Capítulo 1: O Legado Sangrento

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A Família Addams

Detroit. Uma cidade de contrastes, onde o ferro e o concreto se misturam com o sangue e os segredos. Entre arranha-céus decadentes e ruas escuras, uma família reina suprema. Os Addams.

Dentro de uma das mansões mais imponentes e misteriosas da cidade, na cobertura de um arranha-céu intocável pelas autoridades, o vento gelado de outubro cortava as janelas espessas, mas lá dentro tudo era silêncio. Um silêncio tenso.

Wandinha Addams, com seus olhos escuros e expressão impassível, observava a cidade abaixo. Ela sabia que seu destino estava prestes a mudar. O legado da família estava impregnado em cada fibra do seu ser, mas ainda havia um passo a ser dado, uma linha a ser cruzada. Até agora, ela era uma observadora, uma aprendiz na arte da morte e do poder, mas isso estava prestes a acabar.

"É hora, Wandinha." A voz de Morticia cortou o silêncio, suave, mas cheia de autoridade. Ela entrou na sala, envolta em seu vestido negro, a sombra da noite personificada. Ao seu lado, Gomes, com seu charuto aceso, sorriu de forma quase paternal, mas seus olhos mostravam o olhar de um predador veterano.

"Chegou o momento de você se provar. De se juntar à verdadeira linhagem dos Addams", continuou Morticia, seus olhos brilhando à luz das velas. "Temos uma missão para você."

Wandinha, imperturbável, apenas assentiu. "Estou pronta."

XXX

Morticia entregou-lhe um envelope de papel grosso, selado com cera vermelha no formato de uma caveira - o símbolo da família Addams. Ao quebrar o selo, Wandinha encontrou uma foto desbotada de um homem de meia-idade, com olhar severo e um terno alinhado.

"Ele se chama Victor Beaumont," começou Gomes, soprando uma nuvem de fumaça para o alto, "um dos nossos fornecedores mais antigos. Alguém em quem confiamos por décadas, mas... ultimamente, ele tem se mostrado um problema."

Morticia se aproximou, pousando uma mão delicada no ombro da filha. "Infelizmente, ele tem traído a nossa confiança. Informações confidenciais estão vazando, e todas as pistas levam a ele. Victor não é mais uma opção. Ele deve ser... removido."

Wandinha observou a foto em suas mãos, seus dedos finos e pálidos deslizando pela imagem. Ela não perguntou por quê, nem como. Essas coisas nunca a interessaram. Ela sabia que, no mundo em que viviam, as traições não ficavam impunes, e a justiça dos Addams era sempre implacável.

"Eu assumo que será a minha tarefa lidar com ele," afirmou Wandinha, sem traço de hesitação em sua voz gélida.

Gomes sorriu, orgulhoso. "Correto. Beaumont está escondido em um clube particular no centro da cidade. Ele acredita que a distância entre ele e a família Addams lhe dá segurança. Mal sabe ele o quão perto está do seu fim."

Morticia inclinou-se para a filha, os olhos brilhando com um misto de carinho e severidade. "Esta é a sua primeira missão solo, minha querida. Uma prova de que está pronta para o papel que a família espera que você assuma. Lembre-se: os Addams não deixam rastros... apenas medo."

Wandinha, com a frieza habitual, guardou a foto no bolso de sua jaqueta preta e encarou os pais. "Considere o problema resolvido."

Sem mais palavras, ela se virou e saiu da sala. O som de seus passos ecoava pelos corredores escuros da mansão enquanto se preparava mentalmente para sua primeira missão. Não era o ato de matar que pesava em sua mente, mas o fato de que, após hoje, ela nunca mais seria apenas uma observadora. Estaria oficialmente imersa no submundo, com sangue em suas mãos o verdadeiro sangue Addams.

XXX

O local onde Victor Beaumont se escondia era um clube exclusivo no subúrbio de Detroit, longe dos olhos das autoridades e protegido por camadas de segurança. Era o tipo de lugar onde os ricos jogavam cartas enquanto faziam negócios ilícitos no subsolo.

Wandinha entrou no clube disfarçada, suas roupas escuras a fazendo parecer uma sombra. Cada movimento era calculado, cada passo preciso. Ela havia memorizado as plantas do lugar, estudado cada saída e entrada, e estava pronta para finalizar sua tarefa.

Ao encontrar Beaumont sentado em uma mesa de pôquer, cercado por seguranças distraídos, ela soube que o momento havia chegado. Não haveria erros, apenas precisão. Quando seus olhos se encontraram, ele não soube que aqueles seriam seus últimos momentos.

XXX

A Vida de Enid Sinclair

Enquanto Wandinha mergulhava no mundo sombrio dos Addams, a vida de Enid Sinclair era um contraste gritante. A casa dos Sinclair, localizada em um bairro modesto e tranquilo nos arredores de Detroit, era um refúgio de simplicidade. Não havia o luxo sombrio e decadente dos Addams, mas o peso de responsabilidades invisíveis se fazia sentir em cada cômodo.

Enid, com seus cabelos loiros e sorriso sempre presente, parecia ser a personificação da doçura. Quem a visse na rua, sorrindo para os vizinhos ou ajudando a irmã mais nova com os deveres de casa, jamais imaginaria o fardo que carregava.

Ela estava sentada à mesa da cozinha, estudando para mais um exame da faculdade de enfermagem. As palavras sobre primeiros socorros e diagnósticos flutuavam em sua mente, mas não conseguiam afastar os pensamentos sobre a mãe.

"Enid, você está prestes a terminar o curso, precisa manter o foco," dizia a mãe frequentemente, como se a filha estivesse constantemente à beira do fracasso. Susan Sinclair era uma mulher prática, de poucas palavras. Trabalhando incansavelmente como caixa de supermercado, ela sustentava a casa com os poucos recursos que tinha, enquanto o marido, que há anos havia adoecido gravemente, passava os dias preso à cama, impotente.

O barulho da porta da frente se abrindo trouxe Enid de volta ao presente. Susan entrou, cansada como sempre, com olheiras profundas e a expressão de alguém que já havia passado por batalhas demais para contar. "Você está estudando, não está? Esse curso é a nossa saída, Enid."

Enid assentiu, forçando um sorriso. "Sim, mãe. Estou quase terminando o capítulo."

Susan suspirou e se sentou à mesa, passando a mão no rosto. "Você sabe que não podemos contar com o seu pai. E sua irmã mais nova... bem, ela ainda tem muito o que aprender. E a mais velha... bom, prefiro não falar dela. É em você que estamos apostando, Enid."

Essas palavras caíam como uma pedra no estômago de Enid toda vez que eram ditas. Ela queria ajudar, claro, mas também queria respirar, ser livre por um instante. Às vezes, sentia-se sufocada pelas expectativas de sua mãe, que, embora amasse, parecia incapaz de enxergar o quanto essas cobranças a desgastavam.

"Eu sei, mãe. Só mais um ano e vou poder trabalhar como enfermeira. Aí tudo vai melhorar," respondeu Enid, embora não soubesse se acreditava nisso de verdade.

Do outro lado do corredor, o som de uma tosse forte ecoou pela casa. Era seu pai. Ele estava doente há tanto tempo que Enid nem lembrava de como ele era antes da doença. A figura frágil e abatida deitada na cama era um contraste doloroso com o homem que, segundo sua mãe, fora outrora forte e enérgico.

Enid levantou-se da mesa e foi até o quarto dos pais. Seu pai estava deitado, o olhar cansado voltado para o teto. Quando ele a viu entrar, forçou um sorriso fraco.

"Enid... você está estudando? Como está indo o curso?" A voz dele era baixa, como se falar exigisse um esforço enorme.

"Está indo bem, pai. Não se preocupe comigo," respondeu Enid, tentando soar animada.

Ela se sentou ao lado dele, ajustando o travesseiro. A relação entre eles era silenciosa, feita de pequenos gestos e olhares, mas cheia de um carinho profundo que as palavras não conseguiam expressar. Apesar de tudo, ele sempre tentava ser um apoio, mesmo incapacitado.

De volta à cozinha, Susan observava pela porta aberta, os olhos cheios de uma preocupação que ela raramente demonstrava em voz alta. Era difícil para ela, carregar o peso da família praticamente sozinha. Ver Enid seguir em frente, lutando por algo maior, era sua esperança.

"Enid," a voz da mãe chamou, mais suave desta vez, "só... não esqueça o quanto dependemos de você."

Enid assentiu, segurando as lágrimas. "Eu não esqueço, mãe. Nunca esqueço."

WenClair em Linhas De Sangue e o Destino Onde histórias criam vida. Descubra agora