Capítulo I

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NOVA YORK • 12 de fevereiro

Ariella

Sabe quando você tem um dia de cão e a única coisa que você quer fazer é chegar em casa, se jogar na cama e fingir que aquele dia nunca aconteceu? Pois é, hoje parecia um daqueles dias. Eu sentia aquela pontada no estômago, nada me entrava, sem contar os calafrios todas as vezes em que eu pensava na palavra casamento.
Isso mesmo, faltavam três meses para o meu casamento e a única coisa que eu conseguia pensar era que eu não queria pensar. Não queria saber de bolo, de flores, de porcaria de lugares marcados e muito menos do vestido de noiva. Nadica de nada, mas Samantha, minha melhor amiga, tinha uma ideia diferente e fez questão de me arrastar no final do expediente para uma loja de vestidos de noivas no centro da cidade. Uma daquelas que vendem vestidos usados e pra lá de bregas.
- Vamos, Ariella, você tem que provar um vestido! – ela me puxava para dentro da loja.
- Não acho que isso seja uma boa ideia. – respondi, olhando para os lados – E essa loja só tem vestido brega.
- Como eu já disse, é apenas uma experiência, não vai matar ninguém.
- É porque não é você que vai provar.
- Eu provo um também.
- Posso ajudá-las? – a vendedora olhou para nós duas.
- Sim, nós queríamos provar vestidos de noivas.
- Oh, qual das duas vai casar?
- Nós duas. – olhei confusa para Samantha, e eu entendi que ela estava tirando uma com a cara da vendedora.
- É verdade. – completei – Nossos noivos são irmãos e, como os conhecemos no mesmo dia, decidimos casar juntas.
- Oh, mas essa vai ser uma experiência espetacular. – ela bateu as mãos – Fiquem à vontade, sei que os vestidos são de segunda mão, porém são maravilhosos. – ela nos guiou pela loja – O provador fica no final, se precisarem de ajuda é só chamar.
- Muito obrigada. – olhei para Samantha, que segurava o riso – Eu não acredito que você me obrigou a fazer isso.
- Eu não acredito que alguém casou com isso. – ela pegou um vestido cheio de babado, de mangas longas e fechado até o pescoço – Toma. – ela me estendeu o vestido.
- Eu não vou provar isso. – empurrei de volta.
- Ah, Ariella, larga de ser chata. Por favor! Por favor!
- Só se você provar esse. – estendi um vestido pra ela, tomara que caia de babado na saia.
- Eu vou adorar. – Samantha pegou o vestido e jogou o outro pra mim. Ela correu até o provador e entrou em um, enquanto eu entrava em outro. Joguei minha bolsa no canto do provador, tirei meus sapatos e minha roupa. Realmente, a cristã que casou nesse vestido, com certeza, não o viu antes do casamento. Era simplesmente de mau gosto.
- Precisa de ajuda, minha querida? – a vendedora perguntou.
- Só preciso que me ajude com os botões que faltam.
- Esse vestido é um dos mais bonitos da loja. – ela disse, fechando os botões. Imagine o mais feio, pensei – Porém a noiva não teve a sorte de usá-lo.
- Como assim?
- Dias antes do casamento, o noivo fugiu. A mãe dela deixou aqui porque não aguentava mais a filha chorando com ele. – ela terminou – Prontinho!
- Obrigada.
- De nada. – ela saiu do provador.
- Ariella? Está aí?
- Estou.
- Na contagem do três nós saímos.
- Ok.
- Um, dois e três. – pulei para fora do provador, encarando Samantha, que mais parecia um bolo de casamento com tantas camadas.
- Oh, meu Deus! – soltei uma gargalhada – Você está parecendo um bolo.
- Olha para você! – ela me virou para o espelho – Até que não ficou tão mal. Dá até pra te imaginar andando até o altar com essa coisa. – olhei para o reflexo do espelho e, de repente, toda essa ideia de vestido pareceu errada. A gola do pescoço parecia me impedir de respirar e o vestido parecia estar mais apertado, mesmo sendo dois números maior. Eu precisava tirar esse vestido agora.
- Samantha, eu não consigo respirar! – falei, ofegante, tentado abrir os botões.
- O quê?
- Eu não consigo respirar! Tira isso de mim.
- Você só pode estar brincando.
- Samantha, por favor! Eu não... – meus próprios joelhos me traíram e, quando eu vi, estava no chão.
- Se acalma!
- Samantha! Eu não consigo respirar. – parecia que eu tinha corrido uma maratona e não conseguia recuperar o ar, por mais que eu tentasse – Samantha!
- Ok ok! Esse negócio tem um milhão de botões. – ela disse, começando a abrir os botões.
- Mais rápido!
- Eu estou tentando.
- Rasga!
- O quê?
- Rasga! Eu estou queimando! Samantha, eu não... – Samantha rasgou o vestido e eu o tirei até a cintura. Encarando-me no chão, ofegante, eu finalmente admiti algo que eu estava enterrando dentro do meu subconsciente há meses.
- Eu não posso! – abaixei a cabeça.
- É só um vestido horroroso, espere até nós procurarmos o seu.
- Não é isso.
- Espere até você ir à Vera Wang ou à Viviane Westerwood. Tenho certeza de que você não vai ter um ataque.
- Você ainda não entendeu que eu não quero procurar porcaria de vestido nenhum? – olhei para ela. Meus olhos já estavam marejados e Samantha me encarava assustada – Sam, não dá! Faz um tempo que eu sei disso. Se duvidar, faz um tempo que você também sabe. Eu não posso, eu não...
- Ei, você não me deve explicação nenhuma. – ela passou a mão por minhas costas – Eu vou estar do seu lado em qualquer decisão que você tomar. Se você não está feliz, pra que continuar?
- Obrigada por entender.
- Eu entendo, mas sua família... Não vou nem falar sobre sua mãe ou sobre o seu noivinho querido. Esses dois não vão, nem a pau. Ariella, eu pensei que era isso que você queria.
- E você acha que eu também não pensei?
- O que você vai fazer agora?
- Tenho que contar para Dereck. – me levantei – Eu não posso continuar com isso.
- Eu estou orgulhosa de você. – ela me abraçou – Finalmente você está fazendo alguma coisa.
- Fazendo alguma coisa? Como assim?
- Ariella, você passou sua vida inteira deixando que os outros dissessem o que você deveria fazer porque era a solução mais fácil. Mas agora você está finalmente fazendo alguma coisa sobre a sua vida.
- Eu só... – tirei o vestido e comecei a colocar minha roupa.
- Queria trazer seu irmão de volta pra casa, eu sei. – Samantha começou a se vestir também. – Você não pode viver sua vida baseada em algo que seu irmão fez há uns dois séculos atrás. Na vida, shit happens. Você não pode esperar que tudo seja um conto de fadas onde nada de ruim acontece. Vai acontecer muita merda e você vai ter que passar por isso e dar a volta por cima.
- O que importa não é quantas vezes você cai, e sim quantas vezes você levanta. – disse, pegando minha bolsa.
- Sabia que te dar aquele quadro ia adiantar de muita coisa. – ela disse, passando o braço por meus ombros.
- Minha mãe não vai gostar nada disso.
- Já tem um tempo que eu quero te dizer e não disse porque te amo muito, mas sua mãe controla sua vida como se fosse a vida dela. – Samantha abriu a porta, esperando que eu passasse – A única coisa que ela quer é que você saia de Nova York e viva naquele fim de mundo que é Connecticut.
- Não vamos esquecer de: virar uma daquelas Barbies que vivem em função do marido. – respondi, fazendo sinal para o táxi.
- Já está mais do que na hora de você tomar conta da sua própria vida, fazer as coisas pra sua felicidade, não pra dos outros.
- Eu pensei que, vindo pra Nova York, tudo ia mudar, mas nada mudou.
- Claro que mudou, você mudou. – o táxi parou ao meu lado – Se você quiser, pode vir passar um tempo comigo. Você sempre será bem-vinda.
- Obrigada, Sam. – abracei-a – Você é uma das melhores coisas que aconteceram comigo.
- Eu sei. – ela me segurou pelos ombros – Agora vai lá, garota. Pega as rédeas da sua vida outra vez.

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