"Ah, Clara... Ela, como muitos, pensa que o amor é inquebrável, mas às vezes o amor cega. Quando perdemos alguém, a dor nos engole, e nos agarramos ao impossível, ao que deveria ser deixado para trás. Clara... uma mulher que amava tanto sua filha que se esqueceu de si mesma. E você, leitor, o que faria por amor? Não seja tão rápido em julgar. A dor pode fazer qualquer um de nós... ignorar o perigo."
Clara não conseguia lembrar a última vez que dormira uma noite completa. O silêncio da casa, outrora seu refúgio, havia se transformado em um constante lembrete da ausência. A ausência de Helena, sua filha.
Helena havia sido sua vida, sua razão para existir. Perder uma criança é algo que ninguém deveria experimentar. Não é natural. Não é como deveria ser. Mas a vida, claro, raramente é justa. Helena, com seus cabelos dourados e olhos brilhantes, fora tirada de Clara de forma abrupta e cruel em um acidente de carro que ainda assombrava seus pesadelos. E desde aquele dia, tudo em sua vida perdeu o sentido.
Clara costumava ser uma mulher forte, alguém que enfrentava desafios com um sorriso. Mas agora, ela era apenas um fantasma, vagando pela casa como uma sombra do que fora. Os brinquedos de Helena ainda estavam espalhados pelo quarto, intocados, como se a menina fosse voltar a qualquer momento para brincar com eles. Clara não tinha forças para guardar nada. Cada objeto, cada boneca, cada vestido pendurado no armário, era uma memória viva que a destruía um pouco mais, mas também era a única coisa que a mantinha conectada à sua filha.
E então, numa noite, Clara ouviu.
"Ah, aqui está. O momento em que tudo muda. Você consegue imaginar a dor de Clara, não consegue? Você já sentiu algo assim antes? Não importa se não foi a mesma perda... o desespero, a solidão, eles nos tornam cegos para a realidade. E agora Clara, em sua cegueira, vai ouvir algo que nenhum de nós deveria ouvir."
Era um som baixo, distante, quase como um sussurro. Inicialmente, ela pensou que estivesse sonhando, que seu cérebro lhe pregava peças na tentativa de preencher o vazio. Mas o som persistia. Era uma voz, uma voz familiar.
— Mamãe... — disse a voz, suave como uma brisa noturna.
Clara congelou, o coração acelerado. Era impossível. Não podia ser real. E, no entanto, lá estava. A voz de Helena, sua doce Helena, chamando por ela. Mas Helena estava morta. Ela sabia disso. Havia se agarrado a essa realidade dolorosa por meses, vivendo cada dia com a dor em seu peito como um peso insuportável.
Mas e se... e se de alguma forma sua filha estivesse tentando se comunicar?
"Ah, Clara. Essa é a armadilha da dor. Ela te faz acreditar no impossível. Você, leitor, provavelmente pensa que não cairia nessa, certo? Acha que teria mais clareza, que saberia diferenciar a realidade da ilusão?. Ah, como você se engana... A dor tem um jeito de nos fazer ver o que queremos ver, não o que é real."
Clara levantou-se da cama, os pés descalços tocando o chão frio de madeira. Ela seguiu a voz pela casa, sentindo um misto de esperança e medo. Cada passo era como se ela estivesse sendo guiada por uma força além de sua compreensão. Não havia mais dúvida em sua mente. Ela tinha que seguir aquela voz.
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Os Sussurros da Condenação
TerrorEm "Sussurros da Condenação", seis contos sombrios exploram os destinos trágicos de personagens que sucumbem a seus próprios desejos e fraquezas. A cada capítulo, um narrador misterioso interage tanto com o leitor quanto com os protagonistas, instig...