EPÍLOGO

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VIAGENS DE CARRO são eventualmente, em algum ponto, muito entediantes. Ao menos para mim, já que a partir de umas duas horas na estrada eu começo a ficar tão estressada que meu joelho acaba ficando roxo pelas batidas contra o porta luvas que ocorrem devido a minha ansiedade inquietante. A paisagem ora oceano, ora floresta era linda, seja dia ou noite, ao menos a maior parte dela é; porém aprecia-la sentada no banco do passageiro de um fusca amarelo que funciona aos trancos e barrancos, e volta e meia precisa ser empurrado durante um dia e meio, torna essa experiência um pequeno passeio no inferno.

Dramático, eu sei, mas era como eu me sentia. Abafada, claustrofóbica e entediada na caixa de metal com rodas que nos levava através do estado. Nossa rota era simples, iniciávamos no litoral, em Bela Vista, e partíamos por um trajeto calmo até Serra das Cores, no interior. Caso você perguntasse a alguém sobre a rota essa pessoa lhe diria "é rápidin, doze horas e já ta lá", mas vendo o estado do nosso excepcional fusquinha, com a porta emperrada, os pneus carecas e o para-choque caindo, notaria que doze horas não seriam o suficiente. Para ser mais exata, de acordo com meus cálculos, a viagem levou exatamente trinta e seis horas e vinte e cinco minutos. Um pouco mais que as doze planejadas.

Durante o percurso minha mãe não se esforçava muito pra manter um ambiente divertido, sequer tentava conversar comigo enquanto dirigia. De acordo com ela, distrações no volante levariam a um acidente. Eu presumia que esse não fosse o real motivo do silencio dela, mas tendo em vista tudo que a gente já havia conversado, fingir que tava tudo bem era o melhor a se fazer. Então ela colocava uma fita pra tocar, uma coletânea dos maiores sucessos da MPB dos anos oitenta, e assim a gente seguia viagem, com os acordes de violão preenchendo o vazio silencioso.

Próximo ao final da viagem, com a mudança sutil da paisagem devido aos extensos campos esverdeados e as casinhas coloniais, uma pitada de ansiedade e talvez medo tomava conta de mim. Logo as batidas de tédio do meu joelho contra o porta luvas, deu lugar ao som dos meus pés contra o chão do carro.

Serra das Cores era do jeitinho que eu me lembrava: colorida, antiga e caracteristicamente interiorana. Ainda assim, ela não era uma cidade pequena - se você comparasse com as outras cidades a alguns quilômetros-, com um pouco mais de cinquenta mil habitantes ela era conhecida por ser um ótimo lugar pra se arranjar trabalho, e por ter a melhor criação de suínos na região, o que não me interessa muito, já eu não como porco. Não que eu fosse dizer isso em voz alta, mas, ao analisar as ruas da cidade, era possível notar a discrepância entre as pessoas de Bela Vista e as de Serra das Cores. Se, em uma era comum os cidadãos percorrerem seus caminhos de bicicleta, skate ou até patins, usando roupas curtas e coloridas com várias logomarcas, aqui parecia que todos eram iguais. Talvez esse não seja o termo correto; quero dizer que não pareciam tentar se destacar, a não ser os adolescentes, é claro. Em geral, pareciam todos... não sei, é só que era interior demais para mim. Eu vi um homem atravessar a rua a cavalo! Pra mim isso é bem interior.

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