Prólogo

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A chaleira apitou, tirando Daniela de um devaneio. As mãos, vestidas em luvas de cozinha, ergueram um envelope de 114 x 162 mm. O vapor atingiu o fecho. Vinte segundos depois, com toda a cautela possível, uma pequena lâmina foi passada por baixo da aba do envelope, partindo o lacre amolecido.

Voilà! — disse, retirando a carta.

Salvador, Bahia, 5 de maio de 1993.

Elsa,

Será que jamais percebeu minha indiferença pelos seus sentimentos e aflições? Imagino que tenha contratado um detetive (que deve ter sido caro) para descobrir minha localização e enviar aquela carta patética. Nela você diz que ficou doente e só minha presença poderia te acalmar ou te salvar. Pelo amor de Deus, Elsa, és louca ou está ensaiando para entrar num sanatório? Eu voltar? Acorde! Jamais gostei de você. Fiquei ao seu lado por simples interesse. Suas amigas bem que tentaram te avisar, mas você já estava rendida aos meus galanteios. Usei e abusei, não me arrependo de nada. Fui embora logo que percebi que você não tinha mais nada para oferecer. Há mulheres melhores por aí, sabia? Mais ricas, mais bonitas. E já que tens cabeça de borboleta, aí vai um conselho: pare de gastar os seus últimos centavos com atos inúteis, guarde-os para ter um enterro digno.

Atenciosamente,

Léo Paiva

— Cretino! Desgraçado! — cuspiu Daniela, fechando a carta. — Como ele é capaz de fazer isso com uma mulher doente e desamparada? Elsa está morrendo... Meu Deus, o que farei? Não deveria ter aberto carta alguma, agora sinto-me mais responsável pelo bem-estar de Elsa. Maldição!

— Daniela? — Rafael flagrou-a na cozinha.

Algumas Cartas Não Devem Ser AbertasOnde histórias criam vida. Descubra agora