Capítulo 5: Gritos silenciosos

2 0 0
                                    

O sono finalmente a venceu, mas foi uma vitória amarga. Lirian caiu em um estado de exaustão que a puxou para um abismo sombrio, onde o calor de sua armadura desaparecia e o frio cortante da solidão a envolvia como um cobertor envenenado. O sonho veio como uma rajada — cruel, impiedoso. A floresta de Ixtal ardia em chamas tão intensas que o céu acima se pintava de um laranja opressor. O calor consumia cada folha, cada tronco, até que não restava nada além de cinzas e um silêncio sepulcral.

Ela caminhava entre os destroços, os pés descalços tocando a terra carbonizada, e o cheiro de carne queimada a sufocava. Corpos sem vida de pessoas que conhecia e amava estavam espalhados pelo chão, rostos petrificados em expressões de dor eterna. O horror em seus olhos refletia-se nas suas mãos, enegrecidas e rachadas, como se o fogo tivesse nascido ali, como se ela fosse o epicentro daquela devastação.

— Não... — O sussurro escapou de seus lábios, mas no sonho, ele não encontrou resposta. Apenas o som do fogo se arrastando pelas últimas folhas que ousavam resistir.

De repente, um riso baixo, gotejante, ecoou ao seu redor. Não era humano, mas também não era completamente bestial. A risada parecia estar em toda parte e em lugar nenhum, penetrando em seus ossos e fazendo seu coração martelar em desespero. O calor em sua armadura intensificou-se, quase a queimando por dentro, e o riso se transformou em um clamor que a fez cair de joelhos.

Lirian acordou com um sobressalto, a respiração ofegante e a pele úmida de suor. O silêncio era absoluto por um instante — até que foi rompido por um som ensurdecedor. Corvos. Centenas, talvez milhares, cercavam sua cabana. O som das asas batendo e dos gritos agudos das aves preenchia o ar com uma cacofonia caótica que se misturava ao som do sangue pulsando em seus ouvidos.

Ela se levantou trôpega, o coração disparado, e antes que pudesse se recompor, a porta da cabana se abriu com um estalo. O ar frio da floresta entrou como um sopro de morte, e ali, a poucos metros da entrada, na clareira iluminada apenas pela luz pálida da lua, estava a figura distorcida.

O espantalho. Fiddlesticks.

Ele estava imóvel, mas havia algo na forma como seus braços longos pendiam, como se esperassem pelo momento exato para se mover. A foice enferrujada refletia uma luz sombria, e os olhos, dois orbes incandescentes, fixavam-se em Lirian com um desejo antigo e faminto.

O mundo pareceu se contrair, cada som e cheiro se esvaindo até restar apenas o frio que corria por sua espinha. Ela sentiu as pernas cederem, a fraqueza invadindo seus músculos. Não era apenas medo. Era uma certeza gelada que sussurrava que, desta vez, não haveria escapatória. Fiddlesticks viera buscar sua presa.

Lirian em o Crepitar da EsperançaOnde histórias criam vida. Descubra agora