Brilhantina

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RONY


Acordei como sol da janela do dormitório batendo em meu rosto.

Pisquei os olhos, sonolento. Não queria abrir os olhos.

O que parecia ter começado como um pesadelo na noite anterior terminou como o mais maravilhoso dos sonhos. Eu ainda achava que fora realmente um sonho... Hermione deitada ao meu lado, colada em meu corpo como um gatinho se enrosca no dono. Eu havia ficado observando-a, petrificado com a beleza letal que a vampirização havia trazido ao seu rosto, deixando-o pálido, aguçado e irracionalmente bonito. Mesmo doente, ela era a visão mais linda do Universo.

Eu não fazia ideia do que acontecera comigo momentos antes. Eu simplesmente tinha necessitado beijar Hermione. Havia precisado de seu corpo prensado ao meu como precisava do ar para respirar. Queria afogar todas as angústias, os medos e a dor que haviam me aterrado durante as últimas semanas em seu corpo.

Foi o bom senso que me salvou de fazer algo para o qual ainda não estávamos preparados... do qual provavelmente nos arrependeríamos depois.

Mas foi no momento em que Hermione se aninhou em meus braços e adormeceu, ainda soluçando depois do que havia acontecido, que eu descobri o simples e maravilhoso fato de que minha vida inteira agora era aquela garota ao qual eu estava abraçado.

Abri os olhos, me rendendo ao dia iluminado. Olhei para o corpo magro que havia se enroscado no lençol ao meu lado. Hermione estava se remexendo, mas não havia acordado.

Tirei o lençol que cobria seu rosto para vê-la melhor, e arfei.

Os cabelos...

A cor que eu quase havia esquecido durante a semana havia voltado. Seus cabelos eram outra vez castanhos e ondulados. Seu rosto estava levemente corado.

Eu havia ficado tão preocupado com a saúde de Hermione que não havia percebido as melhoras que aos poucos podia se ver em seu corpo. Agora me lembrava vagamente de que ela estava menos pálida e precisando de menos sangue nos últimos dois dias.

Os olhos dela piscaram, e meu corpo enrijeceu, ansioso. Será que eles também..?

Quando Hermione os abriu, dei de encontro com as esferas achocolatadas que eu conhecia tão bem.

Ela também enrijeceu-se, e corou ao me olhar nos olhos.

Agora toda aquela cena da noite anterior também me subia à cabeça. Era meio constrangedor mesmo.

– Bom dia.. - murmurei, envergonhado.

Ela mexeu um pouco os lábios, indecisa, mas não falou. Quando o fez, um murmúrio rouco e profundo saiu de sua garganta. A semana de vampirização praticamente a fizera perder a prática de falar.

– Bom dia...

Hermione corou mais ainda quando ouviu a própria voz enrouquecida.

Passei as mãos timidamente em suas bochechas coradas.

– Senti falta dessa vermelhidão boba no seu rosto.

Ela me bateu de leve no ombro, tampando o rosto com a outra mão.

– Para... – sua voz era a mesma por trás do eco que sua garganta fazia. Ela parecia ter se recuperado de uma pneumonia brava.

– Que pena que você se curou – ri ao ver sua expressão indignada.

– Como é? – ela franziu o cenho.

– Você ficou linda como vampirizada. E um tantinho mais ousada. Que homem não ia querer uma mulher assim? Ah, desculpa – eu disse ao vê-la mais ruborizada ainda.

– Não respondo pelos meus atos de ontem para trás – ela brincou – eu estava mental e fisicamente incapaz de pensar.

– Aham – inclinei a cabeça, rindo – e você me beijar que nem uma maluca na Sala Precisa não foi nem um tiquinho premeditado, não é?

Ela não respondeu. Olhava ao redor com uma expressão pasma.

– Rony?

– Que foi?

– A gente dormiu...

– Aham...

– Na mesma cama... abraçados... – ela olhou para baixo, e gemeu – tipo, com a mesma roupa de ontem...

– Certo – concordei, confuso. Ela ia dar um chilique de puritanismo justo agora?

– Pombas... o que os outros vão pensar? – Hermione se encolheu, com um olhar perdido de cachorrinho abandonado.

– O que os outros vão pensar é problema deles – acariciei seu braço.

O sorriso que recebi em resposta foi deliciosamente lindo.

– Ah, Rony..?

– O quê?

– Isso faz de mim... ahn... sua namorada?

– Se isso não faz de você minha namorada, não sei o que vai fazer... – arregalei os olhos, indicando a cama com o queixo.

– Sei lá, de repente... posso ser só um passatempo – Hermione falou, a expressão tão séria e preocupada que me surpreendeu. Depois de tudo que passamos, ela ainda tinha dúvidas? Pisquei, chocado.

– Tá certo. Você é um passatempo, então – puxei seu corpo para perto do meu – um passatempo cotidiano e eterno.

Ela arfou quando eu disse a última palavra.

A porta do dormitório se abriu com um estrondo. O colchão rangeu quando Hermione e eu pulamos, assustados.

Gina parecia satisfeita ao nos ver ali. Harry e Neville se entreolhavam, enquanto Luna parecia etereamente distraída.

– Olha só o que eu encontrei na sua cama, Harry – Gina gargalhava – eu sabia que você tinha esquecido alguma coisa aqui... mas achei que era o cachecol da Grifinória, e não os seus melhores amigos.

Hermione olhou para Gina de um jeito que lembrava facilmente a Hermione vampirizada.

– Cai fora, Gina – bufei, saltando da cama com Hermione.

Luna olhava de mim para Hermione e de Hermione para Neville com uma expressão confusa e indecisa. Hermione me cutucou ao perceber isso, me olhando de esguelha com um sorriso conspiratório no rosto.

– O que foi feito, sabe... – comentei, tentando descontrair o silêncio que havia se instalado ali – com os... corpos?

– Churrasquinho – Gina respondeu, também observando o basquete que Luna fazia com os olhos. Do jeito que ela olhava para Neville e Neville olhava para ela, fosse o que fosse, a coisa era séria – tá tudo bem, Luna?

Tudo aconteceu tão rápido que ficamos um tempinho paralisados. Luna se virou para Neville, o abraçou, tascou-lhe um beijo sufocante na boca e saiu correndo porta afora.

Neville ficou paralisado também, só que não era de surpresa.

– Ahn, onde estávamos? – Gina disse, enquanto olhava Neville correr para fora com um berro de "volta aqui, Luna!".

– Churrasco de Comensal.

– Ah, tá – Harry intercedeu – bom, demos um jeito no estrago que os vampirizados fizeram no saguão principal... e todos os preparativos para a Cerimônia já foram feitos. Pediram para chamar vocês para se prepararem para descer – ele olhou outra vez para a cama com uma cara tonta de quem queria fazer um comentário malicioso e não podia por causa da amizade.

– Bom, então vamos. Só, ahn, tomar um banho e já descemos, não é, Hermione?

– Ah, tá – Hermione sorriu, apertando minha mão – até por que eu quero ir atrás da Luna para perguntar o que foi aquilo.

Todos nós rimos enquanto saíamos do dormitório. Enlacei Hermione pela cintura, encostando a cabeça em sua testa.

Dali em diante, eu só ficaria longe de Hermione se me separassem dela... e isso só aconteceria se passassem por cima do meu cadáver ruivo.



Sangue e Alma (A Saga da Lontra) - Temporada IOnde histórias criam vida. Descubra agora