando, eu teria morrido aqui! - Ela me encarava com seus olhos castanhos e profundos. Tentei desviar o olhar, mas ele acabou caindo em seus lábios. - Estou com vergonha de você.

- De mim? - Ela não precisava ter vergonha de mim. Não mesmo!

- É meu primeiro dia aqui e parece que eu nunca entrei numa academia! Já treino há um tempo - embora eu não precisasse dessa informação para notar -, mas nunca fiz o treino de peito com tanto peso. Vi que alguém tinha deixado a barra montada e quis me desafiar. Que imbecil! Isso é o dobro do que estou acostumada a levantar. Se não fosse você, eu ainda estaria lá embaixo.

- Relaxa. Acontece...

- Vou para casa. Esse era o último exercício mesmo. Já passei vergonha demais por hoje.

- Quer ajuda? Posso ir com você, também acabei meu treino.

- Não, não precisa, vai continuar seu... Espera, você é o filho da Marta? Do 320? Sim, é você! Não sei se lembra de mim. Saí daqui quando você ainda era um moleque. Sou a Jane, filha da Teresa. Voltei para morar com minha mãe. Sou sua vizinha da frente.

- Sim, claro... Eu lembro de você. - Como poderia esquecer?

- Merda! Isso só vai aumentar minha vergonha. Por favor, não conte para ninguém.

- Não, jamais faria isso. Vai ser nosso segredo. - Essas palavras saíram da minha boca num impulso, mas encaixaram perfeitamente na nossa história.

- Você já tinha terminado mesmo?

- Sim, já terminei! Vou te acompanhar.

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