Férias

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Depois de tudo o que passei com Mariana, decidi sair do meu casulo e ir a um dos meus lugares favoritos. Não deixaria de ir por causa do que aconteceu; apenas não poderia frequentar o mesmo local. Algumas horas depois, cheguei à praia do Leme. Era um dia comum, e eu estava no meu primeiro dia de descanso do trabalho, após um mês de absoluto repouso. Em breve, começaria o meu estágio, tão almejado, indicado pela faculdade. Depois disso, seria apenas dar adeus à minha rotina diária com John e Pedro. Precisava aproveitar.Minutos depois, sentei-me em um dos bancos do calçadão e avistei uma garota. Aparentava ter seus vinte e poucos anos, cabelos castanhos e cacheados, olhos cor-de-mel, estatura mediana. Usava fones de ouvido e parecia se divertir com a música que estava tão alta que até eu, que não estava muito perto, conseguia escutar. Reconheci a música: "Buzzcut Season". Ela parecia apreciar a vista.

Meu pé não conseguia ficar parado ao ouvir aquela música, uma das minhas preferidas da Lorde. Ela percebeu isso, lançando-me vários olhares descontraídos. Ao notar que ela estava me observando, senti-me constrangido. Tentei disfarçar, olhando para outra direção, quando subitamente percebi a presença de alguém ao meu lado, ouvindo um "oi".

Ela havia se aproximado para falar comigo. Comigo! Não tive outra reação senão responder com um simples "oi" também. Ela tinha uma aparência exótica, que combinava com seu jeito descontraído e, julgo eu, meio fora dos padrões, o que achei ótimo. Estava cansado de rótulos e afins. Precisava de pessoas que não se importassem com isso.De certa forma, gostei dela. Ela puxava cada vez mais assunto e, em dado momento, fez-me uma proposta inusitada: "Vou te fazer uma proposta louca, e você vai ter que aceitar, okay?" Estendeu a mão para que eu apertasse, sorrindo, aguardando minha resposta."Okay!" - concordei.

"A partir de hoje, eu sou sua nova amiga. Prazer, Alice. E quero que sejamos amigos desde já, te convidando pra ir comigo a um lugar novo, topa?" - Ela propôs, ainda com a mão estendida.

Eu, nos meus dias menos loucos, jamais imaginaria receber um convite assim de alguém que acabara de conhecer. Mas o que era um dia normal não estava sendo de forma alguma, e Alice não tinha nada de normal, no bom sentido. Era curioso vê-la na praia com tênis All Star todo rabiscado de caneta, cheio de frases do tipo "miga seje menas", e sua blusa branca com mangas meio picotadas, escritas com várias frases de suas músicas favoritas. Parecia ter pego o primeiro jeans que viu pela frente.

Estranhamente, ela me era familiar, e gostei disso. Não foi difícil gostar de alguém assim, que me "seduziu" mais pela sua loucura do que pela sua normalidade. Não pude dizer não. Afinal, precisava de algo assim, e ela soube como me convencer. Apertei sua mão e disse: "Aceito!"


Alguns dias depois, combinei de encontrar Alice e seus amigos no mesmo local, para dar início à nossa viagem. Era o momento perfeito, pois estava de férias e poderia ficar o tempo que quisesse, contanto que não ultrapassasse um mês. Éramos cinco: Weslley e Vivian, um casal; Alice; eu; e Anthony, carinhosamente chamado de Tony.

Tony teve a ideia de irmos a Búzios, já que toda a sua infância fora lá, e ele conhecia bem o local. Depois de duas horas de estrada, chegamos à casa enorme, que incluía um salão de festas que deveríamos usar naquela noite.Não foi algo planejado por mim, mas, no mesmo instante, Alice, com toda a sua desenvoltura, afirmou: "Para comemorarmos nossa chegada com estilo, precisamos mesmo de uma festa!" Todos concordaram, e como Tony tinha amigos na região, não foi difícil organizar algo agradável e divertido.

Horas mais tarde, dentro do salão, mais gente havia chegado para a festa, mas não passava de trinta pessoas. A casa ficava em frente à praia, e eu estava na varanda, observando a areia branca e sentindo a brisa do mar com Tony, enquanto conversávamos. Wesley passou por perto, agitou os braços e cantarolou, com voz rouca: "You gone and I got stay high!"

"Uau!" - murmurei para mim mesmo. - "Será que perdi alguma coisa?" Parecia que o nível de agitação tinha aumentado muito enquanto estávamos na varanda. Mas estava enganado, pois a musiquinha que Wesley cantarolou para mim foi o máximo de animação: em se tratando de festas, aquela estava comportada até demais. Se considerarmos que era uma festa onde a maioria - pelo menos os convidados - eram amigos, e havia os que tinham vindo acompanhados.

Voltei para a varanda com Tony e disse, brincando: "Ninguém foi esbofeteado, nada de sacanagens dentro do banheiro, nenhuma televisão foi jogada na piscina."

"Vejo que você queria uma festa louca e com muita confusão e está obcecado por isso" - ele disse sorrindo."Estou tentando recuperar meu tempo perdido" - disse, encolhendo os ombros.

Dentro do salão, todos os "convidados" extras pareciam se conhecer. Apesar de serem educadamente cordiais comigo e com o restante das pessoas do local, não pareciam exatamente amigáveis. Eu não liguei a mínima para isso, pois Tony era uma das únicas pessoas com quem eu gostaria de bater papo, tirando Alice, que aparecia volta e meia, no seu mais alto grau de embriaguez.Ele voltou a me contar sobre sua vida pessoal, seus sonhos e futuro, enquanto eu admirava a lua que estava linda. Comecei a compartilhar com ele tudo sobre mim, gostos e desejos, até mesmo minha comida predileta, e me surpreendi ao ouvir que ele amava macarrão com queijo. Tínhamos muitas coisas em comum, e isso era bom. Estava adorando conhecê-lo, pois precisava de amigos novos - não que os que eu tinha fossem ruins, mas quanto mais, melhor.

Eu sorria das coisas que ele dizia, até perceber que já estava bebendo de um copo vazio."Quer mais um?" - perguntou Tony, apontando para o copo."Deixa que eu pego" - apressei-me em dizer.Atravessei todo o salão até chegar à cozinha, e ao chegar lá, a porta foi fechada na minha cara. Por trás da porta, ouvi alguém cochichar: "Você quer que todos vejam? Onde conseguiu isso?"Não me contive e parei com a minha mão petrificada sobre a maçaneta. Ouvi uma voz masculina oferecer: "Vai querer um pouco?""Eu não posso! E você também não devia!""Apenas um pouco não vai nos matar!""Você ouve as coisas que diz?"

Fiquei com medo de entrar. O que estariam usando? Maconha talvez? A curiosidade acabou prevalecendo, e ao abrir a porta, encontrei os dois debruçados em um pote enorme de sorvete, sabor napolitano. Os dois olharam para mim com cara de chocados, e o homem chegou a dizer: "Não é isso que você está pensando."

Morrendo de rir, voltei à varanda, e Tony ainda estava lá. Aproximei-me e contei o que havia visto."Não foi exatamente o que se vê em um show indie, não é?" - Eu ria cada vez mais descontraído."Não, sem dúvida" - ele riu também. - "Aliás, aqui está meio parado, não acha? Vamos, termine o seu drink. Quero te mostrar um lugar especial pra mim."As palavras saíram da minha boca antes mesmo de eu saber que ia dizê-las."Que lugar seria esse?""Vamos, você vai ver!" - Ele sorria e parecia bastante contente. Talvez fossem todos os drinks que tomamos.Eu também não estava totalmente sóbrio, mas aceitei acompanhá-lo e disse: "Vamos!"

Uns quinze minutos depois, estávamos na praia, numa parte onde não havia ninguém. Olhei para o céu e me espantei com tanta beleza no lugar. Sentamos na areia, próximo a uma pedra e não muito longe do mar. O silêncio reinou no momento, e eu disse: "Você tinha razão, esse lugar é lindo!"

Ao terminar minha frase, olhei rapidamente para ele, que me agarrou e me beijou. Não sabia o que sentir, nunca tinha feito isso na vida. Mas enquanto ele me beijava, só sentia a minha confusão tomar conta de mim, e estranhamente, eu gostei daquilo.

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