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⠀⠀⠀O ar da manhã trazia um frescor quase desconhecido para Daxton. Ele fechou os olhos por um instante, deixando o vento frio tocar seu rosto e, com isso, varrer uma parte das lembranças que ainda pesavam. Os sons, o cheiro de pólvora, e os gritos abafados da guerra continuavam vivos em sua mente, como uma sombra constante, ainda que estivesse ali, parado diante da janela de um quarto familiar. Mas aquele subúrbio silencioso parecia tão distante do lugar em que ele havia deixado pedaços de si.Da cama, Lily dormia com o rosto sereno, e Daxton se pegou observando-a, como se tentasse se lembrar de quem era antes de partir. Os primeiros dias ao lado dela, desde o retorno, foram uma mistura de conforto e estranhamento. Ela queria saber dos detalhes, das experiências e dos traumas que ele mantinha trancados a sete chaves. Mas as palavras que ele precisava não vinham, porque como poderia explicar que a guerra o desfez de uma maneira que ele mesmo não compreendia? Como descrever o vazio que Diego, seu melhor amigo, deixara? A ausência do amigo era como um buraco que ele não conseguia, e nem sabia se queria, fechar.
Os dias seguintes trouxeram mais do mesmo. Daxton vivia o cotidiano com um sorriso mascarado e gestos automáticos, mas no fundo, tudo parecia se desbotar. Lily percebia o vazio, e ele podia sentir a preocupação dela crescendo a cada tentativa fracassada de arrancar dele uma emoção genuína. Naquela manhã de outono, quando as folhas já tingiam as ruas de um laranja profundo, ela finalmente mencionou o que ele evitava há semanas.
— Dax, você precisa de ajuda. — Lily segurou a mão dele com delicadeza. — Você não precisa enfrentar isso sozinho.
Daxton desviou o olhar, o peito apertado.
— Não sei se alguém entenderia, Lily. Nem eu mesmo entendo direito.
Ela apertou sua mão, o observando com um olhar suave, mas determinado.
— Talvez alguém possa te ajudar a entender, então. Talvez você precise de alguém que te ajude a descobrir o que realmente te assombra. — Ela fez uma breve pausa, como se estivesse escolhendo as palavras com cuidado. — E você conhece Amira, aquela enfermeira, certo? Ela trabalhou com soldados; pode conhecer alguém que… que seja capaz de lidar com isso.
A simples ideia de compartilhar sua dor com um estranho o enchia de desconforto. No entanto, Lily tinha razão. Ele precisava de algo, qualquer coisa que pudesse fazê-lo sentir-se mais leve. Por mais que negasse, sabia que estava chegando ao seu limite.
— Vou falar com Amira. — As palavras saíram hesitantes, mas, de alguma forma, sinceras. Lily apertou sua mão e ofereceu um sorriso de alívio.
— Liga para ela hoje. Você está aqui, mas ao mesmo tempo tão distante que é como se ainda estivesse lá. — Ela deixou um beijo em sua mão antes de sair, deixando o celular ao lado dele e fechando a porta.
Ficou parado por longos minutos, o celular em mãos, enquanto tentava criar coragem. Lembrar de Amira era inevitavelmente lembrar dos piores momentos de sua vida, de estar entre a dor e a exaustão, vendo homens ao seu redor serem destruídos física e mentalmente. E ela, de certa forma, testemunhara tudo aquilo ao lado deles. Antes que pudesse mudar de ideia, discou o número dela.
— Alô? Daxton? — A voz de Amira parecia surpresa e, ao mesmo tempo, como um sopro de familiaridade.
— Sou eu mesmo, Amira. — Ele soltou um riso baixo, sentindo o alívio de ouvir uma voz que, de alguma forma, compreendia o que ele havia passado.
Ela suspirou do outro lado da linha, antes de falar, cuidadosa.
— Sei que não é fácil, então vou ser direta: precisa de ajuda? Ou melhor… vai aceitar ajuda dessa vez?
Daxton hesitou, mas, enfim, assentiu como se ela pudesse ver.
— Vou tentar, Amira. Acho que... preciso de alguma coisa.
— Tudo bem. Conheço alguém que pode te ajudar a entender esse caos. — A voz dela estava firme e serena. — Vou te passar o contato. Confia em mim, Dax, você não precisa enfrentar isso sozinho.
[...]
Dois dias depois, ele estava em uma sala de paredes claras e decoração acolhedora. A clínica especializada em reabilitar ex-combatentes parecia quase irreal; uma realidade onde o conforto se misturava com o caos interno que ele carregava. Estava com seus pensamentos a mil, ate um homem estrar na sala, ele parecia ser um pouco mais velho, tinha um olhar tranquilo e uma postura que inspirava confiança. Vestia-se de maneira simples, com uma camisa branca e um relógio discreto no pulso, sua altura era impressionante, parecia ter quase dois metros e oculos pretos e redondos ameacavam cair de seu rosto. Entrou e acomodou-se em uma das poltronas enfrente a de Daxton. Ele o encarou de uma forma assustadora, fazendo as palavras na mente de Dax parecerem difíceis de se articular.
— Sou seu terapeuta, Joseph. — Sua voz era calma e acolhedora. — Fique à vontade para começar. Estou aqui para te ouvir.
Daxton apertou as mãos, tentando controlar o nervosismo que explodia em seu peito. Ficou em silêncio por alguns instantes, enquanto as memórias o sufocavam.
— Não sei nem por onde começar. — Sua voz saiu fraca, quase um sussurro. — Não sei nem dizer qual é o problema.
O olhar de Joseph se tornou ainda mais atento, como se enxergasse além das palavras de Daxton.
— Acho que você sabe o problema, Daxton. Está em sua mente o tempo todo. — A voz dele soou firme, mas com um tom que o encorajava a continuar.
As palavras o pegaram desprevenido. As pessoas ao seu redor tratavam-no como algo que poderia quebrar a qualquer momento. Mas Joseph o desafiava.
— Tenho pesadelos, isso ajuda? — Daxton disse, quase em um desafio.
— Ajudamos a entender mais. — Joseph sorriu brevemente, as covinhas discretas em suas bochechas suavizando o rosto. — Quer falar sobre esses pesadelos?
Daxton respirou fundo. As lembranças o arrastaram de volta à enfermaria, à dor sufocante, ao isolamento. Ele estava rodeado por outros soldados, todos partindo, mas ele continuava preso, gritando para eles, mas ninguém o ouvia.
Um silêncio profundo se instaurou, e Joseph aguardou pacientemente, sem quebrar o momento. Daxton, que jamais pensou que se sentiria à vontade para compartilhar isso com alguém, se viu falando mais do que imaginara.
— Você é um homem de poucas palavras, Daxton? — A pergunta de Joseph o pegou de surpresa, tirando-o do transe.
— Não pareço ser? — Ele respondeu em um tom defensivo.
— Parece, sim. Mas nem sempre é fácil ser assim, não é? Conheceu alguém lá que, talvez, fosse diferente? Alguém com quem conseguia falar?
Daxton sentiu a garganta secar, o gosto amargo do passado subindo novamente.
— Quer saber se sou antissocial, doutor? Isso é o que pensa? — Ele se levantou abruptamente, irritado.
Joseph permaneceu calmo, ainda sorrindo como se não tivesse acabado de ser confrontado.
— Nos vemos na próxima sessão, Sr. Willians.
Daxton estreitou os olhos, cheio de raiva.
— Quem disse que vou voltar?
— Sei que vai. — A confiança na voz de Joseph parecia inabalável.
Daxton saiu, batendo a porta atrás de si. Mas, lá no fundo, sabia que o medo de enfrentar o que ainda não entendera o traria de volta.
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𝗌𝗈𝗆𝖻𝗋𝖺𝗌 𝖽𝖾 𝗮𝗺𝗼𝗿 ᡣ𐭩 ּ ꫂ 사랑
Roman d'amourDaxton é um jovem marcado profundamente pelos traumas do serviço militar. A perda de seu melhor amigo e os horrores vividos durante a guerra o deixaram emocionalmente devastado, obrigando-o a retornar para casa em busca de recuperação. Joseph, um te...