O clima da festa parecia ter atingido o auge, com todos as crianças e adolescentes se reunindo ao redor da fogueira, rindo e brincando, enquanto as sombras dançavam nas paredes ao redor deles. A luz laranja e suave iluminava seus rostos, mas para Lily, algo ainda estava errado. A sensação de estarem em um lugar sem saída, onde o tempo não existia e a realidade era distorcida, nunca deixava de se fazer presente.
Henry, percebendo a tensão que Lily ainda carregava, decidiu se afastar um pouco, indo até a fogueira para adicionar mais madeira e carvão. Ele precisava se manter alerta e garantir que o fogo não se apagasse, que nada os ameaçasse ali naquele momento. Mas, enquanto ele fazia isso, Lily, ainda com a mente turvada pela curiosidade, se afastou um pouco mais, sua atenção voltando para a parede escura que se erguia ao lado deles.
A parede não era comum. Era como se fosse parte do limbo — algo que se estendia sem fim, uma superfície impenetrável, mas que, de alguma forma, parecia convidativa. Lily sempre sentira um impulso de tocá-la, como se ela tivesse algo a oferecer, algo escondido do outro lado. O toque era quase irresistível, um chamado.
Sem pensar muito, ela se aproximou, hesitante, e esticou a mão para tocar a parede. No instante em que seu braço tocou a superfície fria e sólida, algo completamente inesperado aconteceu. Em um segundo, o braço de Lily atravessou a parede, como se não fosse feita de concreto ou pedra, mas de alguma substância etérea e maleável.
Lily ficou paralisada por um momento, incrédula, sem saber o que estava acontecendo. Ela tentou puxar o braço de volta, mas algo a impedia. Algo do outro lado, algo pesado e gosmento, começou a envolver sua mão. O toque era gelado e pegajoso, e um som baixo e gutural, como um gemido distorcido, a fez arrepiar por inteiro. Era como se a criatura estivesse ali, esperando por ela, aguardando o momento certo para puxá-la para o lado de lá.
Ela tentou se desvencilhar, mas o braço da criatura se fechou sobre ela com uma força assustadora. Ela gritou, mas o som foi abafado pela pressão que aquela coisa fazia. A sensação de estar sendo puxada para dentro da parede era aterradora — como se ela estivesse se afundando em algo profundo e gelado, algo que nunca poderia sair.
Henry, que estava perto o suficiente para perceber a mudança no ambiente, ouviu o grito de Lily e virou-se imediatamente. Seus olhos, antes calmos e atentos à fogueira, se arregalaram de preocupação. Ele correu até ela em um instante, mas a cena diante dele fez seu coração bater mais rápido.
Lily estava com o braço atravessado na parede, o corpo inteiro tentando resistir à força daquela criatura invisível do outro lado. Ele não pensou duas vezes. Sem hesitar, ele correu até ela, e com um movimento rápido, agarrou o braço dela. Sua outra mão se fechou em um punho, e ele mordeu o braço da criatura, sentindo a carne pegajosa e fria daquilo enquanto ele a puxava.
A criatura, como se fosse capaz de sentir dor, soltou um gemido distorcido e a mão de Lily foi liberada. Com um puxão forte, Henry arrastou Lily de volta para o lado seguro, tirando-a da parede antes que ela fosse completamente puxada para dentro.
Ela respirava pesadamente, ainda tonta pela experiência e pelo susto. A adrenalina fazia seu coração bater mais rápido, e seus olhos estavam arregalados pela surpresa e o medo.
Henry a segurou firme, os olhos fixos nela, mas seu rosto estava tenso, mais sério do que ela o tinha visto antes. “Você não deveria ter feito isso, Lily”, ele disse com a voz baixa, mas dura. Ele a olhou com reprovação, como se ela tivesse cometido um erro grave. “Você não sabe o que pode estar do outro lado. Aquelas paredes não são como você pensa.”
Lily ainda estava ofegante, tentando processar o que acabara de acontecer. "Mas... o que era aquilo, Henry? O que estava me puxando?"
Ele hesitou por um momento, sua expressão suavizando, mas a seriedade não desaparecendo. “Não é algo que você queira entender agora. Aquelas paredes... elas são passagens para outras partes, partes onde o monstro não pode chegar, mas também onde ele mantém coisas... coisas que não deveriam existir.”
Lily olhou para a parede, agora sentindo uma aversão profunda por ela. “Eu... eu não sabia que podia fazer isso. Atravessar paredes...”
Henry respirou fundo, olhando para a fogueira por um momento, tentando controlar a raiva que ainda queimava dentro de si. "É... eu deveria ter te ensinado sobre isso antes. Mas você não pode fazer isso sem entender os riscos. Aquele lugar do outro lado não é seguro. Não é o tipo de lugar que você vai querer explorar sozinha, Lily."
Lily baixou a cabeça, envergonhada, mas ele percebeu a tristeza em seus olhos. Ele também sabia o que era sentir-se perdido, sem saber em quem confiar. Mas ele não podia deixá-la se perder, não assim.
Antes que ele pudesse dizer mais, o som das outras crianças brincando interrompeu o momento tenso. Eles haviam escutado o grito e o tumulto, mas agora estavam observando de longe, com curiosidade e um pouco de medo.
Henry percebeu os olhares das crianças. Ele respirou fundo, colocando um sorriso no rosto. Ele não queria que elas se preocupassem mais do que o necessário.
“Ok, ok. Vamos parar com isso por agora. Todos, voltem a brincar! Lily precisa descansar um pouco.” Ele disse, com um tom de voz mais alegre, forçando a leveza de sempre. “Não vamos deixar um pequeno incidente nos atrapalhar, certo?”
As crianças hesitaram, mas logo voltaram à festa, rindo e correndo ao redor da fogueira. Henry puxou Lily para um canto mais afastado, onde ela pudesse respirar um pouco. Ele a olhou nos olhos por um momento, seu sorriso se desfazendo, e ele a abraçou de novo, um gesto que era reconfortante, mas também carregado de uma estranha sensação de proteção.
“Você não está sozinha aqui, Lily. Não mais. Mas, por favor, me escute. Não faça mais isso. Não tente atravessar as paredes sem saber o que está do outro lado.”
Lily sentiu o calor do abraço e fechou os olhos, sentindo-se segura, mas também muito confusa. “Eu não queria... não sabia que podia fazer isso.”
Ele a olhou novamente, os olhos mais suaves agora, como se estivesse tentando digerir o que havia acontecido. “Eu sei. Mas nós precisamos ter cuidado, Lily. Não sabemos tudo sobre esse lugar. E não sabemos até onde ele pode nos levar.”
E com essas palavras, ele a soltou lentamente, dando um passo atrás. O sorriso que ele forçou voltar ao rosto já não parecia tão leve quanto antes, mas ele sabia que, naquele momento, isso era o melhor que poderia fazer.
Lily observou os outros ao redor, as risadas e o brilho da fogueira parecendo, por um breve momento, como algo real, algo que ela poderia tocar. Mas no fundo, sabia que o maior perigo ainda estava por vir.
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Limbo
Acakuma história de terror psicológico sobre uma maldição aviso: todas as imagens que uso são do Pinterest