Capítulo 3

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— Nunca mais coloco uma gota de álcool na boca — murmurei, sentindo a cabeça latejar como se estivesse prestes a explodir. Ainda atordoada, sentei-me na beira da cama, olhando ao redor. A bagunça no quarto parecia refletir meu próprio estado mental.

Então me lembrei do e-mail.

Dei um pulo, o coração disparado. Aquele e-mail realmente havia chegado? Corri em direção à sala, tentando lembrar onde tinha deixado o celular na noite anterior. Olhei em volta, procurando entre as almofadas, o sofá... Lá estava ele, caído entre as almofadas.

Peguei o celular , respirei fundo e desbloqueei a tela.

O ícone de notificação ainda estava lá.

Li uma, duas vezes, ainda absorvendo a ideia de que iria sair da cidade para estudar cinema.

Não estava esperando a aprovação. Afundada há uma semana em roteiros e melancolia, não sobrou espaço para o otimismo. Não havia planejado nada, e agora, com menos de uma semana para o início das aulas, precisava resolver tudo o que estava pendente antes de viajar.

A ideia de entregar o apartamento e me mudar para um dormitório universitário não era tão ruim assim. Eu não precisaria me preocupar em fazer comida, o que já era uma grande vantagem, e, principalmente, não teria que ir para a emissora. Isso significava que não veria Dylan por um bom tempo, e esse tempo longe dele poderia ser exatamente o que eu precisava.

Ainda com o celular na mão, liguei para Alice. O toque parecia interminável, mas finalmente ouvi sua voz do outro lado da linha.

— Elowen! Oi! — ela respondeu, cheia de energia, como sempre.
— Oi, Alice, está muito ocupada?
— Acabei de terminar a reunião.
— Eu... preciso te contar uma coisa — disse, tentando encontrar as palavras.

— O que aconteceu? Você parece estranha.

— Eu vou me mudar. Consegui uma bolsa na Academia de Artes de Redwood e começo as aulas em janeiro. Deveria encontrar outra roteirista para o marketing — revelei, sentindo um misto de ansiedade e alívio.

— Uau! Isso é incrível! — ela exclamou. — Por que você não me contou antes? Precisamos comemorar!

Antes que eu pudesse responder, ouvi uma voz interrompendo a chamada.
— Está falando com a Elowen? — indagou Dylan.

— Sim, ela vai se mudar em breve. Precisamos comemorar! — respondeu Alice.

Senti meu estômago revirar ao pensar em ver Dylan; na verdade, ele saber sobre a bolsa já me incomodava. Logo ele, que quando contei da inscrição havia dado a mínima.

— Alice, não precisa — tentei intervir, mas a empolgação dela já estava à toda.

— Claro que precisamos! Elowen, isso é uma nova fase! Vamos sair, fazer algo divertido com o pessoal do escritório antes de você ir! O que vocês acham, gente? — Ela ainda estava reunida com a equipe, e todos estavam ouvindo a conversa.

Um coro de vozes animadas ecoou ao fundo, e isso só aumentou minha ansiedade.

— Vamos marcar um jantar hoje? — perguntou ela, a empolgação evidente em sua voz.

— Acho melhor não... estou um pouco sobrecarregada com a mudança — respondi, tentando de qualquer jeito evitar a ocasião.

A hesitação na minha voz pairou no ar, e a tensão na linha era palpável. Dylan ainda estava em silêncio, e o que eu mais queria era que ele dissesse algo. O que ele estava pensando? Eu me perguntei se ele realmente se importava ou se estava apenas aliviado por saber que eu estava indo embora.

— Vamos apenas comer e ficar conversando! Não é como se você estivesse saindo para sempre, Elowen — insistiu Alice, sua voz animada me fazendo sentir ainda mais pressionada.

— É, mas... — comecei a argumentar, mas fui interrompida pela voz de Dylan.

— Tenho que terminar a coluna para o Ano Novo, não sei se vou conseguir ir.

O tom dele era neutro, mas havia algo lá que me fez sentir ainda mais confusa. Era evidente que eu não queria ir por causa dele, e ele sabia disso. Estava me evitando por meu bem ou porque realmente não queria mais me ver?

— Te mando o endereço por mensagem, Dylan. Se terminar a tempo, vai se despedir de Elowen — Alice respondeu, sem fazer ideia alguma do nosso romance.

— Te espero lá, Elowen! — disse ela, cheia de expectativa.

— Claro— finalizei, tentando não deixar minha insegurança transparecer.

Depois que desliguei, me deixei cair no sofá, era difícil ignorar a insistência de Alice. Mas pelo que entendi, Dylan não iria, e sem ele, a ideia de me despedir do pessoal parecia ser o mínimo que eu poderia fazer. Decidi ir.

O celular vibrou, e era uma mensagem de Alice no grupo do escritório, informando o endereço e o horário.

Todos confirmaram presença, exceto Dylan, o que era ótimo.

Alice fazia planos, como sempre animada, falando sobre o que iríamos fazer depois do jantar. Não pude deixar de lembrar da primeira vez que a conheci. Apesar de ser minha chefe, Alice sempre foi uma companheira para os problemas do dia a dia. Lembro de como ela me apoiou quando me mudei para a cidade grande sem conhecer nada. Suas dicas sobre onde ir, o que fazer e até como me comportar em reuniões foram inestimáveis.

A única coisa que Alice não tinha me ensinado sobre a cidade grande era como evitar cafajestes. Era como se essa informação essencial tivesse escapado de todas as suas dicas valiosas. Mas, mesmo com todas as suas orientações, não havia manual que me preparasse para as armadilhas emocionais que eu havia enfrentado. Dylan havia se mostrado o oposto do que eu esperava, e o relacionamento que pensei ser especial rapidamente se transformou em um pesadelo.

— Por que ela não cria um guia de sobrevivência contra cafajestes? — murmurei para mim mesma rindo. Aquela frase irônica parecia encapsular tudo o que eu sentia: a frustração de não ter percebido os sinais, de ter confiado demais em alguém que não merecia.

Ninguém do escritório sabia sobre Dylan. Eu nunca fui de contar muito sobre minha vida pessoal para os outros; sempre senti que precisava guardar tudo para mim. Não gostava de ser um fardo ou causar preocupação. Era como se houvesse um espaço entre mim e os outros, onde eu era apenas Elowen, a roteirista, e não a mulher que se envolveu em um relacionamento complicado.

Talvez esse tenha sido meu erro. Se eu tivesse conversado com Alice sobre esse tipo de coisa, talvez eu tivesse me tocado mais cedo sobre o que estava realmente acontecendo.

Ainda tinha algumas horas livres antes do jantar, e decidi começar a me organizar para a viagem. Levantei e fui até o armário e comecei a separar algumas roupas. Queria garantir que levaria o que fosse essencial, mas também algumas peças que me fizessem sentir confiante.

Depois me dirigi até a estante e comecei a juntar meus livros. Havia alguns roteiros que eu queria revisar, além de uma coletânea de filmes clássicos que me acompanhavam há anos.

Enquanto organizava tudo, a ideia de deixar tudo para trás começava a parecer mais leve. Era um novo começo, e eu estava pronta para isso.

O sussurro das mariposasOnde histórias criam vida. Descubra agora