Ciclicidade

46 10 307
                                    

Ciclicidade

Pricila Elspeth

Cassandra vestia um quimono branco com uma faixa vermelha amarrada ao redor da cintura. Seus movimentos lentos e suaves eram acompanhados pelos olhares atentos dos mais de trinta alunos ansiosos para repeti-los.

Seus braços enrugados giraram ao redor de seu torso desenhando um círculo no ar, ela inclinou-se fazendo uma reverência para os alunos e sentiu o mundo girar, suas pernas amoleceram, sua visão ficou turva e ela despencou no chão.

Os alunos correram em seu socorro, enquanto alguns tentavam reanimá-la, outros ligavam para sua filha Cibele e um grupo tentava contactar o pronto-socorro local.

Quando Cibele chegou, encontrou a mãe sobre uma maca metálica com acessos de soro presos aos braços e uma máscara de oxigênio no rosto. Aproximou-se da ambulância com os olhos em brasa e o coração martelando seu peito sem descanso.

"Ela vai ficar bem?" perguntou olhando para o rosto frágil repleto de manchinhas marrons. O socorrista dobrou as pernas de apoio da maca e a travou no interior da ambulância, virou-se para ela com um semblante introspectivo e demorou para falar.

"Os sinais vitais estão fracos, mas parecem estar estáveis. Um médico poderá lhe dar mais informações. Vai acompanhá-la?"

Cibele olhou para o celular e consultou as horas, era quase meio-dia e Morgana sairia da escola em breve. Mordeu os lábios e sentiu os olhos transbordarem.

"Vou buscar minha filha na escola. Para onde a levarão?"

"Hospital central."

Cibele meneou com a cabeça para informar que havia entendido. Entrou no carro e dirigiu apressadamente pela avenida principal em direção à escola infantil. Assim que estacionou na vaga dedicada a visitantes, rebentou em um intenso pranto. Seus soluços lhe doíam o peito e cortavam sua alma.

Ouviu batidinhas no vidro e olhou apressada com o rosto marcado pelas lágrimas que escorreram e desenharam com a maquiagem fios negros em sua pele. Sorriu sem graça ao ver a professora de sua filha com um monte de livros pressionados contra o peito segurados pelo braço em arco.

"O que aconteceu?"

Cibele enxugou as lágrimas e abaixou o vidro, após respirar profundamente, disse: "Minha mãe passou mal. Não sei como contar isso para a Mô."

"Quer que eu fique com ela pra você?"

"Não quero incomodar."

"Não é incomodo Cibele, é melhor que vá sozinha. Pode deixar que cuido dela."

"Obrigada! Muito obrigada!"

"Deixa disso. Só me mantenha informada."

Cibele saiu de mansinho até chegar à rua, acelerou em direção ao hospital. Enquanto avançava entre prédios e cruzava avenidas famosas, evocava mentalmente o poder de Hecate, e pedia que auxiliasse a anciã superar esse mal. Suas orações tendenciosas esqueciam as leis universais, e por mais que soubesse que todos passam por estágios irreversíveis, não queria admitir que sua mãe passasse por eles. Quando se deu conta de que estava pensando em algo completamente egoísta e desejando dobrar à sua vontade forças muito maiores que sua compreensão, interrompeu as orações.

Após estacionar do outro lado da rua, passou pela porta de vidro opaco com rapidez inabitual. Parou no balcão central e perguntou onde estava sua mãe, a moça que estava do outro lado do balcão consultou os registros e lhe passou o número do quarto e o andar, imediatamente Cibele entrou no elevador e apertou o sete.

Memórias de uma BruxaOnde histórias criam vida. Descubra agora