Zephyra
A primeira coisa que Zephyra percebe ao acordar não são os sons, porque o planeta Sem Nome é silencioso, um silêncio denso que pressiona os ouvidos, como se o próprio ar fosse feito de pedras. Tampouco ela sente o calor do sol, que mal consegue atravessar as espessas nuvens pesadas que cobrem o céu. Ela não sabe quando começou a viver, nem como, nem por que. Apenas sabe que sempre esteve ali, naquele vasto mundo implacável.
O planeta, com suas vasta paisagens desoladas e selvas em ruínas, parece ter sido esquecido. Ou, talvez, tenha sido esquecido pelos deuses. Nos olhos de Zephyra, as florestas secas e as ruínas de antigas cidades não são meras cicatrizes de um mundo perdido — são marcas de uma ira divina, de uma fúria imensa que não poupou nada. No horizonte, estruturas quebradas e colunas de pedra se erguem como esqueletos de uma era que não existe mais. Erguidas para um céu que ninguém mais olha, essas ruínas são silenciosas testemunhas de um poder que se foi, destruído pelo próprio ódio dos deuses.
A cada passo que dá, Zephyra sente os ecos de civilizações antigas sussurrando ao vento, como se os fantasmas de um passado distante ainda vivessem ali, presos entre as pedras que foram caindo ao longo dos séculos. Alguns dizem que essas ruínas são apenas vestígios de um mundo apagado pela fúria de Kha'laath. Outros falam que o planeta foi castigado, deixado para definhar por causa de algo que aconteceu com os primordiais.
Zephyra nunca soube de nada disso até ter começado a ver. Desde pequena, as visões a perseguem. Sons, imagens, sensações, todas fragmentadas, como flashes de algo que ela não pode alcançar. Às vezes, ela acorda de um sono inquieto, a sensação de um olhar imenso sobre ela. Olhos cósmicos que a observam com um interesse que a faz se curvar para o chão, sentindo-se como se fosse uma falha.
As imagens são sempre as mesmas: uma deusa, uma figura imponente, com pele negra como o vazio entre as estrelas e olhos que brilham como duas luas distantes. Ela sabe que a deusa é Kha'laath. Mas, ao mesmo tempo, não sabe se é amor ou desprezo o que sente por ela.
Ela começa a se perguntar se sua existência é, de fato, uma falha — ou se foi esquecida de propósito. E por que o nome da deusa, Kha'laath, que ecoa como uma maldição em seus sonhos, ressoa tão fortemente dentro dela? "Deusa do Fim", "Deusa da Ruína" — essas palavras soam em sua mente como se fossem um eco distante de um tribunal divino.
Nos primeiros anos de vida, Zephyra costumava encontrar entidades — seres esqueléticos e translúcidos que vagavam entre as árvores caídas. Eles não falavam, mas a tocavam, como se pudessem ver algo em seu interior. Essas visitas, que vinham de formas que não podiam ser descritas como humanas, a deixavam com um sentimento de medo e curiosidade. Às vezes, ela sentia suavidade nas mãos dessas entidades, uma mão que a conduzia até uma luz fraca, onde ela vislumbrava visões fragmentadas de outros mundos — mundos cheios de cores que ela nunca havia visto, cheios de estrelas pulsantes e seres imortais. Era como se esses guardiões espirituais quisessem mostrar-lhe algo, mas não soubessem o que, ou talvez temessem as repercussões.
Zephyra sempre se perguntava se esses encontros com entidades faziam parte de um testemunho divino ou se eram apenas eco de uma realidade desfeita. No entanto, cada visita a deixava mais próxima de algo imenso e inalcançável. Ela sentia que, de alguma forma, Kha'laath estava ligada a essas presenças, que pareciam sondá-la em silêncio, mas com uma pressão desconfortável.
Entre suas visões, Zephyra também descobriu fragmentos sobre o que foi o universo antes da falha — antes que os deuses antigos se separassem e as castas se quebrassem. Ela sabia que o poder dos deuses não era algo fácil de entender. Castas de seres imortais, descendentes dos primordiais, e os desígnios divinos estavam em algum lugar no fundo da sua mente. Ela sabia que Kha'laath, a deusa da destruição e do abismo, uma vez foi responsável por criar uma parte do universo, mas também desfez tudo, apagando tudo como uma ameaça esquecida. Ela, Zephyra, foi um erro de Kha'laath, uma falha que deveria nunca ter existido.
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ETERNAL GLITCH
FantasyNo vasto e implacável cosmos, as estrelas não são apenas astros; são deuses que governam os destinos de incontáveis civilizações avançadas e religiosamente devotas. No entanto, o equilíbrio eterno está prestes a ser desafiado. Zephyra é uma Primordi...