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∮ Emma Niamh Smith ∮

Cada desenho que se encontra nas paredes do meu novo quarto, antigo sótão, tem uma história por trás. É como se eu criasse um Universo alternativo e dentro desse Universo cada desenho tem a sua vida. Alguns encontram o seu amor e outros não. Por exemplo, aquele último homem sem cara que desenhei tinha uma história intensa. Ele tinha uma vida perfeita aos olhos de muitos. Um bom trabalho, uma ótima família, sem grandes problemas em casa, etc. Mas, certa altura meteu-se em apostas. Perdeu tudo. A esposa e o filho morreram num acidente de carro por causa do desespero dele. No final sobrou só ele. Aí sim, aí é que perdeu tudo. Já não era ninguém, já não tinha identidade. Já não tinham como o reconhecer. Por isso mesmo, perdeu a face.

As pessoas dizem que somos aquilo que comemos. Eu cá acho que somos a arte que fazemos. Neste meu caso, eu sou os desenhos que faço. No fundo, eu sou aquele homem. Já ninguém me reconhece. Nem eu própria.

"Emma.. Anda almoçar." A nova empregada, Nicole, chama-me do outro lado da porta com a sua voz doce interrompendo os meus pensamentos.

O meu padrinho contratou a Nicole pois a sua amada namorada lhe disse que queria alguém para trabalhar em casa e não gostava do trabalho da nossa querida empregada, Alice. Alice não era má empregada, já não era nova e não tinha tanta rapidez e eficácia como outra empregada qualquer mais nova poderia ter. Mas o problema não era esse, o problema foi que tinha sido a madrinha a contratar Alice e ela não lidava bem com a chegada da namorada do meu padrinho nem gostava dela. Tal como eu. Mas nem foi mal de todo contratar a Nicole, apesar de ter mais confiança com a Alice eu até que não desgostei da Nicole. Dá-me espaço e é simpática.

"Emma. Estás aí?" Desta vez bate na porta para me chamar mais à atenção

"Sim... Sim estou." Murmurei. "Já desço." Sorri, esquecendo-me que ninguém me estava a ver. Por essa mesma razão, bati com a minha própria mão na minha testa com certa força, o que me fez murmurar um 'ai' bem audível.

"Está tudo bem?" A voz de Nicole parecia de certa forma preocupada. "Bem, despacha-te e anda almoçar."

Calcei as minhas pantufas com duas renas felizes, arrumei as minhas canetas coloridas e os meus desenhos e desci as pequenas escadas que apenas davam acesso ao meu novo quarto.

Ao passar pelo meu antigo quarto vejo de lá saírem duas gazelas endiabradas a fazer uma corrida para ver qual das duas chegava mais depressa à mesa. No caminho uma delas esbarra-se contra mim atirando-me ao chão.

"Vê lá por onde andas, seu otário!" gritei com o miúdo de 7 anos.

"Cala-te atória!" Edward disse enquanto corria. Atória? A sério?! Coitado, vamos deixar lá de implicar com o vocabulário de rato da criancinha.

Mal acabo de descer as escadas observo ao fundo as duas gazelas endiabradas, a loira-falsa-que-quer-gamar-o-padrinho, e o otário do meu padrinho, sentados numa mesa de jantar diferente e mais comprida do que a que estava no seu lugar anteriormente.

"Que mesa é esta?" Pergunto ao meu padrinho enquanto me sento no meu lugar habitual.

"A Francesca achou que iriamos precisar de uma mesa maior para quando realizássemos festas cá em casa."

Decidi não dizer mais nada. Não iria valer a pena. Podia comentar o facto dele ter dito que iríamos fazer várias festas cá em casa mas, para quê? Iria ser em vão pela certa.

Olhei bem para a mesa nova e tenho que admitir que até nem era assim tão má. Tinha um tampo de vidro perfeitamente polido nos cantos. O vidro encontrava-se tão limpo e reluzente que era possível ver através dele como se não estivesse nenhum objeto entre os meus olhos e o objeto que queria examinar. As pernas da mesa eram num tom dourado e tinham um toque gótico. Ou lá como se chama. Era bonita e combinava, de facto, com o resto.

"Ah! Puto, é otário, não atório." Disse a Edward, num tom nem um pouco sarcástico ou maldoso.

"Quem disse? Eu quero dizer atório então digo atório!! Não mandas em mim!!!" Diz-me sério e arrogante.

"Emma!" O meu padrinho repreende-me sem razão alguma. "O que é que andaste a dizer?"

"Posso almoçar contigo?" Desvio a minha atenção para a Nicole que se surpreende com a minha pergunta.

"Hum... Claro!" Sorri-me. "Acho eu..." Murmura duvidosa enquanto olha para o meu padrinho na esperança que a repreendesse.

"Obrigada!" Peguei no meu prato, copo e talheres e dirigi-me à cozinha antes que alguém dissesse mais alguma coisa.

Agora que olho para o que tem no meu prato é que reparo que é uma comida italiana pela certa. Tinha massa e mais umas coisas quaisquer. Comida italiana sempre foi a comida preferida da família da minha mãe por isso desde criança que estou habituada a comê-la e adoro. Sorri de leve para o prato mas lembrei-me que não tenho fome e logo o pequeno sorriso desapareceu.

"Sabes, o teu padrinho preocupa-se contigo." A Nicole, surpreende-me sentando-se à minha frente.

"Se preocupa, não parece." Disse rudemente.

"Ele apenas não sabe expressá-lo e não te compreende, Niamh." Olhei finalmente para ela quando pronunciou o meu segundo nome e reparei que tinha um pequeno sorriso nos seus lábios.

∮∮∮∮∮∮

Agora são aproximadamente 21h e acabei de decidir que iria ao Burger King jantar. O meu padrinho e a Francesca foram jantar fora e não me apetece ficar aqui com as gazelas, mesmo com a Nicole cá.

"Nicole, vou jantar fora." Procurei a única pessoa nesta casa que gosto minimamente.

"Está bem, mas tenta não chegar muito tarde." Disse à saída da lavandaria. "Tens dinheiro?" Assenti. "Não precisas de nada? Boleia.. Não precisas que chame um taxi?" Olhou-me atentamente.

"Tenho tudo Nicole, não te preocupes." sorri-lhe.

"Vai lá. Tem cuidado!! Qualquer coisa liga-me! Não chegues muito tarde!" Deu-me um sorriso um pouco preocupado.

Peguei num casaco de cabedal preto e na minha bolsa que continha tudo o que iria precisar e olhei para Nicole e murmurei-lhe um 'Até logo' ao qual ela me respondeu um dos seus sorrisos doces habituais.

Mal abri a porta o vento misturado com o frio habitual da noite me fizeram relembrar porque é que tenho sempre, ou quase sempre, um casaco comigo.

Os meus cabelos brancos voavam, por vezes, para a frente dos meus olhos o que me dificultava um pouco a visão e por isso resolvi apanhar-lo num rabo-de-cavalo que acabou por ficar desajeitado, mas que se lixe. Apesar de ter dito à Nicole e a mim mesma que ia ao Burger King, a verdade é que não tenho lá muita fome. Acho que vou ao bar onde a mãe da minha antiga vizinha trabalhava. Para além de ficar mais perto, servem meios hamburgers. O que deve chegar.

Com certa dificuldade, acendo um cigarro e coloco os meus auscultadores no volume máximo e deixo-me levar pela música. Eu adoro observar o luar enquanto estou a ouvir músicas. Se eu pudesse passava todo o tempo a olhar para a Lua. Se me perguntassem quem é a minha crush, eu definitivamente diria que é a Lua. Não sei explicar. É tão sofisticada e... sei lá. Chama-me à atenção e prende-me tanto que nem explicar sei. Não tem a sua própria luminosidade, mas mesmo assim brilha do que mais ninguém.

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Hola!

Faz um favor a ti próprio: vai ver a Lua. Não observes, vê. Se a conseguires ver vais te sentir melhor do que nunca. Acredita em mim e na Emma Niamh Smith.

Adiós,

xLostGurlxx

IntoxicatedOnde histórias criam vida. Descubra agora