Capitulo 4

1 1 0
                                    

Conheço  muitos tipos de olhares, já observei uma cota deles enquanto eu crescia em ambiente hostil e lotado da pior nata da humanidade e isso, eu quero dizer... crianças.

As pessoas podem dizer que crianças são inocentes, uns anjinhos mas, pra mim sempre ficou claro, ninguém fere seus sentimentos pior do que uma criança.

E essa era a grande diferença entre mim e Miguel - meu gêmeo - ele estava disposto a perdoar as chacotas e xingamentos, disposto a esquecer as risadas e o distanciamento, disposto a se humilhar por um pouco de aceitação da sociedade ao nosso redor, mas eu não.

Eu vou bater tão duro quanto o soco que eu receber, não deixaria ninguém puxar o meu tapete sem mostrar o quão baixo eu posso deixar o seu chão. Vou abalar o meu oponente tão forte que vou desorienta-lo até que não sobre mais nada além de um pedaço de lixo sob os meus pés.

E deve ser por isso que estamos aqui - suspiro - talves eu tenha pego muito pesado e tenha atraído mais problemas que resoluções. Mas simplesmente me enervava  ver Miguel fazer de tudo para se encaixar e ser abusado físico e emocionalmente  e infelizmente não podíamos contar com a nossa mãe. Não que ela seja uma mãe ruim, para nós, ela é  a melhor mãe  do mundo. Porém, a cada dia que eu olhava para ela, parecia que a culpa me corroia por dentro.

Colaborem. Esse é o nosso lema.

Uma equipe?

Não sei bem em que parte mamãe achou que o fardo de responsabilidades era somente dela. Mas ela conseguiu. Trabalhar, cuidar de uma casa, criar dois filhos, passar por sobre a deficiência e  trauma de Miguel, aguentar o meu temperamento e ignorar seu coração quebrado. Com o passar dos anos ela parecia estar desaparecendo sob os nossos olhos, definhando a cada mês - e eu não quero dizer apenas no peso.

E se o melhor pra ela fosse nosso afastamento mesmo? Pelo menos por um tempo? Mas nesse lugar? Estremeço, ignorando o ambiente frio que agora seria o meu quarto por alguns meses.

Isso não é  uma escola, nem mesmo um reformatório. Por trás dessas paredes bonitas e sorrisos de simpatia, algo muito sombrio e quase... predatório se esconde. Preciso encontrar Miguel e saber o porque ele nos colocou nesse lugar. Miguel precisa aceitar sua condição. Os médicos disseram que não havia possibilidade dele voltar a andar. Na realidade - engulo em seco - o médico disse que nenhum cirurgião  seria maluco de fazer uma cirurgia tão arriscada, mas e  se ele tivesse  encontrado algum sádico nesse lugar? E se houvesse alguém aqui que faria?

_Você é  muito calada - minha anfitriã e nova colega de quarto me comprimentou ao entrar no quarto. Seu inglês tinha um evidente sotaque britânico e ela parecia sempre estar sorrindo, como se fosse natural ser feliz o tempo todo - Quando você estiver pronta, posso te mostrar o campus.

_Não  obrigada - respondo ao me virar - Posso descobrir sozinha.

_Na verdade você não pode.

_Como é  que é?

A ruiva segura a barra de sua saia evidentemente ansiosa com alguma coisa.

_Não posso andar sozinha pelo campus?

_Você pode - ela responde nervosamente - Mas primeiro  preciso te mostrar os lugares que você pode ir e os que não pode, assim como os que você deve... evitar.

Nos encaramos por um longo momento. Acho que eu não havia captado bem, com o meu cérebro em narnia  e tudo mais. _Olha, Valentina né o seu nome? Veja, acho que eu não entendi muito bem. Você está querendo me fazer uma recomendação  ou essa é  seriamente uma regra?

Observo os olhos de Valentina e encontro apenas medo me encarando de volta. Ótimo. É  uma regra.

_Você precisa entender que aqui as coisas são um pouco diferente das escolas comuns.

Herdeiros pelo SangueOnde histórias criam vida. Descubra agora