Foi por você

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Minha primeira noite na casa de Thiago foi difícil. De fato ele deu o espaço que precisava, mas não antes de me deixar longe de todo e qualquer material cortante. Ou seja, adeus depilação.

Fazem dois meses que estou morando aqui e consegui um emprego num colégio de ensino médio. Sou professora de matemática há uns bons anos. E finalmente fui contratada.

Os primeiros dias foram difíceis, e percebi que faz muito tempo que lidei com adolescentes pela última vez, mas posso fazer isso.

Nesses dois meses, Thiago e eu mantivemos distância um do outro. Ele pareceu relutante, mas fez o que eu pedi. Finalmente um homem que respeite as vontades de uma mulher.

A melhor parte do meu dia é voltar para casa, e ver Diego sentado no chão,  brincando com Tutu e contando ao animal de pelúcia como foi seu dia na escolinha. E eu logicamente, preciso dar um beijo na testa dele e um na testa de Tutu.

Não mereço todo esse amor incondicional.

Todas as noites, eu e Thiago nos revezamos na cozinha, conversando somente sobre o essencial. E essa é uma dessas noites, entretanto estou nervosa. Diego não está em casa, foi para a primeira festa do pijama dele. É na casa de um dos primos dele. Ou seja, sobrinhos de Thiago.

E pela primeira vez em dois meses ele me pergunta algo:

- Está se sentindo melhor?

- Do quê?

- Há dois meses, nós dois discutimos, quero saber como você está agora.

- Estou bem Thiago, obrigada por perguntar - óbvio que eu nem queria respondê-lo.

- É óbvio que não queria me responder Eliza.

Ele sabe até o que eu penso? Que merda!

- Tão óbvio - ele continua - que consegui ver seu desespero no olhar.

- Não quero que veja.

- Já vi.

- Então pare de olhar porra! - respondo com raiva.

Assisto um sorriso idiota se formar em seus lábios.

- Filho da puta - xinguei baixinho.

- Eu ouvi, não não xingue minha mãe!

- Você é adotado - falei com tom de sarcasmo - eu na verdade xinguei sua mãe biológica. Que deve ser um cavalo, para ter um animal desses como filho!

- E sua mãe deve ser um dinossauro! Nunca vi uma mulher ser tão mal humorada!

- Apenas te imitando, meu bem.

- Agora é "meu bem"? Pensei que eu era o filho da puta.

- Pode ser os dois.

Nessa discussão toda, nem percebi que o frango ao molho havia queimado. Só senti o cheiro.

- Puta merda Thiago! Queimei o frango...

Desliguei o fogo, me voltando para ele.

- Se arruma, vamos jantar fora.

- Como?

- É exatamente isso.

- Mas e essa bagunça?

- Quando eu voltar, arrumo, agora vai Eliza.

Fazem tantos anos que não me sinto jovem e bonita. Na real nunca me senti bonita, mas tanto faz. Nunca vou sentir falta de ser vazia. Vou encher minha vida de coisas boas. Incluindo isso.

Ando pelo corredor, em direção ao meu quarto, depois de ter ido ao banheiro por uns três minutos. Encaro Thiago, que acabara de sair do meu quarto.

Sem questionar nada, adentro em meus aposentos, sentindo o frio familiar de um vento soprado da janela. Acendo as luzes, vendo um vestido verde oceano bem escuro, sobre a cama, muito lindo. Veio com um cartão.

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