Houve um silêncio aterrador. E depois a discussão:
— Você abriu a correspondência de outra pessoa?
— Eu precisava saber — disse Daniela. — Não fiz por mal.
Rafael viu a bolsa-carteiro sobre a mesa.
— Você quer que eu perca meu emprego, Daniela?
— Não pense asneiras, Rafael.
— E o que você quer que eu pense?
— Jamais fico com as cartas, sempre as devolvo.
— Eu não entendo.
— Foi tudo por curiosidade, Rafael — explicou ela. — Acabei apegando-me a Elsa. Ninguém jamais saberia. O método é muito simples, basta usar o vapor e...
— Eu sei como funciona — disse ele, aproximando-se.
— Eu só queria saber o que aconteceria com Elsa.
— Quem é Elsa?
Daniela contou tudo e Rafael ouviu atentamente.
— Compreende?
— Daniela e seu coração mole — disse, abraçando-a. — Guarde a carta e vamos pra cama, tenho que entregar umas cartas daqui a pouco.
— O que você faria? — quis saber ela, imóvel.
— Hã?
— E se fosse eu, Rafael?
— Como assim?
— E se eu implorasse para você ir ao hospital? E se eu estivesse morrendo e minha única esperança fosse você?
— Claro. Eu te amo, Daniela!
Ele a beijou.
— Mas Léo não ama Elsa — comentou ela.
— Esqueça isso, por favor. Não podemos fazer nada.
Daniela assentiu, guardando a carta. Fechou a bolsa-carteiro e foi para o quarto tentando esquecer Elsa, mas, antes que pudesse executar o pedido de Rafael, dormiu nos braços do namorado. E se fosse eu, Rafael?, a voz de Daniela ecoou na mente dele.
— Eu faria de tudo para salvá-la — murmurou.
Então, começou a pensar em Elsa Coelho. Quem a salvaria?
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Algumas Cartas Não Devem Ser Abertas
Historia CortaALGUMAS CARTAS NÃO DEVEM SER ABERTAS foi publicado originalmente em uma antologia da Andross Editora. AMOR NAS ENTRELINHAS, organizada por Leandro Schulai, em 2014. Ela acreditava em anjos e, porque acreditava, eles existiam. [Clarice Lispector].