Liam

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2 - Liam

Perdi meu pai aos 18 anos. Estava esperando para comemorar minha aceitação em Princeton quando recebi a notícia de que seu avião havia caído. A última conversa que tive com ele foi por uma ligação falha. Ele deixou uma mensagem no correio de voz logo antes de decolar. Parecia uma despedida. Eu a ouço sempre que algo ruim acontece. Durante minha vida, perdi as contas de quantas vezes recorri a essa voz, que me traz emoções conflitantes. Hoje não foi diferente:

"Filho, ser aceito em uma universidade renomada mundialmente é incrível, mas isso não pode ser tudo para você. Tudo o que estou construindo é para você, mas, sentado aqui, longe da minha família, sem poder estar aí em seus momentos mais importantes, eu repenso tudo. Sei que pareço duro quando digo que você tem que se preparar para o peso que herdará. Sei que exijo muito e compenso pouco. Mas não há nada neste mundo que eu ame mais do que você.
Estou me esforçando para que, quando chegar a sua vez, você não tenha que perder tanto quanto eu.
Entre mim e você, eu sempre escolheria você.
Então, me perdoe por todas as vezes em que quis meu abraço e não o encontrou. Estarei aí para abrir com você sua primeira bebida de verdade. Vamos brindar suas conquistas juntos.
Quero sempre estar ao seu lado a cada vitória que for brindar, assim como quero te aconselhar antes dos goles de desgosto.
Na vida, perdemos e ganhamos, isso é inevitável. O que importa de verdade é quem estará ao nosso lado em cada um desses momentos. Quem nunca deixará de erguer um copo ao nosso lado. Te amo.
Me espera acordado."

Ergo meu copo.

— Um brinde às escolhas de merda.

O trinco da porta faz barulho. Sento na cadeira da copa, bebericando o destilado de péssima qualidade.

— Puta merda! Que porra tá fazendo aqui, Liam?

— Liam? Não é "Senhor Liam"? — olho para o copo, ponderando se mato tudo de uma vez. Assinto, sabendo que é melhor acabar logo com isso.

— Só te chamo de senhor na frente dos outros funcionários. Fora da empresa, você é só o Liam, o idiota que invade meu apartamento sem ser convidado e toma minhas bebidas.

Vinícius tira a garrafa de cima da mesa e a guarda no aparador improvisado de bar.

— Preciso te dar um aumento. — Faço uma careta quando o líquido desce, amargo, mesmo com minha língua já meio adormecida.

— Isso é um fato. — Ele coloca as sacolas de compras sobre a mesa. — Guarda o que é de geladeira.

— Agora manda em mim? — levanto e começo a separar os alimentos.

— Você está na minha casa. — Ele responde, perplexo. — Aliás, o que tá fazendo aqui? Não te falei que era para se preparar para a reunião de amanhã?

— É exatamente o que estou fazendo. — Vinícius coloca uma panela de água no fogo e deixa uma bandeja de massa fresca ao lado. — Guardo isso? — mostro o saco de tomates. Ele nega com a cabeça.

— Me passa o manjericão também.

Entrego.

— Não coloca muito, sabe que não gosto.

— Você é folgado. — Ele ri, me entregando uma tábua e uma faca. — Corta o tomate.

— Não acha que tá mandando demais?

— É isso ou come em outro lugar.

— Como quer que eu corte?

Dou a primeira garfada. Está maravilhoso. Se Vinícius não fosse tão bom no que faz, com certeza teria um restaurante. Nunca admitiria, mas acho que ele se sairia bem em qualquer coisa.

Conheci Vinícius no primeiro ano de Princeton. Ele era o típico nerd, introspectivo, com quem ninguém falava. Eu, filho de uma brasileira com um americano, cresci fluente nas duas línguas. Meu pai fundou a Purangy depois de uma viagem ao Brasil, onde se apaixonou pelas riquezas naturais. Não me lembro de como era nossa vida antes de enriquecer. Tudo aconteceu rápido.

Cresci entre os dois países. Quanto mais dinheiro minha família ganhava, mais tempo passávamos nos Estados Unidos. Quando meu avô faleceu, anos depois do acidente com meu pai, parei de ir ao Brasil. Voltei agora para assumir o que meu pai me preparou para ser.

Descobri que Vinícius era brasileiro e havia conseguido uma bolsa para Princeton. Isso chamou minha atenção. Sabia que ele era especial só por estar lá. Nos aproximamos, e ele nunca me decepcionou. Ele é um gênio. Juntos, somos imbatíveis. Por isso o trouxe comigo para a Purangy. Ele é meu cérebro.

— A massa tá mole, passou do ponto. — Provoco, vendo-o parar de mastigar. Eu posso precisar dele, mas isso não significa que daria o braço a torcer.

— Então não come. — Ele responde, sem perder o ritmo.

— Insolente.

— Folgado. — A verdade é que a intimidade é uma merda. Mas Vinícius sabe até onde pode ir. — Você veio aqui porque está preocupado com a reunião de amanhã?

— Não... — Ele responde, pensativo. — Não é preocupação. Só quero entender o que deveria fazer.

— Comece por não se envolver com mulheres interesseiras.

— Ah, jura? Como se isso fosse possível.

— Você foi listado pela Forbes como um dos homens mais bonitos e interessantes do mundo. Vai ter que lidar com isso. Se não sabe se proteger de certos tipos, fica sozinho.

Rio.

— Vou virar celibatário só porque sou interessante e bonito?

— Não, porque é burro mesmo.

Meu olhar queima a risada dele, e Vinícius quase engasga.

— Já te disse para não levar essas moças a eventos importantes. Sai com elas discretamente.

Suspiro. Ele está certo. Gosto de estar bem acompanhado, mas beleza nem sempre é sinônimo de boa companhia.

— Então, o que eu faço? Não ligo para o que James pensa, mas se os acionistas se envolvem, a coisa fica séria. Alex só está esperando a oportunidade certa para me derrubar.

— Com certeza! — Ele larga os talheres e me encara. — Primeiro, precisamos entender a situação. James sempre aborda você com cuidado, e sua mãe é a maior acionista. Ela pode não escolher lados, mas sua opinião pesa.

— Ela deve estar furiosa por eu não falar com ela. Já imagino a cara de decepção.

Vinícius faz uma pausa.

— Mesmo assim, a Purangy está em uma era de ouro. Isso conta a seu favor. Fica calmo e se prepare para uma conversa controlada. Vamos resolver tudo. Já acionei os advogados para remover a matéria e garantir que a Mary Mariah não mencione seu nome de novo. Ela está proibida de falar de você publicamente.

— Que bom.

— O resto a gente resolve amanhã. Ok, senhor? — Ele sorri, e eu rio junto.

O CEO Arrogante (degustação)Onde histórias criam vida. Descubra agora