Uma experiência de quase morte

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Era uma noite fria e úmida, e o ar carregado cheirava a terra molhada e folhas apodrecidas, o perfume sombrio das árvores do bosque que rodeavam a vila. Poucas tochas permaneciam acesas ao longo da rua principal, lançando sombras que dançavam em fachadas decadentes. As portas das casas estavam fechadas e trancadas, cada janela lacrada contra o mundo exterior, e o vento assobiava pelos becos escuros, criando uma melodia que parecia um sussurro inconstante. Nessa penumbra, como um vulto sorrateiro, caminhava Agatha, uma jovem de olhar aguçado e movimentos rápidos, cada passo medido, cada respiração cuidadosamente controlada.

Agatha não era como as outras pessoas. Havia um fogo sombrio em seus olhos, um brilho que falava de segredos e ambições escondidas. Ela seguia pela rua com a cabeça erguida, o capuz da capa puxado para esconder o rosto, mas seus olhos se moviam constantemente, analisando, planejando. Cada pessoa que passava, cada movimento, era uma oportunidade em potencial. Quando avistou uma mulher distraída se aproximando, com o olhar perdido em uma lista de compras amassada, um leve sorriso brotou no canto de seus lábios.

Agatha calculou o momento exato, desacelerando os passos até se alinhar com a mulher. Então, de forma quase coreografada, ela "esbarrou" de leve no braço da mulher, o suficiente para desequilibrá-la e fazer com que o papel voasse de sua mão. Com uma desculpa murmurada, Agatha se abaixou para pegar a lista, deslizando com habilidade a mão até a bolsa da mulher, tirando dela uma pequena bolsa de couro que continha suas moedas. Um segundo depois, já estava de pé, entregando a lista com um sorriso cortês. A mulher agradeceu, sem imaginar que estava sendo observada por olhos astutos, e seguiu seu caminho enquanto Agatha desaparecia de vista, fundindo-se novamente com a escuridão.

Enquanto se afastava, Agatha sentia um prazer íntimo em cada moeda furtada, em cada engano bem executado. Para ela, o mundo era um tabuleiro onde as peças deveriam ser jogadas com astúcia e sem remorso. As consequências não a preocupavam — não importava quantas pessoas perdessem algo em benefício próprio. Ela acreditava que o poder era algo conquistado, e não recebido de bom grado, e esse pensamento a sustentava enquanto subia a colina em direção a sua casa.

Quando Agatha finalmente chegou à porta de sua casa, o que encontrou era um contraste marcante com o silêncio exterior. A residência era uma velha cabana que resistia ao tempo, mas o fazia com rachaduras, teias de aranha e um cheiro acre de mofo. As paredes eram finas e frágeis, como se pudessem se desfazer com o menor toque. Havia uma umidade constante que se agarrava ao ar e, em cada canto, a escuridão parecia se enroscar, sufocante e invasiva. Esse era o lugar onde ela era forçada a chamar de lar.

Ao abrir a porta, o som dos passos dela ecoou, e uma voz fria e ríspida a saudou. Era Evanora Harkness, sua mãe. A figura magra e esguia estava sentada à mesa, os dedos ossudos tamborilando sobre o tampo de madeira enquanto os olhos dela, como gelo derretido, percorriam Agatha com uma mistura de desprezo e tédio.

— Voltou, finalmente? — Evanora perguntou, com a voz saturada de sarcasmo. — Quem diria, não é mesmo? Imaginei que ficaria perambulando até o amanhecer, como uma mendiga.

Agatha fechou a porta, tentando ignorar o tom venenoso. — Estava apenas resolvendo algumas coisas na vila. Consegui… algumas provisões — respondeu, com um leve sorriso, erguendo a bolsa de moedas.

Evanora arqueou uma sobrancelha, sem sequer se dar ao trabalho de esconder o desprezo. — Provisões? Acha que é suficiente para sustentar esta casa? Para sustentar a mim? Por favor, Agatha, nem tente enganar a si mesma. Não foi por sorte ou talento que você conseguiu isso. Você não passa de uma… usurpadora patética, exatamente como o seu pai.

Agatha fechou o rosto ao ouvir a menção do pai, mas manteve a voz firme. — Talvez seja melhor do que ser uma sombra amarga que vive de manipular e enganar os próprios familiares.

𝗥𝗔𝗜𝗭𝗘𝗦 𝗗𝗔𝗦 𝗦𝗢𝗠𝗕𝗥𝗔𝗦 ㅤִֶָ  𖥔 ݁ㅤ𝚊𝚐𝚊𝚝𝚑𝚊𝚛𝚒𝚘Onde histórias criam vida. Descubra agora