Capítulo 7

105 16 11
                                    

Jung Hoseok

Não sabia quanto tempo tinha passado desde o dia em que eu e Yoongi havíamos combinado de sermos mais comunicativos e evitar futuras brigas. Para ser sincero, eu estava começando a me acostumar com a rotina na pousada, as coisas com Yoongi iam bem e eu estava excelente em tudo o que eu fazia. Respirei fundo, sentindo-me confortável. Sentia orgulho de mim mesmo.

— Hoseok, quer ir comigo até o centro da cidade? Preciso comprar algumas coisas — Kitty perguntou, entrando no quarto sem bater, parando ao lado da cama em que eu estava deitado.

— Claro! — Assenti, dando sinal positivo para ela. Por que não? Era uma boa forma de conhecer a cidade e ver pessoas.

— Eba! Então vá se aprontar.

Passar tempo com Kitty era sempre um alívio. Ela era uma garota doce, e sua presença trazia uma sensação de normalidade e conforto que eu tanto precisava. Era como se, por um momento, eu pudesse esquecer as dores do passado e as incertezas do presente, e viver como se nunca tivesse desafios.

Quando saímos e caminhamos juntos pela cidade, Kitty falava animadamente sobre as lojas e os lugares que frequentou nos últimos dias. Eu a ouvia, tentando absorver cada detalhe do mundo humano, que ainda era tão estranho e fascinante para mim. O cheiro de pães frescos e café pairava no ar, misturando-se com a salinidade do mar, e eu me sentia dividido entre a alegria daquela experiência e a nostalgia do meu lar.

— Você precisa experimentar aquele café novo que abriu na esquina. Eles têm os melhores bolos de cenoura do mundo! — ela exclamou, seus olhos brilhando com entusiasmo. — A calda de chocolate é muito bem feita.

— Parece ótimo! — respondi, tentando me envolver na conversa, tentando acompanhá-la. — Podíamos marcar de ir lá algum dia.

— Sim, vamos marcar!

Kitty continuou falando sem puxar o fôlego, mas eu não prestava mais a atenção. Na calçada, um caminhão de frutos do mar estava estacionado em frente a um restaurante em meio à multidão, e, com suas portas traseiras abertas, vi uma caixa de isopor se movendo de maneira estranha entre tantas. Ela pulava e estremecia. Sério, aquele movimento não era nada normal.

— Hoseok, está tudo bem? — Kitty perguntou, percebendo minha distração, seu tom preocupado trazendo-me de volta à realidade. — O que aconteceu? Estava falando com você.

— Eu estou bem, só... preciso ver algo — respondi, a urgência na minha voz me empurrando em direção ao caminhão. — Espera um pouco.

Em passos lentos, me aproximei e meu coração parou. Lá dentro, em uma caixa de gelo aberta, estava Taehyung, em sua forma de uma tartaruga simples. O formato familiar do corpo, que refletia a luz, eram inconfundíveis. Ele estava encolhido, agora com as patas imóveis, e um medo profundo tomou conta de mim.

Os olhos de Taehyung, normalmente tão expressivos e cheios de vida, estavam opacos, como se a essência que o tornava único tivesse desaparecido. O pânico avassalador tomou conta de mim, cortando o meu ar. Usei discretamente meus poderes, nas pontas dos dedos, para tentar me comunicar com ele, mas não houve resposta. Era como se ele tivesse se debatido até perder a vida.

— Não... Tae... — murmurei, a dor profunda em meu peito se espalhou como um veneno.

Um dos trabalhadores do restaurante começou a descarregar as caixas, me empurrando para o lado com brutalidade, sem perceber minha angústia. Malditos humanos. Na calçada, fechei as mãos em punhos e mordi os lábios, concentrando o olhar no rosto do homem que estava à minha frente.

Lentamente, consegui sentir o sangue dele e levantei uma das mãos na altura da coxa, mudando seu percurso, fazendo o líquido escorrer devagar pelo nariz e pelos ouvidos. Ele levou a mão até o rosto e ficou surpreso ao notar o sangue quente saindo sem nenhum motivo. Soltei o ar e troquei o peso do meu corpo para a outra perna. Era tão fácil desestabilizar aquela criatura maldita.

Eu teria continuado se Kitty não tivesse se aproximado, confusa e preocupada, tocando meu ombro com delicadeza.

— Hey — ela disse.

— Merda — xinguei baixinho, me dando conta do que eu acabara de fazer.

— O que está acontecendo? — ela perguntou, parando ao meu lado. — Caramba. Olha, aquele cara está sangrando!

— Vamos embora — disse com urgência e minha voz tremeu. Eu fui imprudente, quase matei alguém.

— C-claro. — Ela ainda olhava assustada para a minha vítima.

Saímos quando uma multidão de pessoas tentava socorrer o homem, e o caminho de volta para a pousada foi um borrão de emoções confusas e desesperadas. Cada passo que eu dava parecia mais pesado que o anterior, e a necessidade de um momento sozinho, longe de todos, crescia dentro de mim. Quando chegamos à pousada, fui direto para o banheiro, sentindo o peso da realidade esmagar meu espírito.

Entrei no banheiro e enchi a banheira com água quente, esperando que o calor me acalmasse. O vapor subia, envolvendo o ambiente em uma névoa suave. Quando a banheira estava cheia, tirei minhas roupas e me deitei na água. As lágrimas finalmente começaram a cair, quentes e salgadas, misturando-se com a água. Enquanto chorava, minha cauda emergiu, revelando minha verdadeira natureza em escamas que refletiam a luz fraca do banheiro, uma lembrança agora dolorosa, do meu lar.

— Eu quase matei alguém... — sussurrei, a voz embargada pelo choro. — Eu não sei se Tae está vivo. Eu sou péssimo. Eu sou perigoso!

Fiquei ali por um longo tempo, permitindo-me sentir cada onda de tristeza e desespero. A água ao meu redor se tornava um espelho das minhas emoções: agitada, turbulenta, mas em alguns momentos, tranquila. Eu sabia que precisava ser forte, mas naquele momento, a fraqueza tomou conta de mim. Tudo o que eu queria era que as coisas fossem diferentes, que meu primo estivesse seguro, que eu pudesse retornar ao mar e deixar esse mundo confuso e cruel para trás.

Finalmente, após o que pareceu uma eternidade, minha cauda desapareceu e minhas pernas humanas retornaram. O calor da água já não trazia conforto, apenas um lembrete da realidade. Saí da banheira, ainda sentindo a tristeza pesada em meu coração. Precisava encontrar uma maneira de seguir em frente, de descobrir o que realmente havia acontecido e de continuar minha missão. Mas, por agora, tudo o que podia fazer era respirar profundamente, tentando encontrar algum tipo de força para enfrentar.





NOTAS:

Tadinho do Hoseok!

Além das Ondas (Sope)Onde histórias criam vida. Descubra agora