Capítulo 4 - Confusão no aeroporto

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Xu Lee nunca havia viajado de avião antes. Quer dizer, não que ela se lembrasse. Quando era ainda um bebê, ela foi trazida do Brasil para a China, onde passou a crescer sob os cuidados da avó, perdendo o contato com a sua mãe. Por não ter recordações dessa época, estar dentro de um avião a quilômetros de distância do chão estava causando um frio na barriga característico daqueles que experimentam algo novo pela primeira vez.

A garota conseguiu pegar um assento perto da janela, o que permitiu que ela passasse grande parte da viagem olhando as nuvens lá longe. Yotra não havia ido ao aeroporto para se despedir, o que deixou Xu um pouco cabisbaixa, mas não triste. Se Yotra não gostava da ideia de Xu Lee viajar para o Brasil junto com Keen Xong, não havia nada que mudasse a opinião da amiga. Infelizmente.

Quanto a Keen Xong, ele passou grande parte da viagem com o olhar fixo no assento da frente, sem fazer movimentos bruscos na poltrona. Por um momento, Xu pensou que o colega de viagem estava passando mal ou com uma forte dor de barriga, mas logo descobriu o porquê da atitude dele.

— Você tem medo de viajar de avião? — Xu perguntou, descontraída.

— Eu? — Keen tentou responder com o mesmo tom de descontração, mas o avião deu um solavanco no meio do ar e o rapaz segurou com força o seu cinto de segurança. — Estou morrendo de medo.

— Por que não avisou antes, Keen?

— Para você tentar me convencer a não viajar contigo? Jamais. Já basta a minha irmã.

— Sim...

Xu Lee tentou segurar o riso. Ela estava achando engraçada a situação de Keen, mas algo a fez mudar de semblante. Um homem de meia-idade, com um cavanhaque grisalho e sobrancelhas grossas, passou pelo corredor olhando fixamente para os dois. Xu desviou os olhos, mas ficou observando a movimentação do estranho de relance. O homem possivelmente estava voltando de sua ida ao banheiro. Ela ergueu a cabeça mais um pouco para ver onde o desconhecido estava sentado. Percebeu que ele se sentara nas poltronas do meio do corredor ao lado de outros dois rapazes também mal-encarados. O homem de cavanhaque apontou para as poltronas de Xu e Keen, como se estivesse falando algo sobre os dois para seus companheiros.

— O que foi? — Keen indagou preocupado. — Você ficou séria do nada.

— Passou um cara muito esquisito por aqui. Ele ficou nos encarando e se sentou ali atrás.

— Isso é suspeito. — Keen fez o mesmo movimento da amiga para ver de quem ela falava. Percebeu então que um outro homem, colega do primeiro, levantou-se e caminhou para o banheiro. — Agora é o amiguinho dele que resolveu ficar andando pelo avião. Acho melhor ficarmos de olho neles.

— E o que eles querem com a gente?

— Não sei... — Keen respondeu, engolindo em seco.

Xu Lee voltou a se acomodar na poltrona, dessa vez menos a vontade do que estava no começo da viagem. Agora que havia três suspeitos observando ela e seu colega, Xu sentia-se inquieta.

O restante do voo foi tranquilo, sem grandes intercorrências. O grupo de perseguidores, entretanto, continuava a encarar as poltronas onde Xu e Keen estavam sentados. Sempre que um dos rapazes se levantava para ir ao banheiro ou quando chamava uma das aeromoças, Xu percebia olhares rápidos em direção a ela. No fim, a viagem tornou-se longa e estressante.

O casal de amigos desceu no Aeroporto Internacional de São Paulo, onde deveriam pegar um táxi para irem ao endereço da mãe de Xu. Eles caminharam para a esteira automática ao qual as malas eram transportadas para seus donos. Os dois ficaram alguns instantes procurando pelas malas de Xu Lee.

— Será que o pessoal da companhia perdeu? — Keen perguntou.

— Não... — a moça sussurrou, apontando para o portão de saída onde o trio saía em posse da mala vermelha. — Foram eles que pegaram!

— Espera aí! — Keen segurou o braço de Xu antes que ela corresse na direção dos ladrões. — Aquela não é a sua etiqueta?

A garota caminhou para a esteira novamente, observando uma mala marrom (que nitidamente não a pertencia) passar por entre as demais malas com uma etiqueta com o nome "Xu Lee" nela.

— Eles trocaram a etiqueta! Mas como? — A menina bufou, cruzando os próprios braços. — O endereço da minha mãe está na minha mala.

— Você não decorou?

— Lógico que sim. Mas agora eles vão saber para onde nós vamos. — Xu Lee puxou a mala com o seu nome, já enfurecida, e abriu o zíper. Encontrou um amontoado de plástico bolhas no seu interior. — Perfeito.

— Vamos pegar de volta sua mala.

— Agora!

O casal correu em direção ao portão principal onde o trio havia ultrapassado. Eles olharam do primeiro andar o homem de cavanhaque grisalho carregando a mala vermelha de Xu Lee, já no térreo.

— É ele ali. — A moça sussurrou.

Os dois começaram a descer a escada rolante empurrando as pessoas que estavam paradas nos degraus. A essa altura, quase todos os seguranças do aeroporto haviam notado a movimentação estranha e estavam em alerta máximo.

Xu e Keen chegaram ao térreo a tempo de ver o trio passar pela saída do aeroporto, rumo a área de circulação de veículos. Xu conseguia correr mais rápido, mas devido a quantidade de pessoas andando de um lado ao outro no aeroporto, era difícil manter o ritmo. Por outro lado, Keen já era mais hábil para se esquivar dos transeuntes. Ambos chegaram do lado de fora do aeroporto e viram o trio parado atrás de um carro, colocando as malas no porta-malas do veículo.

— É agora ou nunca! — Keen correu em disparada e puxou a última mala que ainda estava no chão. Houve uma explosão de xingamentos enquanto o rapaz corria com a mala na direção de um táxi.

Xu Lee seguia atrás dele e bateu na porta na porta do veículo.

— Por favor, eu juro que a mala é minha.

— Não, não, não. Não quero confusão para o meu lado. — O taxista falou, já dando partida no morto do veículo sem abrir as portas.

— Nós te pagamos 50 mil reais! — Keen gritou.

Tanto o motorista quanto Xu arregalaram os olhos. Ela sabia que aquilo era exatamente o que tinha na sua poupança, depois de converter todo o dinheiro chinês para a moeda local brasileira.

Com essa promessa, o motorista abriu a porta do carro e deixou os dois entrarem. O táxi passou ao lado do trio de suspeitos que ficaram encarando Xu e Keen. O casal, entretanto, respirava aliviado.

— Ótimo, conseguimos! — Keen respondeu, contente. — Só temos que abrir...

— Não acredito nisso!

Eles se entreolharam aflitos. A cor da mala era bege, bem diferente do vermelho-escuro que predominava na mala de Xu. Keen puxou o zíper e se deparou com um punhado de roupas masculinas. Havia alguns pares de cuecas, camisetas de cores variadas e bermudas quadriculadas. Os dois suspiraram decepcionados.

— Desculpa.

— Nada, eu também não percebi. — Xu Lee encostou a cabeça no vidro do carro, imaginando como tudo isso iria acabar. — Agora eles têm o endereço da minha mãe.

— Mas nós vamos chegar lá primeiro. E nada de ruim vai acontecer.

— Assim espero..

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⏰ Última atualização: Oct 28 ⏰

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