Capítulo Um: Apresentações

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É incrível como a gente pensa em cada pessoa que achamos importantes pra nós como amigos, parentes, família... Nós pensamos que queremos que cada um esteja bem, que cada um fique bem, que nós fiquemos "para sempre" com eles; mas eu digo uma coisa: Nada é para sempre.

E minhas amigas me chamam de insensível, chata, pessimista, [...]. Eu prefiro o termo "realista"; porque já perdi tantas pessoas importantes pra mim e já me deparei com essas mesmas situações de achar fielmente que vai ser pra sempre, ou por um longo tempo.

Na verdade, minhas amigas são sim, claro, muito importantes pra mim e óbvio que não quero que nada de ruim aconteça à elas; mas eu, ao contrário delas, tenho esse pensamento real e desesperador de que um dia tudo aquilo poderá acabar. Minha mente viaja nesses pensamentos e tento ao máximo me distrair. Uma atividade, um livro, um filme, um jogo... E quando penso por um segundo que estou livre desses pensamentos e paro de tentar me distrair, eles voltam, e mais fortes, quase me deixando louca de insatisfação.

Queria poder voltar aos momentos bons que tive com minha família há alguns anos atrás, eles eram tudo pra mim...

Ah! Que distração minha, fiquei tão empolgada em escrever no meu diário novo e nem me apresentei; bom, eu sou Melissa Tothyenn e moro em Pitsburg, uma cidadezinha na Flórida. Aqui é bem aconchegante, com todas essas árvores e estradas de terra que acabam com o meu carro. Gosto de fazer trilhas em florestas, aqui tem muitas delas. Tenho 17 anos, cabelos cacheados e castanhos, olhos verde-mel, pele tão clara que dá até agonia, já fiz de tudo: bronzeamento artificial, creme pra bronzear, água de cenoura, sol de rachar até as cinco da tarde... E o resultado: vermelha que nem um camarão.

Meu namorado, Erick, diz que eu sou maluca, mas eu levo isso como um tratamento carinhoso. Ele já até quis me levar em um psicólogo dizendo que era pro meu bem, falei logo que quem iria ter que pagar a consulta era ele e que provavelmente ia ser à toa, porque minha avó frequentava uma psicóloga no centro de Nova Jersey e isso não impediu ela de se matar. Logo ele mudou de ideia; não pelo dinheiro, mas por saber que esses ambientes me trazem memórias ruins. Mas agradeci por se preocupar por mim, e, cá entre nós: Ele fica muito fofo quando está preocupado comigo.

Gosto de pensar, às vezes, que vai ficar tudo bem, que está tudo bem, e que vai demorar para mais coisas ruins acontecerem. Mas, como sempre, os pensamentos não me deixam "curtir" muito.

A única família que tenho é a minha irmã, Angela. Ela mora comigo e tem 19 anos; ela trabalha e eu estudo. Faço meio dia na lanchonete do Bobye no final da rua Averest, sabe, pra não ficar sem dinheiro nenhum. E também estou juntando uma quantia para pagar minha faculdade (se eu não passar no teste da universidade, mas não sei bem se quero). Não somos muito parecidas, ela tem os cabelos loiros e lisos, olhos castanhos e a pele dela é capaz de ser mais bronzeada do que a minha. E o namorado dela é um chato; pra compensar ele é bonitinho, mas vive pegando no pé dela. Ele trabalha em uma loja de concerto de carros e está fazendo um curso de mecânica na Oeste da cidade. Ele é bom.

Minhas amigas são: Anne, Samantha, Thifany e Barbara; corrigindo: Anny, Sam, Thify e Babie (as vezes a gente chama ela de "Barbie"). E eu sou a Mell. Prefiro "Mellissa", mas precisava ter um apelido, então...

Sei falar português porque meu pai era brasileiro, morava lá, mas nasceu aqui. Aí eu comecei a ficar interessada em aprender, foi só questão de prática e hoje mando muito bem.

Sei que com 17 anos não parece muito adequado pra minha idade ter um diário, mas essa é só mais uma das coisas que me distraem, e sem falar que eu adoro ler e escrever também. Me sinto livre, mais disposta a dizer o que penso, a contar sobre cada coisa que acontece comigo. Eu gosto tanto de escrever que já até pensei em ser escritora, mas meu pai dizia que isso é coisa de quem não tem o que fazer; e o pior é que ele tinha razão. Só escrevo quando estou entediada... Mas gosto.

Não gosto de falar muito disso; mas, às vezes preciso desabafar. Perdi minha família em um acidente de carro. Estávamos indo passar as férias na casa da vovó, que é um chalé no interior do Estado (não a minha avó que cometeu suicídio, a outra, que é mãe do meu pai), eu tinha 12 anos, posso me lembrar como se tivesse sido óntem; tínhamos parado em um posto de gasolina, que também era uma lanchonete, então comemos alguma coisa e eu fui ao banheiro. Quando voltei, o carro estava lá, todo amassado; um caminhoneiro desesperado e as poucas pessoas que estavam do lado de fora ficaram ali, só assistindo.

Uma mulher me abraçou e eu me senti segura, só por um instante...
Depois disso, minha vida não foi mais a mesma, é óbvio.

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