Ecos do Passado

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O som da porta se fechando atrás de Lily ecoava pelo corredor vazio da casa, um lembrete constante do que havia mudado em sua vida. Aos 19 anos, Lily observava o ambiente que um dia fora seu lar, agora marcado pela frieza de uma separação.

Quando Lily tinha apenas 6 anos, seus pais se separaram após uma traição que sua mãe, Sofia, cometeu com Rafael, e descobriu que estava grávida dele. A traição não apenas desfez o casamento, mas também mergulhou Lily em uma nova realidade que só trouxe mais sofrimento.

Sofia tentava manter as aparências, mas a verdade era que Rafael se tornara um constante tormento na vida de Lily. O homem usava seu poder e influência para controlar e intimidar, e a jovem Lily se via frequentemente à mercê de suas crueldades. O ambiente familiar, que deveria ser um refúgio, era agora um lugar de dor e desconforto.

-"Você acha que pode simplesmente ignorar as regras, Lily?"- Rafael disse com a voz áspera ecoando pela casa. -"Não faça isso de novo, ou eu vou ter que tomar medidas mais drásticas."-

-"Eu só quero ficar sozinha,"- Lily murmurou, tentando manter a calma enquanto sentia o peso das palavras de Rafael.

-"Não é uma opção,"- Rafael respondeu com frieza, saindo de vista. -"Agora vá fazer algo útil."-

Lily se sentia cada vez mais sufocada. A sensação de estar presa em um ciclo interminável de abuso e desrespeito a consumia. Cada dia parecia se arrastar com o peso das palavras e ações de Rafael, e o lar, que deveria ser um lugar seguro, havia se tornado um campo de batalha constante.

Apenas um pensamento a manteve à tona: a corrida. Era sua única forma de escapar, nem que fosse por um breve momento, da realidade dolorosa que a cercava. E apesar de Pietro, seu primo, ser uma presença reconfortante em sua vida, a verdade sobre a profundidade dos problemas familiares de Lily ainda permanecia oculta para ele.

Enquanto se preparava para a corrida daquela noite, Lily se agarrava a essa pequena fuga, sabendo que precisava de cada momento de alívio que pudesse encontrar. A corrida era mais do que um passatempo; era uma tábua de salvação em meio a um mar de sofrimento.

A noite estava fria e silenciosa quando Lily chegou ao local da corrida, um armazém desativado nos arredores da cidade. As luzes dos carros de corrida criavam uma atmosfera vibrante e carregada de tensão. A cada passo que dava, a adrenalina começava a substituir a tristeza e o medo que carregava diariamente.

Pietro já estava lá, ajustando os últimos detalhes em seu carro. Ele levantou a cabeça quando viu Lily se aproximar, e um sorriso caloroso se formou em seu rosto:

-"Você chegou na hora certa. Vamos ver se a noite vai ser tão boa quanto esperamos."-

-"Eu espero que sim,"- Lily respondeu, tentando esconder seu nervosismo. -"Estou precisando muito disso hoje."-

Pietro percebeu que algo estava diferente. -"Você parece um pouco mais cansada do que o normal. Está tudo bem?"-

-"É só um dia difícil,"- Lily mentiu, embora a verdade fosse bem mais complicada. -"Mas estou aqui para me divertir. Vamos fazer isso."-

A corrida começou, e as luzes dos carros se misturavam com o som dos motores rugindo, criando um espetáculo de velocidade e emoção. Lily sentiu o vento no rosto e a sensação de liberdade ao acelerar. O mundo parecia se afastar enquanto ela se concentrava apenas na pista e no carro à sua frente.

Quando a corrida terminou, Lily e Pietro se afastaram da multidão que comemorava e se dirigiram para um canto mais tranquilo. Pietro, com um olhar preocupado, perguntou:

-"Você tem certeza de que está tudo bem? Você parece um pouco distraída."-

-"Só estava pensando em algumas coisas,"- Lily respondeu, tentando mudar de assunto. -"Mas a corrida foi incrível, como sempre."-

Antes que Pietro pudesse continuar, um grupo de homens se aproximou, e um deles, com uma presença imponente, cumprimentou Pietro com um aperto de mão firme:

-"Pietro, boa corrida hoje. A movimentação aqui tem estado intensa. Não sabemos quanto tempo o estoque vai durar."-

Lily observou a interação com curiosidade e um pouco de preocupação. Pietro parecia à vontade com esses homens, mas algo na maneira como eles conversavam parecia fora do comum.

Depois que os homens se foram, Lily perguntou:

-"Quem eram aqueles caras?"-

Pietro hesitou por um momento antes de responder. -"Só alguns conhecidos do meio. Não se preocupe com isso. Vamos voltar para casa, você parece cansada."-

Lily sabia que Pietro estava escondendo algo, mas não insistiu. A noite estava terminando, e a sensação de alívio que sentia ao estar longe da realidade de casa estava diminuindo.

Ao voltar para casa, Lily encontrou a casa em um silêncio sombrio. A ausência de Rafael não a tranquilizava; ao contrário, ela se sentia ainda mais ansiosa. Sabia que a qualquer momento, a realidade que tentava evitar voltaria a se impor.

Lily se deitou em sua cama, fechando os olhos e tentando se perder na lembrança da corrida. Mas o pensamento de que a verdade sobre sua família estava se escondendo sob a superfície de sua vida perfeita e seu primo Pietro estava mais envolvido do que ela imaginava, não a deixava em paz. A noite prometia ser longa, e Lily sabia que o futuro estava prestes a se desdobrar de maneiras que ela não podia prever.

O sol da manhã iluminava a janela do quarto, uma instituição tradicional localizada no centro da cidade. Lily estava descendo as escadas da casa, já com a mochila nas costas preparada para ir a faculdade. Cada passo parecia pesar mais do que o anterior, especialmente sabendo que Rafael poderia aparecer a qualquer momento.

Quando estava no meio das escadas, ouviu o som de passos pesados vindo do andar de baixo. Rafael apareceu no final da escada, sua presença imponente interrompendo o ritmo de Lily.

-"Ah, olha quem está saindo cedo,"- Rafael comentou, seu tom de voz carregado de uma irritação calculada.

-"Estou indo para a escola,"- Lily respondeu, tentando manter a calma e a cortesia. -"Como sempre."-

Rafael cruzou os braços e se apoiou na parede. -"Você está sempre com pressa para sair, não está? Por que não pode simplesmente ficar em casa e ajudar sua mãe com algumas tarefas?"-

-"Eu tenho meus compromissos,"- Lily disse, ajustando a mochila em seu ombro. -"Além disso, é importante para mim ir à escola."-

Rafael franziu a testa, um sorriso cruel se formando em seus lábios. -"Importante? Para você, pode ser. Mas não se esqueça que sua mãe e eu fizemos muitos sacrifícios para você ter esse privilégio. Um pouco de gratidão não faria mal."-

Lily tentou conter o impulso de revirar os olhos. -"Eu sei o que vocês fizeram, mas isso não muda o fato de que eu preciso ir para a escola. Não tenho muito controle sobre isso."-

-"Certo,"- Rafael disse, com um tom que misturava desdém e impaciência. -"Só não espere que eu sempre esteja disposto a ser compreensivo. Há regras para se seguir e expectativas a serem atendidas."-

-"Eu entendi,"- Lily respondeu, começando a descer as últimas escadas. -"Vou para a escola agora."-

Rafael a observou enquanto ela se afastava, um olhar frio e calculista em seu rosto.

-"Não se esqueça de que, se precisar de algo, ou se algum problema surgir, você sabe onde me encontrar."-

Lily apenas acenou com a cabeça e se dirigiu para a porta de entrada, respirando fundo enquanto saía para a luz do dia. O encontro com Rafael a lembrava do peso que carregava diariamente, mas ao menos, por agora, ela estava a caminho da faculdade, onde encontraria um pouco de normalidade e um escape da realidade que enfrentava em casa.

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