𝟔- 𝐯𝐢𝐭𝐨́𝐫𝐢𝐚 ᵖᵗ¹

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O dia passou rápido, e quando João se deu conta, já estava dentro do ônibus a caminho do estádio do Morumbi. O ambiente no veículo era animado, com todos conversando alegremente enquanto um pagode tocava ao fundo, cortesia de Luciano, sempre o mais animado do grupo. A leveza no ar era palpável, resultado direto da boa fase que o São Paulo vivia. Os jogadores, confiantes e relaxados, estavam em perfeita sintonia. Não havia aquele nervosismo costumeiro antes de grandes jogos, apenas uma sensação de que tudo estava no lugar certo. O ônibus seguia pelas ruas da cidade, e João sentia a expectativa crescendo conforme o Morumbi se aproximava, o coração batendo um pouco mais rápido a cada quilômetro percorrido.

O caminho até o estádio duraria mais ou menos uma hora, mas por ser dia de jogo, muitos torcedores seguiam o ônibus, tornando a viagem duas vezes mais demorada. Aquele tempo seria repleto de conversas amigáveis e cantoria, mas Pedro nunca participava dessa euforia. Ele sempre foi o tipo de atleta que evitava a farra, ficando preso em seu próprio mundo, alheio a tudo e todos ao redor. Pedro Augusto sempre foi o garoto tímido da classe, o que não tinha muitos amigos e raramente se ouvia sua voz. Mesmo hoje, sendo menos introvertido, ainda tinha seus momentos de isolamento para recarregar sua "bateria social". João Vitor, por outro lado, era diferente. Extrovertido e cheio de energia, ele não era o mais popular, mas tinha amigos o suficiente ao seu redor. Mesmo assim, ainda era o garoto diferente, que, enquanto os outros sonhavam em ser jogadores de futebol, ele sonhava com os palcos, com a ideia de tornar o mundo mais bonito por meio de sua voz. Se havia um show de talentos na cidade, ele estava lá, batendo ponto. João amava aquela "bagunça organizada" e, por quase metade do percurso, participou da festa no ônibus.

Tofani sentia inveja das pessoas que conseguiam curtir, dançar e cantar sem se importar com o que os outros pensavam. Romania percebeu que Pedro estava no fundo do ônibus, sozinho, então se afastou da JBL e se aproximou do jogador, que estava imerso em seu próprio mundo, ignorando o movimento ao redor.

— Ei — João chama a atenção de Pedro, encostando seu ombro no dele de maneira leve, tentando captar seu olhar. Pedro tira os fones e olha para João. — Não vai curtir com todo mundo, príncipe?

— Não tô muito afim, loirinho — responde Pedro, com um tom de voz calmo. — Mas você está se divertindo, aproveita por mim.

— Por que não, meu anjo? Tá tudo bem?

— Anjo? — Pedro pergunta quase sem pensar, não conseguindo conter o sorriso que começa a se formar em seus lábios, enquanto sente as borboletas fazendo festa em sua barriga.

— Bom... você é o meu anjinho, mas se não gostar, eu posso parar de te chamar assim.

— Não, gatinho! Não para! Eu gostei... muito. — Pedro admite, e agora é João quem sorri.

— Você ainda não me respondeu, anjo, tá tudo bem?

— Tá sim, Jojo. Só não sou a pessoa mais sociável do planeta, então aproveito esse momento pra recarregar a minha bateria social. — Pedro responde tranquilamente, mas uma onda de culpa atinge João.

— E eu tô te atrapalhando, né? Desculpa, Peu, vou te deixar em paz. — João se levanta, mas é puxado com certa firmeza de volta ao assento por Pedro.

— Não vai embora. Eu recarrego mais rápido com você ao meu lado, anjo.

— Ei! Ladrão de apelidos! — João exclama, inflando as bochechas e fazendo um bico nos lábios numa tentativa de parecer sério, mas logo Pedro, com um sorriso travesso, começa a fazer cócegas nele. Suas mãos ágeis e leves percorrem o corpo de João, tocando suas costelas e barriga sem segundas intenções, apenas brincadeira pura. Pedro sabia exatamente onde tocar para provocar as risadas mais sinceras de João. O corpo de João, inicialmente resistente, logo cede, e um sorriso escapa, transformando-se em uma gargalhada alta e contagiante. Ele tenta se esquivar, se contorcendo para escapar, mas não consegue segurar o riso que explode de forma espontânea. Sua risada ecoa pelo ônibus, uma trilha sonora alegre no meio de toda a agitação, mas, apesar do barulho, muitos não percebem o momento de descontração.

Exceto Calleri. O argentino, sempre atento ao que acontecia ao redor, captou algo que poucos enxergaram naquele instante. Ele sempre soube que a relação entre João e Pedro era especial dentro do time. De todos os jogadores, Pedro era, sem dúvida, o melhor amigo de João. Desde que se conheceram, eles sempre dividiram quartos nas concentrações, compartilharam histórias em viagens e formaram um laço que ia além das partidas de futebol. Mas o que Calleri viu naquele momento foi algo a mais. Quando João soltou aquela gargalhada, havia algo diferente em seus olhos, um brilho, um sorriso tão genuíno, tão puro, que ele nunca havia visto antes. E isso o emocionou.

Era raro ver Pedro, geralmente tão reservado e introspectivo, deixar transparecer tamanha felicidade. João parecia ter o dom de arrancar esses momentos de vulnerabilidade sincera de Pedro, momentos em que ele podia ser apenas ele mesmo, sem máscaras, sem pressão. Para Calleri, aquele momento foi um vislumbre de algo precioso. Ele sentiu uma pontada de emoção ao perceber o quanto João significava para Pedro, mais do que qualquer outra pessoa no time. Calleri, acostumado a ver Pedro sempre focado e concentrado, sorriu involuntariamente ao testemunhar a simplicidade daquele instante. Era como se, por um breve segundo, qualquer preocupação desaparecesse, e o que restava era o riso, a amizade e a alegria genuína. O argentino, ainda sorrindo, refletiu sobre a beleza daquela cena, que para muitos poderia parecer banal, mas para ele, era muito mais.

— Chega! — João exclama, ainda rindo sem parar. — Não tô mais bravo com você! O que você tava ouvindo, príncipe?

— Duki, já ouviu falar?

Entre Linhas| Au PejãoOnde histórias criam vida. Descubra agora