Riscos

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A tempestade lá fora continuava implacável, os trovões sacudindo o ar pesado dentro da cabana. O silêncio que se seguiu à confissão de Kendall foi quebrado apenas pelo som da chuva martelando o teto de madeira e os galhos balançando sob o vento. Eu mal podia processar suas palavras, minha mente se debatendo entre a descrença e a realidade.

O interior da cabana era simples, mas cada detalhe parecia carregado de histórias antigas. Havia uma lareira apagada no canto, com pedaços de lenha empilhados ao lado, cobertos por uma fina camada de poeira. Uma mesa de madeira gasta, com arranhões profundos e manchas que contavam uma história de anos de uso, dominava o centro da sala. O único ponto de luz vinha da lanterna que Kendall segurava, lançando sombras dançantes nas paredes de madeira, como se o ambiente reagisse à nossa conversa.

— Kendall... — Comecei, mas minha voz falhou. Respirei fundo, tentando ordenar meus pensamentos. — Você... sempre foi apaixonada por mim?

Ela desviou o olhar por um momento, como se estivesse buscando forças para continuar. Quando seus olhos voltaram para mim, estavam cheios de uma intensidade que me fez recuar ligeiramente.

— Sim, Monroe. Eu não espero que você entenda ou retribua. Só precisava que soubesse. — Sua voz estava baixa, quase um sussurro, mas firme.

Eu senti uma mistura de emoções: choque, confusão e algo que não conseguia identificar. Talvez fosse gratidão? Ou medo? Não sabia dizer.

— E o que exatamente espera que eu faça com essa informação? — Perguntei, cruzando os braços.

— Nada. Só quero que confie em mim. Eu vou te ajudar, não importa o que aconteça. — Kendall se levantou, caminhando até uma pequena janela coberta por cortinas rasgadas. Ela espiou para fora, como se verificasse se estávamos seguras.

A chuva diminuía, mas a névoa voltava a se infiltrar entre as árvores, densa e quase sufocante. A cabana parecia ainda menor sob a pressão da floresta ao redor, como se o mundo inteiro estivesse conspirando para nos engolir.

— Precisamos sair daqui ao amanhecer — Ela disse, voltando para a mesa e pegando o livro mais uma vez. — Não podemos perder tempo. Vou entre em contato com meu amigo hoje à noite. Ele pode nos encontrar em um ponto seguro antes de irmos para Devil's Kettle.

Eu olhei para ela, tentando entender suas intenções. Sua determinação era palpável, mas ainda havia algo que não fazia sentido para mim.

— Você acha mesmo que temos uma chance contra Kylie? — Minha voz estava baixa, mas firme.

Kendall ergueu os olhos do livro e me encarou. Seu rosto estava sério, mas havia uma leveza em seu olhar que me surpreendeu.

— Não vou mentir para você, Monroe. Será arriscado, mas se não fizermos nada, ela continuará perseguindo você.

Ela se levantou e foi até uma pequena prateleira próxima à lareira, puxando uma garrafa de vidro com um líquido âmbar. Kendall serviu um pouco em um copo rachado e o ofereceu a mim.

— Você precisa descansar. Amanhã será um dia longo.

Eu aceitei o copo, minhas mãos tremendo ligeiramente enquanto o levava à boca. O líquido era quente e queimava minha garganta, mas me trouxe uma sensação de conforto momentâneo. Enquanto Kendall apagava a lanterna, me deitei em uma velha cama no canto do cômodo, coberta com um cobertor áspero e pesado.

Mas antes que eu conseguisse me acomodar, ouvi passos leves se aproximando. Quando ergui o olhar, Kendall estava diante de mim. A luz fraca da vela iluminava seu rosto ressaltando sua beleza fria e imaculada. Ela era tão linda quanto sangue na neve, um contraste perfeito entre o perigo e a pureza.

𝐌𝐘 𝐒𝐇𝐀𝐃𝐎𝐖 - 𝐊𝐘𝐋𝐈𝐄 𝐉𝐄𝐍𝐍𝐄𝐑 Onde histórias criam vida. Descubra agora