Dentro de uma das casas da vila Oiseau, havia uma jovem fada de cabelos azuis, que tinha acabado de dar à luz a uma criança, essa que chorava copiosamente. Uma das outras mulheres que estavam junto dela, segurava a criança no colo.
— É um menino Tori... Você quer vê-lo? Não precisa se forçar a nada... - a fada acompanhante proferiu, receosa, enquanto as fadas se entreolharam sussurrando, afinal, depois de tudo pelo que Tori passou antes e durante a gestação, não sabiam qual seria a relação dela com seu bebê.
— Eu quero vê-lo. - Disse, firme, respirando fundo. - Não importa... a aparência que ele tem.
Tori não conseguia negar que tinha medo de que ele se parecesse com aquele criminoso, tinha muito medo de não conseguir olhar para ele sem se lembrar de todas as coisas ruins, mas apesar disso, no exato momento em que a criança lhe foi entregue, sentiu uma emoção que jamais havia sentido. Um misto de medo, ternura e ansiedade.
O pequeno bebê parou de chorar, e a encarou, como se soubesse que nos braços de sua mãe, estava seguro. Seus olhos acinzentados e as bochechas gordinhas avermelhadas eram a coisa mais linda que a fada já havia visto na vida. No mesmo momento, sorriu, de orelha a orelha, sentindo as lágrimas escorrerem dos olhos incontrolavelmente. Os cabelos do pequeno eram azuis, exatamente como os seus.
— Ele é perfeito... - abaixou a cabeça sobre o bebêde forma gentil e suave, como se estivesse o abraçando. - Ele é igualzinho a mim... não é como "ele", não é como ele...
As outras fadas sorriram, felizes por Tori.
— Como vai ser o nome do seu homenzinho?
— Ginniere. - Levantou o rosto, orgulhosa.[...]
Depois do nascimento de seu filho, um mestiço de fada e akuma, Tori ainda levou algum tempo para se adaptar à nova vida. As críticas e comentários maldosos eram como facas em seu peito, dilacerado muitas vezes a cada palavra mal intencionada daqueles que achavam que seu filho era uma aberração que cresceria e se tornaria um monstro sem coração.
Quando Gin completou um ano de vida, se não fossem suas orelhas irregulares e a falta das asas, era praticamente impossível diferenciá-lo de qualquer criança fada comum.
Entretanto, em certo ponto, quando apenas o amor pelo seu filho não era o suficiente para se manter estável, decidiu que mudariam para algum lugar novo, em busca de paz. Na noite em que pegariam a carruagem para viajar, deixou o pequeno Ginierre no berço, dormindo, enquanto arrumava as poucas mudas de roupa que conseguiria levar. Quando a lua ficou no ponto exato que marcara para embarcar na carruagem, pegou as malas e foi ao quarto do bebê. Ao chegar próxima do berço, sentiu um calafrio na espinha. Gin não estava ali.
Soltou o que tinha nas mãos e correu desesperada pela casa à procura dele. Não era possível que ele tivesse simplesmente saído sozinho, com certeza alguém o tinha pego. Sua respiração logo se descontrolou devido ao desespero, e lágrimas rolavam de seus olhos.
Saiu pelas ruas, perguntando a todas as pessoas ali se alguém tinha visto seu bebê. Jamais se perdoaria se algo acontecesse a ele, por uma distração sua.
—Não, eu não vi o seu demoniozinho. - disse uma mulher, aos risos, depois de questioná-la. Tori não aguentaria mais esse tipo de coisa, principalmente agora, numa situação dessas. Desferiu um tapa no rosto dela com todas as suas forças, e a mulher perdeu o equilíbrio.
— O único demônio aqui é você.
E saiu, perguntando para todos a quem pudesse.
Depois de um tempo, quando o desespero começou a aumentar ainda mais, e achou que não tinha mais esperanças, um homem surgiu, lhe dizendo que viu algumas fadas levando uma criança para o templo da deusa das flores.
Correu para lá o mais rápido que pode, e abriu as grandes portas do templo, chamando a atenção das mulheres velhas que estavam lá dentro. Gin chorava, e havia sangue escorrendo de seu pescoço.
— Saiam de perto dele!
Adentrou no ambiente, empurrando as fadas anciãs que ali estavam, não parando até conseguir pegar o seu filho em seus braços.
— Gin... meu amor... - colocou a mão sobre o machucado, estancando o sangue. Tinha chegado no momento certo, se tivesse chegado um pouquinho depois, o seu filho teria a jugular cortada.
— Você não entende Tori! Ele é uma aberração da natureza! A existência dele é um erro! Os deuses vão se irar contra nós, e sofreremos as consequências desse erro! - A anciã com a faca disse, enquanto as outras se reuniam ao redor. - Você é jovem ainda, garota, tem tempo de achar um rapaz bom e ter filhos normais!
— Eu não estou nem aí. Apenas nos deixem em paz... nos deixem em paz!
Agarrada ao menino ensanguentado, saiu dali, sem se importar com os gritos atrás de si, que a imploravam para que terminassem o que tinham começado, mas isso só a incentivou a correr o mais rápido que pode, para chegar até algum médico, que pudesse lhe ajudar. Seu filho jamais seria uma aberração aos seus olhos, ele era perfeito, e apesar de qualquer coisa, era seu filho.
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O Éden
FantasyA grande nação de Calendria já havia se deparado com inumeras guerras, pragas, aflições, governantes soberbos e incontáveis conflitos entre as espécies, que buscavam a dominação e a soberania. Mas apesar disso, ainda haviam aqueles que insistitam em...