Sonhos 2/2

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Já deve ser umas quatro da manhã e eu sou uma das últimas pessoas decadentes que ainda estão no bar.

Luce... não consigo tirar as palavras dela da cabeça. Não por acreditar nisso, não acredito, mas:  "Para que uma coisa se torne real você só precisa acreditar nela." Ora, será que essa coisa de acreditar parece inútil só pra mim, Zé?
Mas tudo bem, tenho que admitir que essa afirmação me dá um pouco de medo. Pois ao dizer isso também estão dizendo que a culpa será única e inteiramente sua se alguma coisa der errado, aí dirão "você que não acreditou o suficiente".

Isso é ridículo. Oitenta por cento das coisas depende do quanto você se dedica à elas, e os outros vinte por cento se dividem entre a boa vontade das outras pessoas e a sua sorte, amigo. Sendo assim, acho que chegamos a conclusão de que devemos acreditar em nós mesmos. Meu Deus, isso me parece mais errado ainda.


— ... Senhor! Hora de fechar, vá para casa. – a voz do garçom interrompe meu devaneio.
— Não tenho casa.
— Ah, por favor... eu não me importo, ta' legal?! Passei a noite toda vendo vômito e servindo bebida pra umas pessoas desesperadas, outros que só queriam foder e alguns alcóolatras, pra ganhar um salário que mal dá para pagar meu aluguel ou essa maldita camisa que tive que comprar. Então, desculpe, mas estou pouco me fodendo para onde o senhor vai.


Fiquei parado olhando-o. Ele falou um pouco rápido e á essa hora já estava tudo girando. Não sou mais o mesmo de antes, estou velho demais até para tomar um porre.


— Sinto muito por você, rapaz. – deixei-lhe uma gorjeta de 150U$, tudo o que tinha em meu bolso. Me levantei e fui em direção à porta.

Queria dizer a ele que sim, o mundo é uma droga e as pessoas são nojentas. Queria dizer que ele não precisa desse emprego de merda, que deveria chutar o balde, mandar todos à merda e fazer o que o fizesse feliz, porque para ele ainda há tempo. Mas não consegui ordenar as palavras e mesmo se conseguisse elas sairiam lentas e descuidadas demais. De qualquer forma, eu seria só mais um bêbado filho da puta falando o que ele devia fazer.
Queria eu, ainda ser jovem assim. Mas sei lá, acredito que tudo o que fiz, se pudesse voltar atrás, faria igual novamente. Uma espécie de efeito borboleta num ciclo vicioso, entende? E ainda estaria aqui escrevendo para você... ou para mim, não decidi ainda. Quem é você mesmo, Zé?

— Não preciso do seu dinheiro. - ele respondeu.

— Não preciso de uma casa. – sorri, acendi um cigarro e saí.

Relatos de Uma Mente ConfusaOnde histórias criam vida. Descubra agora