"Barranco dos Desesperados"

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São Paulo,  Quarta,  dia 9.

O caminho para a escola estava frio e chuvoso. Eram 6 da manhã. Sua mãe insistia em levá-lo,  Mas Carlos recusava de todos os modos. Gostava de andar,  pegar transporte público e tudo o mais. Ele andava tranquilamente,  com o fone de ouvido tocando as melhores músicas que haviam na terra!  Ele tinha um gosto peculiar para os sons. Adorava toques alternativos. Fugia do padrão, como sempre.

Enquanto andava,  visava o chão molhado. Seus sapatos,  amarelos,  tipo mostarda,  constratavam com o azul cinzento da rua. Ele estava neutro hoje. Não acordou com sentimentos.  Andou mais cinco minutos. Pronto. Estava no portão da escola.

A escola era um gigante de concreto. Ela se alongava de forma majestosa,  mostrando autoridade. Suas cores,  pobres em vivacidade,  eram Vermelha,  cinza e azul. Um tom borrado de tristeza. Carlos se perguntava se a escola não era um lugar bem apropriado para ele,  já que era neutra,  sem sentimento,  majestosa. " Sei que o último adjetivo não combina comigo. Combina com meus pais. ",  Ele pensou amargurado.
Os alunos. Era obrigatório o uso do uniforme nesta instituição de ensino. Era azul e branco,  bem confortável,  como que para ironizar a aparência gótica e ao mesmo tempo morta da escola.  A entrada ficava numa rua em declive. Carlos costumava chamar essa rua de " Barranco dos desesperados". Por quê? Ora... Você já irá descobrir...

Eram 6:55. O portão,  uma placa de metal cinza,  abriu com o primeiro sinal soando em todo o bairro. Vários alunos,  todos unifmorziados,  se locomoveram,  iriam adentrar o prédio.  Carlos optou por esperar um pouco,  queria ver uma das poucas cenas que o divertiriam nesta manhã. Ele se acomodou ao lado do portão escancarado. Dali,  Ele podia ver o corredor que levava ao pátio,  bastava os alunos entrarem,  entregarem a carteirinha para o inspetor de aluno e passar a catraca. 

O pessoal começava a chegar. Chegavam em grupos,  coisa típica dessa escola. Se havia uma União aqui,  Carlos não conseguia enxergar.

O tempo avançou,  6:59. Estava para acontecer. Carlos ouviu o ônibus parando na rua paralela ao " Barranco dos Desesperados",  o inspetor começou a gritar. Um grito que sufocava qualquer um:

- 50 segundos!

Os alunos desciam. Eram pingos de azul descendo uma rua cinza.

- 40 segundos!

Muitos cumprimentavam Carlos,  ele foi popular no primeiro ano,  quando gostava de socializar.

- 35 segundos!

Tudo mudou no segundo ano. Ele se viu o mais sozinho possível. Não era feliz mudando de grupo em grupo. Então parou de socializar. Respondia por educação.

- Corre pessoal!  Vocês vão ficar pra fora!  20 segundos!!!

Os alunos apareciam em abundância agora. Os que ficavam fumando,  apagavam seus cigarros. Os namorados decidiam se iriam cabular ou não,  e os atrasados andavam rápido.

Carlos esperava pelo próximo grito. Ele veio mais rápido do que esperava:

- 10 segundos!!!

Pronto. Agora,  Os pingos de azul que eram os alunos na rua cinzenta alguns segundos atrás,  se transformou em uma onda. Vários alunos desciam desesperados agora. Empurrando uns aos outros,  como animais loucos e famintos, correndo para a comida. Agora,  eles diziam apenas um " Oi,  Carlito." Ou um " Olá".  Carlos maneava a cabeça. Sorria com gosto. Ele viu várias meninas sendo machucadas pelas catracas. Malditas catracas. Os garotos riam. Malditos.

- 5 segundos!

Agora a onda diminuía. Pessoas gritavam: " Segura! Segura! ".  Carlos viu um garoto cair. Sentiu um pouco de dó. O tempo passou mais rápido. Ele adentrou ao prédio antes do inspetor anunciar :

- Acabou o tempo!  Adeus pra vocês.

Ele fechava a porta com força. Vários alunos se atracavam nela,  querendo entrar. Alguns escapuliam pra dentro. Muitos ficavam lá fora. A porta fechou. Carlos entregou a carteirinha e desceu para a sala. Sim,  as salas ficavam no nível mais baixo da escola,  como que para representar nossa inferioridade.

Mais um dia de aula.

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