[01] O retrato esquecido

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Protagonista: Haerin

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Haerin sempre foi uma pessoa reservada, e quando se mudou para aquela casa antiga no subúrbio, pensou que finalmente teria um lugar para ficar sozinha com seus pensamentos. O lugar era espaçoso, levemente decadente, mas tinha um charme rústico que a atraía. Enquanto explorava os cômodos vazios, encontrou o que parecia ser um estúdio. Nele, coberto de pó e escondido atrás de pilhas de móveis velhos, estava um retrato.

O quadro era grande, emoldurado por uma madeira escura que parecia quase se fundir à penumbra do cômodo. Nele, uma garota idêntica a Haerin a observava. O rosto era o mesmo, porém a expressão carregava uma seriedade, quase uma tristeza sufocante.

No começo, Haerin se sentiu incomodada, mas decidiu deixar o quadro lá, por puro descuido. Não queria olhar para ele, mas, por alguma razão, não conseguia ignorá-lo totalmente. A cada vez que passava pelo estúdio, tinha a impressão de que os olhos da garota a seguiam, observando seus passos com um interesse doentio.

Com o passar dos dias, Haerin começou a notar mudanças sutis na imagem. O semblante da garota se tornava mais pesado, a pele mais pálida, os olhos afundados como se tivesse passado dias sem dormir. Haerin evitava olhar diretamente para o retrato, mas toda vez que fazia, era como se a expressão refletisse suas próprias emoções. Se Haerin tivesse uma semana difícil na faculdade ou se sentisse ansiosa, a garota no retrato pareceria ainda mais desgastada, como se a tristeza estivesse se aprofundando dentro dela.

À noite, a situação piorava. O estúdio, sempre escuro, ficava ainda mais opressor. Haerin ouvia passos vindos de dentro do cômodo, como se algo estivesse se movendo. Quando tomava coragem para espiar pela porta entreaberta, o retrato a observava com um olhar que beirava o desespero.

Certa madrugada, já exausta e atormentada, Haerin decidiu que não podia mais suportar. Pegou o quadro com as mãos trêmulas e o levou para fora. Tentou queimá-lo, mas o fogo não deixava marca. Jogou-o no lixo, mas no dia seguinte ele estava de volta, pendurado no mesmo lugar. Haerin começou a duvidar de sua própria sanidade. Será que tudo não passava de alucinação?

Determinada a se livrar daquilo de uma vez por todas, ela pegou o retrato e, com um martelo, tentou quebrá-lo em mil pedaços. Mas quando a moldura se partiu, um grito atravessou o ar, cortante e agudo, como se a própria garota do quadro estivesse gritando de dor.

De repente, Haerin se viu paralisada. O rosto da garota começou a se mexer dentro da pintura. Os olhos se viraram diretamente para ela, e os lábios pálidos se abriram em um sorriso cruel. Então, lentamente, a mão pintada começou a se estender para fora, os dedos magros atravessando o vidro como se fosse uma superfície líquida. Haerin tentou recuar, mas estava presa no lugar.

— Você não percebeu ainda? — a voz da garota ecoou pela sala, rouca e baixa. — Eu sou você.

Com um puxão repentino, a garota do retrato agarrou o pulso de Haerin e a arrastou para dentro. Foi como ser sugada por um redemoinho gelado. A última coisa que Haerin viu foi a moldura ao seu redor se fechando, enquanto a garota ocupava o lugar que antes era seu. Haerin, agora dentro da pintura, olhava para fora, impotente e desesperada.

Quando Haerin acordou, estava em um espaço escuro, uma escuridão que não tinha fim. Tentou gritar, mas sua voz não produzia som. Olhando à sua frente, viu a sala onde antes estava — mas agora, do outro lado da moldura. Do lado de fora, a outra Haerin caminhava até o espelho da sala, ajustando o cabelo e sorrindo de um jeito que ela nunca havia sorrido.

Então, Haerin percebeu: ela estava presa. A pintura, de alguma forma, havia tomado sua alma e a trancado ali dentro. Agora, ela era apenas um reflexo, uma sombra de quem havia sido, condenada a assistir enquanto outra pessoa vivia sua vida.

A nova Haerin viveu como se nada tivesse acontecido. As amigas e os conhecidos notaram algumas pequenas mudanças em sua personalidade, mas ninguém suspeitou que a verdadeira Haerin estava presa dentro do retrato.

E, de vez em quando, quando a casa estava vazia, a nova Haerin parava na frente do quadro, olhando diretamente para os olhos desesperados da garota dentro dele, e murmurava:

— Não se preocupe. Um dia alguém vai se juntar a você.

contos para (não) dormir 𔓕 newjeansOnde histórias criam vida. Descubra agora