Dia Seguinte.

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São Paulo, domingo, dia 6.

Abriu os olhos. Estava novinho em folha. Carlos teve o que queria, uma noite gloriosa de um sono leve e tranquilo que o curou de toda dor física e emocional. Ele permaneceu na cama por mais alguns segundos, apenas olhando para o teto aveludado, de cor vinho, que ele tanto amava. O seu quarto era relativamente grande, com móveis caros. Seus pais eram ricos. Coisa que Carlos jamais deu importância. Ele adorava coisas simples. Ter um quarto como esse, com uma teve gigante no pé da cama de casal, vídeo game da última geração, um computador do lado esquerdo do aposento, com sua escrivaninha, onde fazia suas lições, sua estante repleta de livros no lado direito e um banheiro próximo à porta que dá para o corredor, o fazia se sentir em outro mundo. Um completo estranho. De que adianta ter tudo isso e não ter paz?

Lembrou-se da fome. Havia chegado ontem à noite e nem comera nada. Deu um salto da cama e desceu para a cozinha. Abriu a geladeira, estava farta, como de costume. Pegou requeijão, queijo branco, suco e peito de peru. Sentou-se vagarosamente à mesa e comeu. Após alimentar-se, Carlos pegou o calendário e verificou que estava no dia 6 de Setembro. A festa em que participou, principal motivo de ter fugido, foi no dia 31 de agosto. Havia passado 5 dias naquele beco, dormindo...

Ele tentou colocar as ideias no lugar. Desde que tinha 6 anos, Carlos vem tendo alguns sonhos, ou "visões", como ele costuma chamar. No começo, era algo leve, como um garotinho pequeno velejando sozinho num mar imenso. Ou uma garotinha pegando uma maçã de uma árvore. Algo desse gênero. Conforme foi crescendo, as coisas começaram a complicar...

Primeiro ele começou a ter medo dessas visões, elas ficavam cada vez mais longas e assustadoras. Depois, elas apareciam do nada, o que o deixava em uma espécie de coma. Houve uma certa vez, quando tinha 14 anos, Carlos estava na escola, aula de educação física, estava numa partida de vôlei, bem no momento de ir pegar a bola, o tempo pareceu desacelerar de tal maneira que o deixou tonto. Ele ouviu alguns gritos e simplesmente apagou. Acordou uma semana depois, numa cama hospitalar, com seus pais olhando aliviados para o filho. O que mais o intriga é o fato de não precisar comer, ir ao banheiro ou qualquer outra coisa quando entra em coma. Ele apenas sonha. Sonhos desconexos e confusos, que nada trazem de bom.

Porém, Algo está diferente, ultimamente, Ele tem sonhado com apenas uma pessoa. Uma garota. A garota do sonho passado. Ela é sempre a protagonista. Sempre num lugar novo, fugindo das mesmas pessoas. Carlos queria poder falar com ela pessoalmente. Tentar entender tudo isso. Ele se sente tão sozinho e confuso... As pessoas nunca entendem. Ninguém nunca está perto o suficiente para entender o que é ser uma aberração.

Queria que tudo passasse. Foi então, que pela milésima vez, ele adormeceu novamente, só acordaria no dia seguinte, ou não...

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