CAPÍTULO 1 - BEBEL

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O relógio  marca 7:30 da manhã quando entro no aeroporto. Confirmo a passagem pela quinta vez, verificando se Isis acertou o horário da minha chegada ao Rio de Janeiro. Amanhã, 18 de fevereiro, é o dia mais importante do ano para nosso grupo de amigas. Se eu me atrasar de novo, Eva com certeza vai querer me matar.
Enquanto olho para a passagem pela sexta vez, uma parte de mim se pergunta se estou preparada para esse encontro. Será que ainda sou a mesma pessoa que minhas amigas conheciam? Ou será que mudei demais para ainda me encaixar no grupo?
Caminho até a fila de embarque, ainda concentrada na passagem. Não percebo o homem à minha frente e esbarro nele, deixando a passagem cair.
— Ups, perdón! — diz o homem em quem acabei de esbarrar, abaixando-se para pegar a passagem caída. — Aquí.
— Gracias — ele me encara com um sorriso tímido, seus grandes olhos esverdeados fixos em mim. Sinto uma súbita onda de ansiedade e ajeito o cabelo nervosamente, tentando esconder o desconforto.
— Río de Janeiro? También voy para allá — comenta ele, acompanhando meu ritmo na fila de embarque.
— Sí, voy a visitar a mis amigas — respondo, enquanto esperamos o casal à frente apresentar suas passagens. De repente, me pergunto se estou vestida de forma adequada. E se minhas amigas notarem que mudei? Será que ainda me reconhecem?
— Qué bien, yo voy a visitar a mi abuela. Ela... espera, ¿hablas portugués? — ele pergunta, com uma confusão divertida que me faz rir. — Não acredito que poderíamos estar conversando em português em vez de me esforçar com meu sofrido espanhol.
— Pelo menos posso garantir que seu espanhol é muito bom — respondo rindo, e ele retribui com uma risada baixa.
— Eu me chamo Dante — diz ele com um sorriso. — Posso ter a honra de saber seu nome e esquecer esse início, digamos, um tanto vergonhoso?
— Até te diria meu nome, mas depois desse começo ‘vergonhoso’ — faço aspas no ar — talvez você não mereça saber.

O casal à nossa frente finaliza o atendimento, e chega a minha vez.
— Hola, buenos días. ¿Puedo ver su pasaporte y su billete, por favor? — a atendente loira diz com um sorriso forçado. — ¿Es usted Isabella Bertapelli Caprici?
Fecho os olhos por um momento, lembrando da brincadeira de não revelar meu nome a Dante, feita há menos de um minuto.

— Sí, soy yo — respondo, virando-me para Dante, que me encara com um sorriso divertido.
— Todo está en orden. Su vuelo sale en 20 minutos, así que diríjase a la puerta de embarque. ¡Buen viaje!
— Gracias! — digo com um sorriso, saindo da fila e caminhando em direção à área de lanchonetes.
— Foi um prazer conhecer a senhorita Isabella Bertapelli Caprici — ouço Dante dizer, com um sorriso que quase sinto em minhas costas.
— O prazer foi todo meu — respondo, sorrindo e balançando a cabeça.
Pelo aeroporto, procuro uma livraria aberta. Tive a tremenda sorte de esquecer meu livro em cima da cabeceira, mesmo após conferir 65 vezes antes de sair de casa. Entro na primeira livraria que vejo, já com o nome de uma obra em mente.

— ¡Buenos días! ¿Tienes el libro Mujercitas de Louisa May Alcott? — pergunto ao atendente rechonchudo, um senhor idoso sentado atrás do caixa.
— ¡Sí! — ele responde, apontando para uma prateleira atrás de mim com um letreiro que diz "clásicos contemporáneos". Pego o livro e volto ao caixa. — Son 11,12€.
— Gracias, majo — digo, entregando o dinheiro. Enquanto ele registra a venda, sinto um pequeno alívio ao ter o livro em mãos, algo familiar para me ancorar nessa viagem cheia de incertezas.

Saio da loja correndo para o portão de embarque. Ao chegar, vejo que sou provavelmente a última a embarcar.

— ¡Madre mía, casi pierdes el vuelo! Por un pelo, eh. ¡Pero no te preocupes, llegaste justo a tiempo! Que tengas un buen viaje y disfrútalo al máximo. — diz o atendente, liberando meu embarque após conferir a passagem rapidamente.
— Gracias! — digo, sentindo o rosto corar enquanto caminho para o avião.

O voo está lotado. Procuro minha fileira, fácil de identificar pelo único assento à janela ainda vazio. De relance, vejo um homem sentado ao lado do meu lugar. Enquanto guardo os papéis na bolsa, abro a boca para pedir licença, mas sou interrompida.

— Olha só, nos encontramos novamente, senhorita Isabella Bertapelli.

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