Acordei. De um lado, um caninho com um líquido amarelo que entrava em minha veia; do
outro, um com sangue. Na boca, um acoplado, aqueles aparelhinhos de respiração artificial
que já conhecia do Fantástico. Muito eficiente, fechava a boca com a língua, mesmo assim o
ar entrava. Tinha uma sanfoninha pendurada que enchia e esvaziava. Assoprava e ela nem se
tocava, enchia e esvaziava...
Fiquei curtindo o bicho: como é gostoso respirar sem fazer força, enchia e esvaziava... Passei
a reparar no ambiente. Era uma sala pequena, com luz fria. Não sabia se era dia ou noite,
porque não havia janelas, só paredes brancas. À minha esquerda, um leito com um cara em
cima. Também tinha uma sanfoninha. À direita, dois leitos. Tentei me erguer, mas não
consegui.
É mesmo, não mexia nada. Lembrei-me do acidente, só podia estar num hospital. "O que
aconteceu comigo? Será que fui operado? Será que é por causa da bebida que estou assim?
Algum trauma devido à batida na cabeça?" Ouvi vozes e percebi que havia gente na sala.
Comecei a balançar o pescoço pra chamar a atenção. Veio uma enfermeira e perguntou se tava
tudo bem.
- Eh, eh, eh...
Perguntou se eu queria tirar o aparelho. Fiz um gesto afirmativo, ela pediu pra esperar um
pouco e saiu. Nunca sentira tanta falta da minha voz. Precisava saber se era sério o que tinha
acontecido, queria falar, ouvir, e naquela sala não havia nada. A enfermeira voltou com mais
dois caras. Perguntaram-me se eu seria capaz de respirar sem a sanfoninha. Era óbvio que
podia, afinal de contas eu tava absolutamente acordado. Minha boca livre, perguntei o que
havia acontecido. Responderam que eu fora operado e que estava tudo bem.
- Como assim?
- Mantenha-se calmo e com um pouco de paciência, que você vai pra casa logo. Tua mãe
teve aqui, mas voltou pra São Paulo, porque já é tarde.
- Que horas são?
- Três da manhã.
- Tudo isso? Mas o que aconteceu? Por que acordei só agora? Quebrei alguma coisa? Por
que é que não me mexo?
- Calma, amanhã cedo virá o médico que te operou, e você vai saber de tudo. Nós estamos
aqui pra te ajudar, tente dormir e descansar, que já, já, você fica bom.
Acordei com uma pessoa cantando. Era uma enfermeira. Estava vindo direto pra mim, como se
me conhecesse há muito tempo.
- E aí, Marcelo, tudo bem? Eu sou a Elma. Aguenta um pouco que nós vamos te dar um banho.
Ela era baixinha, gordinha, dessas com uma cara simpaticíssima. Não entendi direito aquele
banho. Será que vão me colocar num chuveiro? Mas como? Se eu não me mexo. Imagino que
não conseguiria ficar em pé. Podem me pôr numa banheira, mas com esses caninhos vai ser