Capítulo 1: Sombras do Passado

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Em meio ao nevoeiro denso que cobria a pequena cidade de Monte Velho, o relógio da torre da igreja batia meia-noite. O som ecoava pelas ruas desertas, trazendo consigo um sussurro inquietante que parecia vir do próprio chão, como se a própria cidade tentasse comunicar algo urgente. As árvores balançavam suavemente, projetando sombras longas e sinuosas que pareciam figuras dançantes à luz dos postes esparsos. O ar estava impregnado com a fragrância pesada da terra úmida, misturada com o toque metálico da ferrugem. Jackson Moreira, um detetive aposentado, seguia sua rotina solitária. Estava sentado em sua cadeira de couro desgastada, fitando a lareira, onde as chamas dançavam de forma quase hipnótica. As paredes de sua casa eram adornadas com recordações de sua antiga vida: prêmios emoldurados, fotos de casos resolvidos e manchetes de jornal desbotadas pelo tempo. A cadeira balançava levemente enquanto ele se perdia em pensamentos, o estalar da madeira no fogo sendo a única companhia na vastidão do silêncio. Jackson era conhecido por sua habilidade em resolver os casos mais intrincados, mas a aposentadoria não havia sido sua escolha. Há três anos, durante uma perseguição a um perigoso sequestrador, um acidente horrível deixou Jackson gravemente ferido. O criminoso havia armado uma cilada, e no confronto, um prédio abandonado desabou sobre eles. Jackson sobreviveu, mas com várias fraturas e uma lesão que o deixou com uma dolorosa lembrança permanente e uma incapacidade para o serviço ativo. O som de escombros desabando ainda ecoava em seus pesadelos, e as cicatrizes em seu corpo eram um lembrete constante do que havia perdido.Ele passava seus dias afogado em arrependimentos e em uma garrafa de uísque barato, seus olhos perdidos no fogo, refletindo sua alma atormentada. As noites eram longas e cheias de murmúrios das lembranças que nunca o deixavam em paz. Havia uma caixa no armário que ele nunca abria: documentos e fotos daquele caso, intocados desde o acidente. Era como uma ferida que ele não ousava reabrir.Porém, algo em Monte Velho o mantinha alerta, um mistério não resolvido que o fazia dormir de olhos abertos. Ele sabia que a cidade guardava segredos, e que seu passado estava entrelaçado com eles. A sensação de que algo grande estava para acontecer o envolvia como uma sombra persistente.Naquela noite, um envelope antigo e surrado foi empurrado por debaixo da porta de sua casa. Jackson levantou-se lentamente, cada movimento parecendo pesar uma tonelada. Sentiu o arrepio frio na espinha ao tocar o papel amarelado e desgastado pelo tempo, como se a própria história quisesse ser revelada. Com mãos trêmulas, abriu-o e encontrou uma foto: uma criança desaparecida há décadas, rodeada por símbolos estranhos e quase esquecidos, como se fosse um enigma da história da cidade.Ao olhar para a foto, Jackson sentiu os dedos gélidos de um medo ancestral tocarem sua espinha, enviando um arrepio que o fez estremecer. Imediatamente, foi transportado para um flashback. Ele se viu, anos atrás, segurando uma criança assustada nos braços enquanto investigava uma série de desaparecimentos semelhantes. Lembrou-se da promessa que fez àquela família desesperada: nunca parar até encontrar respostas. O som da voz da mãe chorando por seu filho ecoava em sua mente, uma lembrança amarga de suas falhas.No verso da foto, uma mensagem escrita em uma caligrafia tortuosa e familiar: "Eles estão de volta, Jackson. Só você pode detê-los."Ele sabia que o remetente havia tocado na ferida mais profunda de seu passado. Aquela caligrafia era inconfundível: pertencia a Miguel, seu antigo parceiro de investigação que desapareceu misteriosamente anos antes de Jackson se aposentar. Miguel sempre teve um talento especial para decifrar códigos e símbolos antigos, e sua ausência havia deixado um vazio insubstituível.A cidade sussurrava segredos, e Jackson, mais uma vez, sentiria o chamado das sombras. Com um suspiro pesado, ele calçou suas botas e vestiu seu velho casaco de detetive. Sentia a tensão no ar, como se a própria Monte Velho estivesse segurando a respiração, esperando pelo desenrolar dos acontecimentos. O frio da noite o envolveu como o beijo da morte, e a fragrância do ar tornou-se pesada, lembrando o cheiro de um cemitério. Cada passo que dava para fora de sua casa era um mergulho mais profundo nas trevas que prometiam engoli-lo.

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