Acordo com meu telefone apitando.
GRUPO: AS MELHORES DE SP, RJ, NY, ES
Bebel: Bom dia, garotas. Acabei de embarcar e tem um GATO do meu lado.
Eva: O quê? Conta tudo!
Bebel: Esbarrei nele mais cedo na fila de conferência de passaporte. E adivinha só...
Nic: Você beijou ele sem nem perguntar o nome, tipo em um filme pornô?
Bebel: Haha, engraçadinha.
Eva: Dá pra contar o que aconteceu?
Bebel: A gente meio que deu uma flertada mais cedo.
Isis: Você? Flertando? Às 7 da manhã? Você bebeu?
Bebel: Não, vocês não me deixam contar!
Nic (respondendo a Isis): Com certeza ela bebeu.
Eva: FALA LOGOOOO!
Bebel: Ele está literalmente sentado na poltrona do lado da minha, puxando assunto sem parar. O que eu faço, pelo amor de Deus?
Isis: Responde ele?
Nic: Rola uma foto?
Eva: Foto, foto, foto!
Bebel: (foto)
A foto está meio tremida, mas dá para ver um homem enorme, moreno, com uma barba curta, sorrindo enquanto conversa com uma aeromoça.
Nic: Meu Deus, Bebel, ele parece uma geladeira.
Eva: Se você ficar com esse cara, eu te pago um vinho.
Isis: O universo está te dando uma chance de viver uma comédia romântica. Se você desperdiçar, eu vou ser obrigada a te agredir.
Bebel: O avião vai decolar, amo vocês.
Nic: PEGA.
Eva: ELE.
Bloqueio o celular e viro para o outro lado, fechando os olhos. Instantaneamente, sinto uma vontade gigantesca de chorar. As meninas ainda não sabem, mas meu namorado e eu terminamos ontem à tarde. Tem sido uma dor imensa. Ele foi meu primeiro namorado de verdade e, nesse exato momento, espero que seja o último. Prefiro morrer a deixar outra pessoa me destruir assim de novo.
Lua, minha gata, sobe na cama e mia baixinho, como se me lembrasse de que, por mais difícil que seja, eu não posso ficar paralisada na posição fetal. Acaricio sua cabeça e me levanto, tentando reunir forças para alimentar a nós duas.
Meu celular toca, quebrando o silêncio. É uma chamada da Delegacia da Mulher.— Bom dia, Dra. Martinelli. Aqui é a Bianca. — Ela sempre me passa os casos mais delicados. — Acha que consegue dar uma passada aqui na delegacia? Temos um caso urgente.
— Bom dia, Bianca. Estou a caminho. Pode me adiantar algo sobre o caso até eu chegar? — respondo, enquanto luto contra o desejo de desligar o telefone e me esconder debaixo das cobertas. Hoje era minha folga. Tudo o que eu queria era ficar em casa e chorar.
— Claro. Mulher, 19 anos, agredida e estuprada pelo namorado. — As palavras de Bianca me atingem como um soco no estômago, e meus olhos se enchem de lágrimas instantaneamente. — Doutora?
— Certo, já estou a caminho — respondo, embora minha voz soe distante, como se eu estivesse me separando da dor.Depois de tomar meu café e trocar de roupa, entro no elevador em direção ao estacionamento. No caminho, encontro uma vizinha do andar de cima. Ela tenta esconder, mas é difícil não ouvir as brigas que ocorrem em sua casa. Ao notar que percebi a marca roxa em seu braço, ela força um sorriso na minha direção.
— Sabe que pode contar comigo para qualquer coisa, não é? — digo suavemente, tentando não invadir seu espaço. — Se precisar de ajuda, estou aqui.
— Oh, minha querida, não é nada disso que você está pensando. — Ela diz, com um sorriso triste que não alcança os olhos cheios de lágrimas. — Bati meu braço no móvel da sala ontem à tarde. Seu trabalho está mexendo com a sua cabeça, querida, tome cuidado.Assinto, tentando encontrar uma verdade em seus olhos. Queria tanto que ela me deixasse ajudar. Quando me mudei para este prédio, há alguns meses, ela foi uma das vizinhas mais calorosas, sempre oferecendo ajuda e trazendo pães de queijo feitos em casa. Mas, depois da primeira vez que chamei a polícia, ela parou de aparecer.
— Apartamento... — começo a dizer, mas ela me corta antes que eu termine.
— 818. — Ela completa, olhando fixamente para a porta, como se quisesse que o elevador se abrisse logo. — Eu sei, minha querida, estou bem, juro.As portas do elevador se abrem no térreo, e ela sai rapidamente, lançando-me um último sorriso caloroso, mas vazio. Quando as portas se fecham, solto um longo suspiro. Ela tem razão; meu trabalho mexe mesmo com a cabeça. Desde a faculdade, eu sabia que queria usar minhas experiências com abusos para ajudar outras mulheres. É um trabalho honrável, mas se torna dez vezes mais pesado quando você já foi vítima.
Entro no carro e ligo o motor, tentando me preparar para o que está por vir. A mulher que vou encontrar tem a mesma idade que eu tinha quando comecei a namorar Miguel, tão jovem e, provavelmente, muito mais ferida do que qualquer mulher de 40 anos que ainda acredita que todos os homens são bons.
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Fevereiro
RandomDesde a infância, Isis, Eva, Nicole e Bebel foram inseparáveis, criando um laço profundo que as manteve conectadas, mesmo quando a vida as levou por caminhos diferentes. No dia em que Bebel se mudou para Barcelona, elas prometeram se reunir todos os...