Capítulo 4

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Passei a noite em claro,me revirando na cama até que desisti de tentar dormir.A vontade de fugir de casa me dominava.Eu sentia medo de mim mesma. Só de pensar que meus pais poderiam me colocar no colégio interno se me descobrissem,me dava calafrios;por outro lado,sabia que eu poderia ser eu de verdade,não mas uma boneca.
Abri minha gaveta do criado-mudo e peguei uma cartela de comprimidos,eu era hipocondríaca aos dezessete anos,tomei uma porção deles.Junto à cartela,havia uma lâmina.Sim.Eu era uma suicida,os cortes me davam a sensação de alívio,sentir a dor física era melhor do que sentir a dor emocional.Uma "quase substituição". Cortei meus pulsos.Dessa vez,o alívio não veio,cortei-me novamente...Mas não estava funcionando. Pensei "Fuja Ana".Era o que vinha em minha mente. Eram 23:23 a hora em que eu tomei a decisão que mudou a minha vida.Conferi se Mamãe já estava dormindo e se Serena já tinha ido embora.Papai estava de plantão no hospital onde trabalhava,então,tudo ficaria bem mais fácil pra mim.Abri o armário e peguei todas as minhas camisetas de banda,minhas calças jeans e meus tênis, joguei dentro da mochila com estampa do AC-DC.Agarrei meus comprimidos e uma lâmina de bisturi que eu tinha conseguido em um estágio.Vesti-me com calça rasgadinha,minha blusinha dos Rolling Stones e meu All Star vermelho de cano baixo,fiz um coque bem desleixado e taquei um batom vermelho super vibrante.Fui até a cozinha, peguei dois pacotes de bolachas recheadas e todas as gomas de mascar que cabiam em minhas mãos, espalhei-as pelos bolsos da calça e da mochila.Voltei pro quarto e coloquei minhas lentes de contato, não usava porque Mamãe achava que de óculos parecia intelectual.
  Não escrevi cartas de consideração,não queria deixar meus passos no chão; em vez disso,peguei a foto do porta-retrato onde estavam eu,Mamãe e Papai no dia da formatura da oitava série, apenas para que lembrasse deles de vez em quando, de Maurício, não levei nenhuma lembrança.
  Fui até a sala, e virei a chave da porta, não pulei janela nem fiz corda de lençóis, ninguém iria me reconhecer com aquelas roupas, sendo assim, fui pelo elevador mesmo.Naquela hora,eu já estava me sentindo quase livre. Nascia em mim uma nova Ana Paula.

NatashaOnde histórias criam vida. Descubra agora